Portos Afogados
Em todo o mundo é comum o uso de frotas navais para transporte de cargas e comércio. Cerca de 80% do transporte global de cargas é efetuado por este modal. O Brasil se inseriu no cenário do comércio internacional em 1808, com a abertura dos portos promovida pelo rei D. João VI. A partir da promulgação da Lei das Concessões, em 1869, essa tendência se acelerou porque permitiu o financiamento privado das obras de expansão, nos principais portos nacionais. Esse modelo de privatização durou até a década de 1930, quando o Estado assumiu o papel de financiador e operador desses ativos, com a criação e a ampliação da Portobras, que explorava os portos por meio das Companhias Docas. Com a extinção da Portobras em 1990, o sistema portuário brasileiro passou por grave crise, forçando a edição da Lei de Modernização dos Portos, em 1993, redefinindo os papéis da autoridade portuária, do operador portuário e do próprio Estado na gestão e regulação do sistema. As instituições públicas responsáveis pelo planejamento e pela gestão portuária no Brasil são: o Ministério dos Transportes, responsável pela formulação de políticas para o seu âmbito de atuação como um todo, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAq) e a Secretaria Especial de Portos (SEP). O sistema portuário brasileiro é composto por 37 portos públicos, entre marítimos e fluviais. Desse total, 18 são delegados, concedidos ou têm sua operação autorizada aos governos estaduais e municipais. Existem ainda 42 terminais de uso privativo e três complexos portuários que operam sob concessão à iniciativa privada. Entre os 34 portos marítimos, 18 deles são administrados diretamente pelas Companhias Docas – sociedades de economia mista -, e que têm como acionista majoritário o Governo Federal e, portanto, estão diretamente vinculadas à SEP. O Brasil possui um setor portuário que movimentou, em 2010, cerca de 834 milhões de toneladas das mais diversas mercadorias e responde por mais de 70% das transações internacionais, ou seja, um fluxo de comércio em torno de US$ 270 bilhões anuais. A perspectiva é de que, nos próximos três a quatro anos, esse fluxo ultrapasse o patamar de um bilhão de toneladas. O transporte de cargas registrou um aumento geral de 13,8% (101 milhões de toneladas), em relação a 2009, nos portos públicos e terminais privativos. Esse crescimento se deve ao desempenho das commodities brasileiras, cujas exportações tiveram não somente aumento de suas quantidades, mas também de suas cotações nos mercados internacionais, daí o seu expressivo resultado. [epico_capture_sc id=”21731″] A movimentação de contêineres, em 2010, retomou o desempenho ascendente, mostrando uma surpreendente recuperação em relação a 2009, com um crescimento de 11,7%, atingindo cerca de 07 milhões de TEUs. Quanto à participação do tipo de navegação, a predominância (73,9%) é da navegação de longo curso (616 milhões de toneladas). A cabotagem registrou 188 milhões de toneladas (22,6%) e a navegação interior 30 milhões de toneladas (3,5%). A movimentação nos terminais privativos de uso exclusivo ou misto foi de 545 milhões de toneladas (65,3%) e manteve a tendência histórica de se aproximar do dobro da movimentação nos terminais públicos, que foi de 289 milhões de toneladas (34,7%). Mas o Brasil poderia ter tido um resultado ainda melhor, se houvesse a maximização do seu potencial aquaviário, praticamente inexplorado: uma costa de 8,5 mil quilômetros e 40 mil quilômetros de rios navegáveis, com forte potencial de transporte de cargas e passageiros. Porém, existem muitos bloqueios para a expansão do setor portuário nacional, que comprometem o seu desempenho e crescimento do comércio exterior e de cabotagem. O maior deles é a deficiência de infra-estrutura. Para vencer esse problema, faz-se necessário efetivar os investimentos direcionados às obras portuárias. Existem graves problemas de acessos que precisam ser resolvidos rapidamente e urge que sejam implantados equipamentos modernos, como forma de reduzir custos e elevar a competitividade dos produtos transportados. Nas suas vias internas faltam desde instalações de apoio até a implantação de sistemas de segurança, sinalização, eletrificação e saneamento. Além disso, os espaços e retroáreas para armazenamento de contêineres são insuficientes; áreas nobres estão sendo ocupadas por produtos com baixo valor agregado; e terminais lotados são entraves no cronograma, entre a aceitação da carga e partida do navio, aumentando o custo empresarial. Essas más condições resultam em filas intermináveis de caminhões que atrasam navios, elevam o tempo de movimentação das cargas e, conseqüentemente, o preço do transporte. Estima-se que esse tempo improdutivo gere perdas entre 3% e 5% sobre o valor do comércio internacional. Outro grande gargalo diz respeito à profundidade dos canais de acesso, berços e baías de evolução, que dificultam o acesso e a atracação de navios de grande porte, favorecendo a redução de linhas comerciais disponíveis dos diversos armadores, não permitindo que os portos brasileiros concorram no sistema portuário internacional. Outros fatores de redução da competitividade comercial são alguns aspectos institucionais e burocráticos do funcionamento portuário, sob gestão pública, como o atraso ou paralisação de obras, por demora no processo de concessão das licenças ambientais e à ocorrência de projetos mal elaborados, por exemplo. Para a CNI – Confederação Nacional da Indústria, entre os maiores complicadores indicados pelas empresas, excetuando-se os de infra-estrutura, encontram-se a burocracia na liberação de cargas; greves que interferem na sua movimentação ou liberação; altos custos de estiva, capatazia e praticagem; e a necessidade de mudança de hábitos e atitudes por parte dos servidores e administradores portuários, no sentido de atender com maior presteza às demandas dos clientes. Todos esses fatores tornam-se ainda mais graves, se considerarmos o inadequado modelo de administração pública; falta de integração entre os atores portuários envolvidos; sistema trabalhista, que permite o emprego desnecessário de contingente excessivo de mão de obra, sob a tutela do operador portuário; e o transit time, que leva empresas a optarem por rodovia, em detrimento dos portos, nas transações comerciais com o Cone Sul. Por fim, a falta de uma integração multimodal – hidrovias, rodovias, ferrovias e aeroportos – amplia essas deficiências, não permitindo o transporte das cargas de suas origens até os portos, ou deles aos seus