A Medida Provisória 595: mudanças no marco regulatório do setor portuário no Brasil
1. Introdução O setor portuário esteve à espera, nos últimos meses, de um pacote de investimentos e mudanças no marco regulatório. Em 2008, o governo federal editou o Decreto 6.620, com base na Lei 8.630 (Lei de Modernização dos Portos) e na Lei 10.233 (que instituiu a ANTAQ). Algumas das características mais marcantes do Decreto 6.620 eram (i) a disciplina da concessão de portos como um todo, não apenas de instalações ou terminais portuários, e (ii) a definição de diferenças claras entre os terminais de uso público e os de uso privativo, baseadas na exigência de que os terminais de uso privativo deveriam movimentar principal ou exclusivamente sua carga própria. Dizia-se que, após o Decreto 6.620, terminais de uso privativo sem carga própria predominante, como Embraport, Itapoá, Portonave e Cotegipe[1], não mais poderiam ser criados. O Decreto 6.620, por si só, foi insuficiente para evitar que Itapoá entrasse em operação comercial e a Embraport praticamente concluísse as suas obras de construção, bem como para provocar a adaptação ou o fechamento dos terminais de Portonave e Cotegipe. Um processo em andamento no Tribunal de Contas da União (TCU) tende a ser encerrado com determinações e sanções dirigidas à ANTAQ para que a situação de tais terminais seja corrigida (TC-015.916/2009-0).[2] Embora a instrução técnica do TCU seja fortemente a favor da rejeição de terminais de uso privativo que atuem como se fossem de uso público (isto é, sem carga própria predominante), tais como os quatro já referidos, o caso ainda não foi examinado pelo Tribunal. Não se sabe se o Tribunal irá seguir o relatório da área técnica, especialmente depois da edição da MP 595. A MP 595 consiste em uma medida provisória. Trata-se de instrumento legislativo editado pelo Presidente da República, sujeito a posterior aprovação pelo Congresso Nacional. Tem força de lei por 60 dias, prorrogáveis por igual período. Até o final dos 120 dias a MP deve ser convertida em lei. Caso rejeitada ou não apreciada, não poderá ser reapresentada senão na legislatura seguinte. A edição da MP pressupõe que a matéria seja “relevante” e “urgente”. Estes são conceitos abertos e indeterminados. Nem o Congresso nem o Judiciário dispõem-se normalmente a controlá-los. Porém, o Congresso já teve a oportunidade de rejeitar medidas provisórias por falta de tais requisitos. Um exemplo é o da MP 320, que regulava um novo regime para os portos secos (denominado “CLIA”). Foi rejeitada porque não haviam sido cumpridos simultaneamente os dois requisitos, convertendo-se a MP em projeto de lei. É pelo menos possível que o mesmo possa ocorrer com a MP 595. Durante os 120 dias da tramitação esperada da MP 595, serão discutidas as 646 propostas de emenda apresentadas por parlamentares de todos os matizes políticos. Uma comissão especial foi nomeada para examinar e formular um relatório sobre as emendas e apresentar, se for o caso, uma versão revisada ou um substitutivo para a lei de conversão. As posições-chave na comissão serão as de presidente e relator – este, encarregado de preparar um relatório inicial e submetê-lo à apreciação da comissão. Tais posições devem ser preenchidas só quando do reinício do ano legislativo, em fevereiro. Já então o Congresso terá um novo presidente, o que poderá introduzir um novo fator político. Sob uma presidência recentemente eleita, o Congresso pode-se ver politicamente mais disposto a promover mudanças no diploma em relação ao texto original do Poder Executivo. Se o Congresso aprovar a versão submetida pelo Executivo ou outra sobre a mesma matéria, tratar-se-á de uma “lei de conversão”, que será editada com plena força de lei. Se, ao contrário, a MP for rejeitada pelo Congresso, deve haver um decreto legislativo regulando os atos praticados na vigência da MP. 2. Alterações concretas As principais características e conceitos da MP 595, especialmente sob o ponto de vista de um terminal portuário, são as seguintes: 2.1. Extinção dos conceitos de carga própria ou de terceiro A divisão entre terminais de uso público e terminais de uso privativo, tal como conhecida até agora, chega ao fim. Não há qualquer menção na MP 595 a “carga própria” ou “carga de terceiro”. A distinção relevante agora é entre terminais dentro dos limites de área do “porto organizado” ou fora de tais limites. Portanto, um conceito essencial para a MP 595 é o de “área do porto organizado”, que é definida por um decreto presidencial baseado em parâmetros estipulados de modo genérico pelo art. 2º da MP 595. 