O fim da guerra dos portos

A partir de janeiro de 2013, a chamada guerra dos portos chegará ao fim, com a entrada em vigor do Projeto de Resolução nº 72 do Senado Federal, que prevê a cobrança de 4% de alíquota interestadual do Imposto de Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) para produtos importados. Já não era sem tempo. Com isso, os importadores que se beneficiavam desse tipo de incentivo fiscal oferecido por Estados como Espírito Santo e Santa Catarina voltarão a utilizar os principais portos do País para o desembaraço de mercadorias. Assim, voltar-se-á à normalidade, pois sempre pareceu um atentado ao bom senso que importações via Espírito Santo e, mais recentemente, Santa Catarina gozassem desse benefício de redução da alíquota do ICMS na entrada pelo simples fato de serem importadas por meio daqueles Estados quando o destino de parte muito significativa dessas mercadorias era o Estado de São Paulo. É verdade que a Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) já admitiu que aguarda um significativo aumento de cargas a partir de janeiro. Segundo dados da Codesp, de 2004 a 2011, registrou-se um aumento de 577% nos valores de cargas desembaraçadas no Porto de Vitória-ES com destino ao Estado de São Paulo, ou seja, houve um crescimento de US$ 12,2 milhões para US$ 82,9 milhões. De qualquer modo, ainda que venha a ocorrer alguma dificuldade para atender ao crescimento da demanda, o Porto de Santos está apto a receber essas cargas que, a rigor, jamais deveriam ter saído daqui. Afinal, se não houvesse o incentivo para atrair cargas, a maior parte desse montante teria passado pelo porto de Santos, beneficiando a economia do Estado. O importante é que o Porto de Santos vem recebendo investimentos que vão aumentar a sua capacidade de movimentação. Segundo números da Agência Nacional de transportes Aquaviários (Antaq), dos R$ 30 bilhões que vêm sendo investidos nos portos brasileiros, R$ 21 bilhões correspondem a investimentos privados. Só no Porto de Santos estão em construção dois terminais privativos que deverão responder por 65% do aumento de sua capacidade de operação: o da Embraport, que deverá movimentar 2 milhões de TEUs (unidade equivalente a um contêiner de 20 pés) e 2 bilhões de litros de etanol por ano, e o da Brasil Terminal Portuário (BTP), também para a movimentação de contêineres e granéis líquidos. Em dezembro, parte da retroárea do Terminal Embraport estará em funcionamento, enquanto os restantes 660 metros de cais devem estar concluídos em outubro de 2013. Já o Terminal da BTP deve começar a operar no primeiro trimestre de 2013. Além disso, a infraestrutura rodoferroviária da área portuária de Santos está sendo remodelada para atender ao aumento esperado, enquanto a Codesp investe no reforço do cais nos trechos operados pela Cosan e pela Coopersucar (soja e açúcar). Sem contar que, a longo prazo, o governo do Estado prevê a adequação do sistema hidroviário Tietê-Paraná, com a sua integração ao corredor ferroviário de exportação Campinas-Santos, ampliando a movimentação de contêineres e granéis por esses modais.

