O AFRMM e os regimes aduaneiros especiais

No dia 02 de setembro de 2011, a Coordenadora-Geral da Coordenação Geral do Adicional do Frete para a Renovação da Marinha Mercante (CGAMM) do Departamento do Fundo da Marinha Mercante da Secretaria de Fomente para Ações de Transportes do Ministério dos Transportes, por meio do Memorando Circular n° 201100078812/CGAMM, orientou os responsáveis pelas Unidades Descentralizadas do DMM a promoverem a comunicação das empresas acerca da suspensão do AFRMM nas operações submetidas aos regimes aduaneiros que tratam da admissão de bens. De acordo com o entendimento constante do referido memorando, a Lei n° 10.893, de 31 de julho de 2004, que dispõe sobre o Adicional do Frete para a Renovação da Marinha Mercante – AFRMM e o Fundo da Marinha Mercante – FMM, delimitou a suspensão do AFRMM às operações que tratam da importação de mercadorias, excluindo aquelas que tratam da admissão de bens, tais como o REPETRO (Regime aduaneiro especial de exportação e de importação de bens destinados às atividades de pesquisa e de lavra das jazidas de petróleo e de gás natural) e o REPORTO (Regime tributário para incentivo à modernização e à ampliação da estrutura portuária). Isto porque, de acordo com o memorando em tela, a Lei n° 10.893/04 teria utilizado propositadamente os conceitos de bem e mercadoria com sentidos diferentes da seguinte forma: “Art. 14. Ficam isentas do pagamento do AFRMM as cargas: (…) IV – que consistam em: a) bens sem interesse comercial, doados a entidades filantrópicas, desde que o donatário os destine, total e exclusivamente, a obras sociais e assistenciais gratuitamente prestadas; b) bens que ingressem no País especificamente para participar de eventos culturais ou artísticos, promovidos por entidades que se dediquem com exclusividade ao desenvolvimento da cultura e da arte, sem objetivo comercial; c) bens exportados temporariamente para outro país e condicionados à reimportação em prazo determinado; d) armamentos, produtos, materiais e equipamentos importados pelo Ministério da Defesa e pelas Forças Armadas, ficando condicionada a isenção, em cada caso, à declaração do titular da Pasta ou do respectivo Comando de que a importação destina-se a fins exclusivamente militares e é de interesse para a segurança nacional; ou e) bens destinados à pesquisa científica e tecnológica, conforme disposto em lei, cabendo ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq encaminhar ao órgão competente do Ministério dos Transportes, para fins de controle, relação de importadores e o valor global, por entidade, das importações autorizadas; e) bens destinados à pesquisa científica e tecnológica, conforme disposto em lei; (Redação dada pela Medida Provisória nº 545, de 2011) V – que consistam em mercadorias: (…) c) submetidas a regime aduaneiro especial que retornem ao exterior no mesmo estado ou após processo de industrialização, excetuando-se do atendimento da condição de efetiva exportação as operações realizadas a partir de 5 de outubro de 1990, nos termos do § 2o do art. 1o da Lei no 8.402, de 8 de janeiro de 1992; (…)” Desta forma, o memorando conclui que “não existe amparo legal para a Isenção do AFRMM para essas operações [submetidas aos regimes aduaneiros que tratam da admissão de bens], visto que a isenção prevista no artigo 14, inciso V, alínea c, também se refere expressamente a ‘mercadorias’ e não a ‘bens’.” Todavia, entendemos que a conclusão a que chegou o memorando ora comentado não é a mais adequada, pelos motivos que a seguir serão expostos. Primeiramente, o memorando afirma existir distinção de sentido entre os termos “bem” e “mercadoria”, mas não determina os critérios que deverão ser usados para distingui-los, ou seja, não estabelece os requisitos para que determinada coisa seja enquadrada como bem ou mercadoria. Ademais, o próprio Regulamento Aduaneiro – RA (Decreto n° 6.759/09) utiliza os termos acima mencionados de forma indiscriminada. A título exemplificativo, menciona-se a Subseção IX do RA, que trata “Dos Bens Adquiridos em Loja Franca”, cujo primeiro artigo é o 169, com a seguinte redação “A isenção do imposto na aquisição de mercadorias em