2.2. O critério da localização dos terminais (dentro ou fora do porto organizado) Dentro dos limites da área do porto organizado somente podem existir terminais arrendados ou explorados mediante concessão do porto como um todo. Não poderá haver novos terminais autorizados dentro da área do porto organizado. Os terminais arrendados são submetidos a um processo licitatório e a contratos que trazem em si uma concessão de serviço público[3] ou uma autorização (no caso de arrendamentos que tenham como objetivo uma das finalidades dos incisos II a IV do art. 8º; a do inciso I – terminal de uso privado – é incompatível com as finalidades por porto organizado previstas no art. 2º, I, da MP 595); fora da área do porto organizado, a atividade é sujeita a uma autorização outorgada pelo governo federal (SEP – Secretaria Especial de Portos da Presidência da República). Porém, não está completamente claro o tratamento a ser dado aos terminais de uso privativo hoje existentes dentro de portos organizados, que não se confundem necessariamente com os terminais “de uso privado” referidos no art. 8º da MP 595. Os arts. 50 e 51 podem ser interpretados como uma tentativa de permitir-lhes a continuidade de funcionamento, com uma exigência de adaptação, não precisamente definida, à nova legislação. Uma interpretação possível é que essa adaptação exigida pelo art. 50 consistirá, na realidade, na licitação dos terminais de uso privativo – ou, em casos excepcionais, sua outorga com dispensa ou inexigibilidade de licitação – hoje existentes dentro dos portos organizados. Isso permitirá que todos os terminais dentro dos portos organizados submetam-se ao
Terminal Libra Rio: por que o atendimento é tão ruim?
Desde quando assumi a diretoria comercial de uma transportadora rodoviária de cargas aqui do Rio de janeiro, decidi que teria uma gestão extremamente participativa nas operações da empresa. Vender serviço de transporte e logística é o mesmo que vender operação. Esta minha decisão, além de servir para melhorar as vendas em si, a partir do momento que estou apto a falar com mais propriedade sobre os aspectos técnicos operacionais, permitiu-me maior aproximação com os clientes, o que é excelente para consolidar cada vez mais os relacionamentos. Também não poderia deixar de mencionar que a minha proximidade com as operações, foi fato motivador para a equipe. A transportadora em que sou diretor tem mais de 70% das suas operações voltadas para os portos, principalmente do Rio de Janeiro, seja na importação, seja na exportação. Em maio deste ano (2012) assumimos 100% das operações de uma grande empresa importadora e comecei a frequentar cada vez mais o porto do Rio de janeiro, vivenciando as mais diversas situações, conhecendo diversos profissionais que trabalham nas transportadoras concorrentes e que ficam baseados no próprio porto recebendo o trabalho e executando as operações. Não posso deixar de mencionar que são pessoas, em sua maioria, sensacionais, sempre dispostos a ajudar. Ali, pude notar que a concorrência fica à margem e um ajuda o outro. Além dos profissionais das transportadoras, conheci diversos motoristas autônomos (carretreiros). São pessoas profissionais, em sua imensa maioria, pontualíssimas e que, dificilmente, deixarão você sem respaldo. Independente do tamanho da transportadora, de quão grande seja a sua frota, absolutamente todas, lançam mão desses profissionais. Quanto aos terminais do Porto