Os pagamentos internacionais: câmbio e alternativas

As normas cambiais brasileiras vêm se modificando drasticamente ao longo dos últimos anos. Tudo isso, certamente, com vistas a se adequar ao contexto econômico do momento. Já passamos pelo câmbio totalmente livre, sem qualquer restrição. Isso até 1933, quando, então, Vargas fez publicar o ainda sobrevivente Dec. nº 23.258, que, à época, instituiu a figura da sonegação de cobertura cambial, estabelecendo multa de até 200% sobre as receitas de exportações brasileiras não ingressadas no País. Vale ressaltar que essa figura deixa de existir com a edição da MP nº 315/06, que resulta na Lei nº 11.371, do mesmo ano. Portanto, ao longo dos anos, em decorrência da escassez de divisas por que passou o Brasil, nossas regras para remessas do País para o exterior sempre se pautaram pela sua característica restritiva. Somente com a virada do milênio é que o mundo começa a viver um período sem crises e há um ajustamento da economia mundial. Observe-se que o Brasil, ainda na década de 90, também fez a sua lição de casa. Assim, a combinação desses dois fatores permitiu ao País promover uma radical e contínua desregulamentação na legislação sobre câmbio e capitais internacionais. Num primeiro momento, foi promovida, pelo Banco Central do Brasil – executor da política cambial do País -, uma desregulamentação infralegal. A antiga Consolidação das Normas Cambiais (CNC) deu lugar ao atual Regulamento do Mercado de Câmbio e Capitais Internacionais (RMCCI). Um regulamento leve e objetivo, que trata das operações muito menos pelos seus procedimentos burocráticos e muito mais pelos seus princípios. Hoje, quase tudo é permitido em termos de recebimentos e pagamentos internacionais. Certamente, há que se respeitar o “quase”! Nesse sentido, recomenda-se a leitura de brilhante matéria de capa do Sem Fronteiras, do mês passado – Ordem de pagamento em reais -, em que são encontradas declarações do gerente-executivo de Normatização de Câmbio e Capitais Estrangeiros do Banco Central do Brasil, Geraldo Magela Siqueira. Os princípios básicos que orientam as operações estão contidos logo no início do já citado RMCCI: “As pessoas físicas e as pessoas jurídicas podem comprar e vender moeda estrangeira ou realizar transferências internacionais em reais, de qualquer natureza, sem limitação de valor, sendo contraparte na operação agente autorizado a operar no mercado de câmbio, observada a legalidade da transação, tendo como base a fundamentação econômica e as responsabilidades definidas na respectiva documentação.” Complementando, o RMCCI prevê que esses princípios se aplicam, também, “às compras e às vendas de moeda estrangeira por pessoas físicas ou jurídicas, residentes, domiciliadas ou com sede no País, para fins de constituição de disponibilidade no exterior e do seu retorno, bem como às operações de ‘back to back’”. Como todas as operações devem ter como contraparte um agente autorizado a operar no mercado de câmbio – um banco ou uma corretora de câmbio, por exemplo -, a este, conforme também prevê o Regulamento, cabe “certificar-se da qualificação de seus clientes, mediante a realização, entre outras providências julgadas pertinentes, da sua identificação, das avaliações de desempenho, de procedimentos comerciais e de capacidade financeira”. Coroando essas modificações infralegais, é publicada a já citada Lei nº 11.371/06, que, dentre outras modificações, permite que exportadores mantenham no exterior as receitas de suas exportações. E que essas disponibilidades possam ser utilizadas, especialmente para pagamento de suas obrigações no exterior. [epico_capture_sc id=”21731″] Considerados todos esses avanços, especialmente os ocorridos na década passada, verificamos uma quase ausência de restrições. Vejamos alguns avanços somente no âmbito do comércio exterior: 1. As exportações e as importações brasileiras podem ser realizadas para pagamento em qualquer moeda, inclusive em reais. 2. As operações podem ser liquidadas em qualquer moeda, inclusive em moeda diferente daquela indicada nos respectivos documentos. 3. As pessoas físicas e jurídicas podem constituir disponibilidades no exterior – não só os exportadores – e tais disponibilidades podem ser utilizadas, também, para pagamento de suas obrigações no exterior. 4. Nos termos de acordo firmado com a Argentina, é possível realizar operações na moeda do país exportador, nos termos do Sistema de Pagamentos em Moeda Local (SML). Os bancos centrais do Brasil e do Uruguai já concluíram as negociações para adoção desse sistema. Cogita-se que isso possa ocorrer também com a China, Índia e Rússia. Em resumo, pode-se afirmar que não há restrição da legislação nacional quanto à escolha da moeda e à realização das transferências do ou para o exterior, desde que respeitados os princípios gerais aqui elencados e, se houver, a legislação e regulamentação específica para certas operações.

Incoterms versus Valor Aduaneiro

Os Termos Comerciais Internacionais (Incoterms) são uma ferramenta muito útil na negociação de compra e venda entre exportador e importador porque clarificam para ambos as exatas responsabilidades de cada um, pois cada qual pode estudar o significado dos Incoterms em sua própria língua. Essa segurança é suficiente para incentivar às administrações aduaneiras que solicitem ao importador declarar qual o Incoterm usado na operação, como uma das fontes de informação para a determinação do valor aduaneiro, base de cálculo do imposto de importação. O valor aduaneiro foi definido pelo artigo VII do GATT (General Agreement on Tariffs and Trade) e pelo Acordo sobre a Implementação do artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio 1994 (AVA), como sendo o preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias, em uma venda para exportação para o país de importação. Foi permitido cada país decidir sobre a inclusão ou não, no valor aduaneiro, dos custos do transporte até o país de importação e respectivo seguro, se houver. O Brasil, por exemplo, incluiu esses custos no valor aduaneiro. Podemos compreender melhor a relação entre os Incoterms e o valor aduaneiro observando alguns exemplos, considerando um país que tenha optado por incluir o transporte e o seguro internacionais. [epico_capture_sc id=”21731″] Incoterm CIF – Custo,Seguro e Frete (porto de destino) O vendedor deve pagar o frete para transportar as mercadorias até o porto de destino, bem como o seguro. O valor aduaneiro será exatamente o preço das mercadorias conforme a fatura (pago ao vendedor). FOB – Livre a Bordo (porto de embarque) O vendedor deve colocar a mercadoria a bordo do navio designado pelo comprador, quem paga o transporte desse porto ao seu país. O valor aduaneiro será o preço das mercadorias conforme a fatura (pago ao vendedor) acrescido do frete e do seguro (pagos pelo importador ao transportador e segurador). EXW – Ex Works (local de entrega) O vendedor entrega as mercadorias em suas instalações. Assim, o comprador tem de pagar todos os custos de transporte e seguro desde esse local até o destino final. O valor aduaneiro será o preço das mercadorias conforme a fatura (pago ao vendedor) mais os custos (transporte, seguro, armazenagem, etc), arcados pelo comprador (pagos aos diversos prestadores de serviço) para transportar as mercadorias até o seu país (fronteira, porto ou aeroporto), mas não os custos de transporte daí em diante (da fronteira até suas instalações).