loja franca instalada no País, a que se refere a alínea “e” do inciso II do art. 136, será aplicada com observância do disposto nos arts. 476 a 479 e dos termos, limites e condições estabelecidos pelo Ministro de Estado da Fazenda (Decreto-Lei no 2.120, de 1984, art. 1o, § 2o, alínea “a”; Lei no 8.032, de 1990, art. 2o, inciso II, alínea “e”; e Lei no 8.402, de 1992, art. 1o, inciso IV).” Em terceiro lugar, é importante destacar que, caso fosse adotada a interpretação literal dos termos “bem” e “mercadoria” quando da análise da Lei n° 10.893/04, como sugere o memorando em debate, chegaríamos a conclusões absurdas. Também a título exemplificativo, cita-se o artigo 7° que estabelece que “O responsável pelo transporte aquaviário deverá, na forma e nos prazos estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, disponibilizar os dados necessários ao controle da arrecadação do AFRMM, oriundos do conhecimento de embarque ou da declaração de que trata o § 2o do art. 6o, referentes às mercadorias a serem desembarcadas no porto de descarregamento, independentemente do local previsto para a sua nacionalização, inclusive aquelas em trânsito para o exterior. (Redação dada pela Medida Provisória nº 545, de 2011)”. [epico_capture_sc id=”21731″] Neste sentido, poderíamos concluir – de forma absurda – que o transportador somente estaria obrigado a fornecer os dados – ao controle da arrecadação do AFRMM – referentes às mercadorias a serem desembarcadas no porto de descarregamento, não se aplicando esta regra em relação aos bens por ele transportados. Por fim, é importante destacar que a orientação firmada no Memorando Circular n° 201100078812/CGAMM contraria as instruções expedidas pelo próprio Ministro dos Transportes que, por meio da Portaria MT nº 72, de 18.03.2008, aprovou a norma complementar n° 01/2008, a qual estabelece critérios e disciplina procedimentos para a utilização do Sistema Eletrônico de Arrecadação do Adicional do Frete para a Renovação da Marinha Mercante e para o pagamento ou a solicitação e concessão de benefícios e incentivos relativos ao AFRMM. Neste caso, o referido Memorando afirma que “A inclusão do regime especial de Admissão temporária no artigo

A Imunidade da CSLL sobre as Receitas de Exportação

1. Introdução Com a entrada em vigor da EmendaConstitucionalnº 33, em 12 de dezembro de 2001, que introduziu o §2º no artigo 149 da Constituição Federal de 1988, as contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico passaram a não incidir sobre as receitas decorrentes das exportações. A alteração da redação do artigo 149 da CF teve por finalidade desonerar as operações de exportação de mercadorias e serviços, objetivando incentivar o desenvolvimento da indústria nacional. Neste sentido, as receitas decorrentes de exportação passaram a ser imunes em relação à contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/PASEP), à Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS), à Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) e à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Ocorre que o Fisco entendeu que a imunidade instituída pela EC 33/01 se restringe às contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico que têm receitas como base de cálculo, não abrangendo assim a CSLL e a CPMF. Entretanto, este não é o melhor entendimento, como demonstraremos a seguir. É importante destacar que no presente texto analisaremos somente a discussão acerca da imunidade das receitas decorrentes de exportação em relação à CSLL (e não à CPMF, já extinta). 2. Alcance da imunidade prevista As receitas decorrentes de exportação são imunes à incidência da CSLL, pois: (i) este tributo é espécie do gênero contribuições sociais; (ii) a intenção do legislador foi ampliar a desoneração das exportações, tendo em vista que as referidas receitas já eram isentas da contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS; e (iii) estas receitas não se confundem com o conceito de lucro, mas são levadas em consideração quando da sua apuração. Em primeiro lugar, é importante destacar que artigo 149 da CF, ao fazer referência às contribuições sociais, exige interpretação conjunta com