do Rio de Janeiro, quando as operações transporte marítimo são em contêineres, basicamente, temos dois terminais atuantes, quais sejam: LIBRA Terminais e MULTIRIO. Aqui também vale um parêntese quanto aos profissionais que trabalham nestes dois terminais. São pessoas extremamente solícitas, que estão ali para somar, ou seja, profissionais experientes e competentes. No que se refere à MULTIRIO, a palavra que melhor definiria este terminal seria a eficiência. A MULTIRIO conseguiu unir seus bons profissionais a uma gestão pró usuário. Ali se consegue resolver rapidamente as mais diversas questões, pois o terminal buscou desburocratizar sua sistemática. Além disso, tem um horário de funcionamento mais extenso na importação e uma grande disponibilidade de janelas. Na MULTIRIO, por exemplo, no mesmo dia, é possível dar entrada na documentação para retirada de carga de importação, obter janelas e executar a operação. Em alguns casos, até na eventualidade de não comprimento de horário, é possível reagendar. O Sistema do terminal é bem rápido e funciona em ouros navegadores, além do Internet Explorer, tais como Mozilla Fire Fox e Google Chrome. A MULTIRIO parece ter um respeito maior pelos profissionais que atuam no porto, como alias deve ser a conduta de uma empresa concessionária de serviços públicos. Em outras palavras, cumpre nada mais do que a sua obrigação, o que, no Brasil, representa uma grande evolução. É obvio que ainda estamos longe dos terminais portuários dos países mais desenvolvidos, que existem alguns problemas, mas não tenho a ilusão de que 14 anos são suficientes mudar aquilo que, por séculos, foi vítima da má gestão do ente publico. Já no que se refere ao terminal da LIBRA, tenho severas criticas a fazer ao serviço prestado pela empresa. Enquanto na MULTIRIO consigo enxergar uma gestão pró usuário, na LIBRA vejo uma gestão que dá a sensação de ser contra o usuário e contra todos os profissionais atuantes no porto, até mesmo seus próprios funcionários que ficam na linha de frente, querendo ajudar, porém, sem êxito. Os funcionários da LIBRA jamais se negaram em ajudar e estão sempre dispostos a somar. O problema é o modelo de gestão do terminal, que prima pelo engessamento e pela burocratização e isso os impede de tomar quaisquer decisões positivas. Por exemplo, sempre que se necessita da autorização de um responsável, aí existe outro responsável que, em muitos casos, é de São Paulo e parece viver em reunião. O sistema da LIBRA pode ser considerado uma “case” a ser estudado. O sistema seria perfeito, não fosse sua lentidão ímpar, pelo fato de só funcionar no Internet Explorer e, praticamente, toda semana ficar fora do ar. Quando está fora do ar, o caos é instaurado. Filas imensas se formam no departamento onde se faz a liberação para saída das mercadorias. Em um dia de colapso desses, peguei um numero de senha de atendimento e verifiquei que tinham mais de 50 pessoas na minha frente. Nem preciso dizer que levei mais de três horas para ser atendido neste dia. Em dias de calor, a sala, que é pequena, vira uma sauna, pois, até o ar condicionado tem problemas. Outro problema gravíssimo é a escassez de janelas para retirada de cargas. A coisa começa a descambar a partir do momento que só se pode fazer agendamento 12 horas depois em que a liberação da carga é feita. Note que 12 horas depois, como as janelas vão até 19h, significa que a retirada da carga será agendada somente para o dia seguinte. Isso se existirem janelas disponiveis, sendo que as quintas, sextas e sábados (até às 11h) as janelas são consumidas com uma rapidez incrível. Parece que tem mais cargas no terminal que a sua capacidade suporta. A respeito do agendamento somente ser permitido para janelas 12 horas posteriores à liberação, isso cria outro problema. Por conta dos seus modos operantes, se um cliente precisa dar entrada na documentação no dia do vencimento da armazenagem, na LIBRA, fica automaticamente impedido, devendo pagar outro período. Note que o direito de dar entrada na documentação e retirar a carga no mesmo dia, ainda que no vencimento do período, é subtraído do importador. Ora, se o período de armazenagem é um prazo estipulado pelo terminal, uma prestação de serviços que é paga, o terminal precisa disponibilizar janelas, sem prejuízos aos importadores. Na MULTIRIO isso não acontece, pois, como foi dito acima, é possível dar entrada e retirar a carga no mesmo dia. Um breve
Visto Consular na fatura comercial – Ilegalidade na exigência
Por Rogério Chebabi| @comexblog Um dos grandes dramas dos importadores, especialmente os que importam da China, é a exigência fiscal de apresentação de visto consular na fatura comercial. Exemplificadamente, o Fisco faz a exigência no Siscomex da seguinte forma: “COMPARECER À (nome do setor da RF) PARA RETIRADA DA FATURA COMERCIAL ORIGINAL Nº xxxxxxxx, DE xx/xx/xxx PARA PROVIDENCIAR O RESPECTIVO RECONHECIMENTO PÚBLICO DA FIRMA DO EXPORTADOR DESSES DOCUMENTOS, ACOMPANHADO DE CONFIRMAÇÃO DO SERVIÇO CONSULAR BRASILEIRO NO PAÍS DE EXPORTAÇÃO. RESSALTA-SE QUE O RECONHECIMENTO DE FIRMA DO EXPORTADOR DEVERÁ SER APOSTA NA DOCUMENTAÇÃO RETIRADA, SENDO NECESSÁRIO O RECONHECIMENTO DA ASSINATURA DO MESMO ASSINANTE DOS DOCUMENTOS LISTADOS ANTERIORMENTE. NÃO SERÁ ACEITO DOCUMENTO DE CÂMARA DE COMÉRCIO, ASSOCIAÇÃO DE PRODUTORES OU ENTIDADES DO GÊNERO; A EXIGÊNCIA REFERE-SE A NOTARIO PUBLICO, OU SEJA, FUNCIONÁRIO PÚBLICO AUTORIZADO POR LEI A AGIR COMO TESTEMUNHA IMPARCIAL PARA ASSINATURAS, ADMINISTRAR JURAMENTOS, AUTENTICAR CÓPIA DE DOCUMENTOS, (ATESTAR ASSINATURAS FEITAS POR INDIVÍDUOS E EXECUTAR OUTROS ATOS NOTARIAIS NO ÂMBITO DE SUA JURISDIÇÃO), ACOMPANHADO DA CONFIRMAÇÃO DO SERVIÇO CONSULAR BRASILEIRO NO PAÍS DE EXPORTAÇÃO.” Tal exigência poderia encontrar amparo no art. 561 do Regulamento Aduaneiro DECRETO Nº 6.759, DE 5 DE FEVEREIRO DE 2009), senão por uma falha formal, que veremos a seguir. Diz o art. 561 do R.A.: Art. 561. Poderá ser estabelecida, por ato normativo da Secretaria da Receita Federal do Brasil, à vista de solicitação da Câmara de Comércio Exterior, a exigência de visto consular em fatura comercial (Decreto-Lei n. 37, de 1966, art. 46, § 2o, com a redação dada pelo Decreto-Lei n. 2.472, de 1988, art. 2o). Parágrafo único. O visto a que se refere o caput poderá ser substituído por declaração de órgão público ou de entidade representativa de exportadores, no país de procedência ou na comunidade econômica a que pertencerem. Portanto, em um primeiro momento, pode parecer que a exigência do visto tem amparo forte do Regulamento Aduaneiro, a não ser pelo detalhe de que esta exigência só poderá se fundar em ato normativo da Receita Federal, ato este criado por solicitação da CAMEX, órgão vinculado ao MDIC, e não simplesmente no art. 561 do Regulamento Aduaneiro, por ser norma de eficácia limitada ou ineficaz. Deveria haver, todavia, uma Instrução Normativa Conjunta editada pela RFB juntamente com a CAMEX ou, com menos preciosismo e embora questionáveis, as seguintes normas editadas simplesmente pela RFB: Instrução Normativa, Ato Declaratório Interpretativo, Ato Declaratório Executivo ou Portaria. Porém, não existe nenhum ato normativo como os elencados anteriormente, que venham a reger a matéria. Importante destacar que a RFB, na maior parte das vezes, dispensa a possibilidade de apresentação de documento substitutivo emitido por Câmaras de Comércio ou entidades representativas, ferindo frontalmente o parágrafo único do art. 561 do RA, que diz: “Parágrafo único. O visto a que se refere o caput poderá ser substituído por declaração de órgão público ou de entidade representativa de exportadores, no país de procedência ou na comunidade econômica a que pertencerem. Ou seja, a RFB (Receita Federal do Brasil) quando exige o visto, o faz de forma cabalmente ilegal, porque o art. 561 do RA é uma norma sem eficácia, em coma, moribunda. Os importadores, quando se depararem com esta exigência absurda, deverão buscar a via judicial para questionarem o abuso fiscal, a fim de desembaraçarem seus bens.