o artigo 195, onde tais tributos estão enumerados, inclusive a CSLL (alínea “c” do inciso I). Isto porque as contribuições elencadas no artigo 149 da CF são gênero das quais as do artigo 195 são espécies. E, como não existe no artigo 195 qualquer regra especial estabelecendo que as contribuições ali relacionadas incidam sobre receitas de exportação, se aplicará a essas contribuições a regra geral do artigo 149, § 2º, inciso I, da CF, que determina a imunidade das receitas decorrentes de exportação em relação às contribuições sociais. Ademais, a intenção do legislador no texto da EC nº 33/01 não poderia ser a de afastar a incidência somente da contribuição ao PIS e da COFINS, uma vez que os referidos tributos já não eram cobrados nas operações de exportação há mais de uma década, conforme determinado pelo Decreto nº 92.698/86, pelas Leis Complementares nºs 70/91 e 85/96 e pela Medida Provisória nº 2.158/01. Desta forma, o objetivo principal da EC nº 33/01 foi o de excluir as receitas decorrentes da exportação da incidência de todas as contribuições sociais, inclusive da CSLL, não se limitando apenas à contribuição para o PIS/PASEP e à COFINS. Por fim, como já dito anteriormente, a imunidade em análise objetivou fomentar as operações de exportação, desonerando-as de contribuições sociais. Partindo desta premissa, é possível concluir que o termo “receitas” previsto na norma constitucional deve ser interpretado em sentido amplo a fim de alcançar não só as receitas que compõem a base de cálculo da contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS, mas também as que são levadas em consideração para a apuração do lucro líquido da empresa. Como se sabe, a CSLL incide sobre o resultado do exercício, ajustado por adições e exclusões previstas no artigo 2º, § 1º, alínea “c”, da Lei nº 7.689/88. Este resultado nada mais é do que o lucro do exercício, ou seja, a soma de todas as receitas da empresa, descontados os custos e despesas operacionais e não operacionais. É de se destacar que os conceitos de lucro e de receita não se confundem. Denomina-se “receita” a entrada de recursos obtidos pelo exercício da atividade da empresa; Já o lucro é obtido mediante a diferença entre as receitas, de um lado, e os custos e as despesas necessárias à sua obtenção, de outro lado. Portanto, na apuração da base de cálculo da CSLL, devem ser excluídas as receitas decorrentes das operações de exportação, de modo que, imunes estas, não há como aproveitá-las na definição da base de cálculo e da própria hipótese de incidência da CSLL. 3. Posição do Supremo Tribunal Federal No dia 05 de dezembro de 2007, o Supremo Tribunal Federal (STF), por unanimidade, reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional em análise nos autos do recurso extraordinário (RE) nº 564.413. O RE nº 564.413 está sendo julgado em conjunto com o RE nº 474.132, pois ambos discutem o alcance das normas constitucionais em relação à imunidade tributária. O RE nº 474.132 refere-se à não incidência da CSLL e da CPMF sobre receitas decorrentes de exportação. Já o segundo RE trata somente da CSLL. Em relação ao RE nº 564.413, o Ministro Relator, Marco Aurélio, negou provimento ao recurso interposto pela empresa Incasa S/A, sendo acompanhado pelos ministros Menezes Direito, Carlos Ayres Britto e Ricardo Lewandowski. Por outro lado, o Ministro Gilmar Mendes deu provimento ao recurso, sendo seguido pelos ministros Eros Grau, Cármen Lúcia e Cezar Peluso. O pedido de vista feito pela Ministra Ellen Gracie interrompeu o julgamento – que, portanto, está empatado em 4 a 4 – e adiou a definição da matéria. Além dela, ainda falta votar o Ministro Celso de Mello, e o Ministro Joaquim Barbosa somente se pronunciará em caso de empate. [epico_capture_sc id=”21731″] A posição do Ministro Celso de Mello sobre o tema tende a ser favorável aos contribuintes. Isso porque em 2007 o Ministro concedeu antecipação de tutela em favor da Companhia Siderúrgica Nacional para que a CSLL não fosse exigida em relação às receitas decorrentes de exportação nos autos da ação cautelar nº 1.810, no que foi acompanhado pelos membros da 2ª Turma do Tribunal, da qual faz parte a Ministra