Export detention de contêineres
Despesa que incomoda muitos exportadores embarcadores, a cobrança de export detention vem sendo cada vez mais intensificada pelos transportadores marítimos, uma vez que, deixando a hipocrisia de lado, representam sim uma considerável fonte de receita para estas empresas, assim como as demurrages na importação. Tal cobrança começou a ser massificada a partir do ano 2000, mais ou menos. Antes, o que se tinha, eram cobranças isoladas que, no caso de inadimplemento do exportador embarcador, eram simplesmente arquivadas sem que fossem tomas medidas judiciais para recebimento dos valores devidos. Atualmente, temos um quadro bem diferente, pois esta questão foi muito bem alinhada pelos departamentos jurídicos das transportadoras marítimas, que trabalharam na formatação de avisos prévios da cobrança no ato da contratação do serviço, que se dá na confirmação da reserva de praça (booking confirmation). A export detention, também chamada por muitos de “demurrage na exportação” é parecida com a demurrage de containers da importação, seja no formato da cobrança, seja na sua natureza jurídica, que também é de caráter indenizatório e decorre de obrigação contratual. Sua cobrança visa a repor ao transportador marítimo as perdas oriundas da indevida retenção de seu equipamento. A diferença relevante em relação à demurrage se dá na questão que envolve a solidariedade da cobrança. A demurrage, como se sabe, é gerada no destino, depois da emissão do contrato de transporte (vale ressaltar, que devemos considerar o fato de que a imensa maioria dos Bills of Landing tem nas suas clausulas tal obrigação como solidária). Assim, para efeito de cobrança de demurrage, não importa quem contratou o frete, ou seja, é totalmente independe do INCOTERM pactuado na operação de compra e venda da mercadoria entre exportador e importador. Na cobrança de export detention, no que concerne a solidariedade, deve sim ser observada o sujeito que está contratando o serviço de transporte. Embora o INCOTERM também não tenha influencia para efeito da cobrança da export detention, já que é considerado um negocio estabelecido entre importador e exportador, o qual não envolve o transportador marítimo, mesmo assim, ele determinará o sujeito que está tomando o serviço. Em algumas operações de comercio exterior, como é o caso do CFR (Custo e Frete), a contratação do serviço de transporte é feita pelo exportador, sem a intervenção do importador. Neste caso, como a obrigação vem descrita no booking confirmation que o transportador marítimo envia somente ao exportador embarcador, mesmo constando o nome do importador consignatário, ficaria complicada uma cobrança contra o este último. Já nas operações FOB (Free on Board), cuja contratação é feita pelo importador consignatário, este passa a ter ciência das condições contratuais pré-embarque e, neste caso, a cobrança não seria direcionada ao exportador embarcador, normalmente. Para que possa ser feita a cobrança ao exportador embarcador, o transportador deverá comprovar que o cientificou antes do inicio da operação. Seja como for, a questão da solidariedade deve estar bem definida no booking conformation, até porque, à luz da legislação brasileira, solidariedade não pode ser presumida, deve ser oriunda de vontade entre as partes, ou estabelecida ou estabelecida em lei, nos termos do Art. 265 da Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002, Código Civil. Outra questão bem controversa na cobrança da export detention ocorre nas operações em que o fechamento da reserva de praça é feita por um agente do exportador embarcador ou importador consignatário. Nestes casos, quando o embarque for efetivado, a cobrança será realizada contra os beneficiários do transporte quais sejam: Exportador embarcador e importador consignatário, valendo o que foi mencionado no parágrafo anterior. Já nos casos de não efetivação de embarque, se o agente não observar a sua função de mero agente na operação (as agent for), a cobrança poderá ser direcionada para ele. Isso costuma acontecer em reservas de praça fechadas por despachantes aduaneiros que não tomam esta precaução, por exemplo. Quando começa e quando termina a cobrança de export detention? A contagem do tempo para cobrança da export detention se dá no ato da retirada do contêiner do terminal de depósito do armador. A partir deste momento, o sujeito que contratou o serviço de transporte passa a utilizar o seu free time, que é o prazo de livre utilização do contêiner até a entrega no porto para embarque. O momento em que passa pelo portão do porto (gate in) é considerado, em uma situação normal e pela imensa maioria das transportadoras, o fechamento da cobrança da export detention. Neste aspecto, vale ressaltar que fica a cargo do transportador encerrar a contagem de tempo no momento de entrada no porto, ou na data do embarque. Contudo, como a data de atracação do navio no ato do fechamento é estimada, poderia trazer discussões infindáveis acerca do dia exato para o encerramento da cobrança. Como excludentes de responsabilidades do pagamento da export detention, as ragras são as mesmas estabelecidas nas demurrages, ou seja, todos os atos e fatos que são imputáveis aos transportadores marítimos que, eventualmente, provocara, ou contribuíram para o atraso na operação. Norteando às cobranças de export detention, devem também ser levadas em conta as situações que fujam à normalidade. Quais seriam elas? Embarques não efetivados: Nestes casos, a contagem do tempo para a cobrança da export detention será finalizada quando a unidade for entregue ao transportador marítimo no seu deposito de vazios. Porém, existem situações distintas em que os embarque deixam de ocorrer que, em tese, não alterariam o momento de encerramento da contagem de tempo, mas que os tomadores dos serviços de transporte devem ficar atentos. O caso mais simples de cobrança de export detention em embarques não efetivados são aqueles em que os containers são retirados do deposito de vazios e a desistência do embarque ocorre antes da entrada do container no porto (gate in). Porém, existem casos em que as mercadorias de exportação não embarcam, porque foram abandonadas pelos tomadores do serviço no porto de embarque, ou, porque foram apreendidas pelas autoridades. Nestes casos, os tomadores do serviço devem tomar as providencias para devolver o container ao transportador, pois nada será alterado
Origem Não Preferencial
Para entendermos o que é origem não preferencial devemos entender primeiro o que é origem, em nossa área, e depois o que são regras de origem.. Origem – refere-se ao país de origem de fabricação de um bem. Como há produtos feitos parcialmente com insumos do país de fabricação e outros importados, há necessidade do estabelecimento de REGRAS DE ORIGEM, para sabermos se determinado bem pode ser havido ou não como originário de tal país. As Regras de Origem A SECEX em seu site nos dá a seguinte definição: As regras de origem são critérios de transformação substancial eleitos por países ou blocos para caracterizar a origem das mercadorias e podem ser classificadas em duas categorias: a) Normas de origem preferenciais – regulamentos que são negociados entre as partes signatárias de acordos preferenciais de comércio, cujo objetivo principal é assegurar que o tratamento tarifário preferencial se limite aos produtos extraídos, colhidos, produzidos ou fabricados nos países que assinaram os acordos. Os elementos principais das regras de origem são: critérios de origem, condições de expedição e de transporte e provas documentais. Se as exportações forem realizadas para países com os quais o Brasil têm acordo de preferências tarifárias, é importante consultá-lo previamente. Nestes casos, se o produto for objeto de preferências pactuadas, para usufruir deste tratamento é necessário obter o Certificado de Origem. Este Certificado é o documento que permite comprovar se os bens cumprem os requisitos de origem exigidos em cada acordo e as condições estabelecidas. b) Normas de origem não preferenciais – conjunto de leis, regulamentos e determinações administrativas de aplicação geral, utilizados pelos países para a determinação do país de origem das mercadorias, desde que não relacionados a regimes comerciais contratuais ou autônomos que prevejam a concessão de preferências tarifárias. Esta categoria abrange todas as regras de origem utilizadas em instrumentos não-preferenciais de política comercial, como na aplicação de: tratamento de nação mais favorecida, direitos antidumping e direitos compensatórios, salvaguardas, exigências de marcação de origem, restrições quantitativas discriminatórias ou quotas tarifárias, estatísticas e compras do setor público, entre outros. Essas normas são estabelecidas pelo país importador. Por isso, o MDIC. Em suma, a diferença entre ORIGEM PREFERENCIAL e ORIGEM NÃO PREFERENCIAL está na existência ou não de Acordos Preferenciais de Comércio, nos quais estejam estabelecidas TARIFAS PREFERENCIAIS. Infere-se, pois, que a Origem Preferencial, quando existente, prevalece sobre a Origem Não Preferencial em eventual caso de confronto. De fato, os acordos internaconais têm natureza jurídica de lei, integrando o ordenamento jurífico brasileiro. Somente poderão ser alterados através de denúnica do tratado ou seu esgotamento, caso tenha sido assinado por prazo certo. Já a origem não preferencial atende a interesses econômicos pátrios e seu regramento pode ser alterado para atender a esses interesses. No caso da existência de Acordo, ainda que tais interesses existam, o que estiver expresso no acordo tem que ser respeitado. O Certificado de Origem Não Preferencial A CAMEX, por meio da Resolução 89/10. art. 3º, assim se manifestou a respeito: Art. 3o – A Secretaria de Comércio Exterior (SECEX) promoverá, na fase de licenciamento, a verificação da certificação de origem não preferencial, sob os aspectos de autenticidade, veracidade e observância das normas vigentes, sem prejuízo da adoção das medidas de sua responsabilidade quanto às exigências e sanções aplicáveis. O Licenciamento de Tais Produtos O licenciamento de produtos qualificados com ORIGEM NÃO PREFERENCIAL está regulado pela Portaria SECEX 39/11, que em seu art. 2º assim dispõe: Art. 2º O licenciamento de importação, quando utilizado para a implementação de instrumentos não preferenciais de política comercial, em especial aqueles de defesa comercial, poderá ser objeto do procedimento especial de verificação de origem regulamentado pelo Capítulo III desta Portaria. Parágrafo único. A SECEX selecionará, por meio de análise de riscos, os pedidos de licenças que estarão sujeitas ao procedimento especial de verificação de origem, devendo considerar, dentre outros fatores: I – histórico de importações do bem declarado no pedido de licença de importação; II – histórico das operações realizadas pelo importador; III – histórico das exportações, para o Brasil, do país de origem declarada do bem; IV – histórico das exportações, para o Brasil, das empresas declaradas como exportadoras e produtoras do bem em questão; V – condições relativas a certificados ou outros documentos de origem que instruam o pedido de licença e sua entidade emissora; e VI – denúncias fundamentadas apresentadas à SECEX na forma do Capítulo II desta Portaria. Parágrafo único. Quando o pedido de licença for selecionado para procedimento especial de verificação de origem, esse fato será informado ao importador por meio do Sistema Integrado de Comércio Exterior (SISCOMEX), sendo-lhe apresentada exigência para que apresente ao DEINT todas as informações solicitadas na forma do art. 14 desta Portaria. (OBS do autor – Embora estranho, o artigo acima foi publicado com dois parágrafos únicos.) Casos Especiais Recentemente o Brasil criou, pela Lei 12.546/11, o REINTEGRA, mecanismo para fomentar as exportações, desonerando alguns impostos, O parágrafo 3ª do artigo 2º dessa lei cuida do conceito de origem específico para ela, portanto, uma origem não preferencial: Art. 2o No âmbito do Reintegra, a pessoa jurídica produtora que efetue exportação de bens manufaturados no País poderá apurar valor para fins de ressarcir parcial ou integralmente o resíduo tributário federal existente na sua cadeia de produção. § 1o O valor será calculado mediante a aplicação de percentual estabelecido pelo Poder Executivo sobre a receita decorrente da exportação de bens produzidos pela pessoa jurídica referida no caput. § 2o O Poder Executivo poderá fixar o percentual de que trata o § 1o entre zero e 3% (três por cento), bem como poderá diferenciar o percentual aplicável por setor econômico e tipo de atividade exercida. § 3o Para os efeitos deste artigo, considera-se bem manufaturado no País aquele: I – classificado em código da Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (Tipi), aprovada pelo Decreto no 6.006, de 28 de dezembro de 2006, relacionado em ato do Poder Executivo; e II – cujo custo dos insumos importados não ultrapasse o limite percentual do preço
Os riscos da comercialização de contêineres estrangeiros no Brasil
A comercialização e/ou a locação de contêineres é um mercado que vem sendo cada vez mais explorado no Brasil. Como em todo mercado em ascensão, e que tem um produto muito vendável, temos o surgimento de diversos intermediários que não dominam lá muito bem o produto que estão vendendo, colocando em risco vendedores e compradores de forma indiscriminada. Diversas são as finalidades e o uso desses equipamentos contentores de cargas, como, por exemplo, para fins de moradias adaptadas, módulos de escritório, banheiros, vestiários, dormitórios, guarda volumes, armazéns secos e frigorificados, módulos de maquinas, geradores, etc. Quem nunca viu um contêiner módulo em uma obra de construção civil? Muitos dos contêineres que estão sendo expostos à venda, ou alugados no mercado interno são os chamados “scraps” (sucatas) de transportadores marítimos ou cias. de leasing estrangeiras. São equipamentos que estão fora dos padrões do transporte e que, em tese, não estão mais aptos a suportar as intempéries de uma aventura marítima. No que se refere à comercialização no mercado interno, contêineres de fabricação nacional, ou estrangeiros nacionalizados, estão em total conformidade com a norma. Contudo, o foco do presente artigo é expor às empresas que têm como atividade comercial a venda ou o aluguel de contêineres (módulos ou armazéns estáticos, etc) pontualmente, àquelas que adquiriram contêineres estrangeiros usados junto a empresas de navegação ou leasings, sem devido processo de importação (despacho para consumo), contêineres esses que entraram no Brasil sob regime de admissão temporária automática, um benefício concedido através da Lei nº 9.611 de 1998. Também é objetivo do presente artigo alertar que existem responsabilidades cíveis, tributárias e criminais que poderão recair sobre vendedores e compradores, visto que a aquisição de contêineres estrangeiros sem o obrigatório processo de importação configura dano ao erário, justamente por se tratar de uma operação considerada fraudulenta, que se aproveita de uma ausência de controle e da desburocratização feita pelo governo Federal, no sentido de não criar entraves para a entrada de unidades de carga no Brasil, seja para atender a importação e a exportação, seja para utilização no mercado doméstico da cabotagem, por exemplo. O Art. 26 da Lei nº 9.611 de 1998 (Lei do Transporte Multimodal) dispôs sobre o livre tráfego dos contêineres no Brasil, estipulando que é livre a entrada e saída no País, de unidade de carga e seus acessórios e equipamentos, de qualquer nacionalidade, bem como a sua utilização no transporte doméstico. Já o Art. 5º da Instrução Normativa SRF nº 285, de 14 de janeiro de 2003, dispôs sobre a aplicação automática do regime com suspensão total do pagamento de tributos: “Art. 5º Consideram-se automaticamente submetidos ao regime de que trata o art. 4º: (…) V – as unidades de carga estrangeiras, seus equipamentos e acessórios, inclusive para utilização no transporte doméstico; (…)”. Da leitura desta norma, verifica-se que o benefício do regime de admissão temporária, no caso de contêineres, é concedido para contêineres que venham a ser utilizados como unidades de carga, termo que está bem definido no Art. 24 da Lei nº 9.611 de 1998: “Art. 24. Para os efeitos desta Lei, considera-se unidade de carga qualquer equipamento adequado à unitização de mercadorias a serem transportadas, sujeitas a movimentação de forma indivisível em todas as modalidades de transporte utilizadas no percurso.” O legislador definiu que o contêiner pode ou não ser caracterizado como unidade de carga. Então, do ponto de vista legal, pode-se afirmar que o contêiner recebe tratamento de unidade de carga, se for utilizado exclusivamente no transporte de mercadorias. Conseqüentemente, será a sua utilização que definirá o direito ao regime de admissão temporária com suspensão total de tributos. As empresas que trabalham com locação de contêineres e que adquiriram esses equipamentos irregularmente, ou seja, realizaram a compra de unidades estrangeiras, de propriedade de armadores ou leasings estrangeiras, que foram admitidas temporariamente no país, com o benefício de unidade de carga e sem o devido processo de importação (despacho para consumo), correm o risco de perder seus equipamentos através de apreensão e aplicação de pena de perdimento. Neste sentido, vale destacar o que dispõe o Art. 689, inciso X, do Decreto 6.759 de 05 de fevereiro de 2009: “Art. 689. Aplica-se a pena de perdimento da mercadoria nas seguintes hipóteses, por configurarem dano ao Erário (Decreto-Lei no 37, de 1966, art. 105; e Decreto-Lei no 1.455, de 1976, art. 23, caput e § 1o, este com a redação dada pela Lei no 10.637, de 2002, art. 59): X – estrangeira, exposta à venda, depositada ou em circulação comercial no País, se não for feita prova de sua importação regular” Aos que não cumpriram o que determina a letra da lei na hora de adquirir tais equipamentos, existe o risco iminente de que, em processo investigatório, as autoridades competentes requeiram das vendedoras ou locadoras de contêineres a comprovação de entrada das unidades nos patrimônios dessas empresas. A não comprovação poderá trazer sérios transtornos aos sócios e representantes legais dessas empresas, inclusive seus clientes. O SISCOMEX CARGA é capaz de controlar a entrada e a saída de contêineres. Embora a Receita Federal não se empenhe no efetivo controle, poderá requerer essas informações junto aos armadores e leasings, que são os responsáveis pelos seus contêineres enquanto permanecerem no Brasil. A aquisição de contêineres estrangeiros, que entraram no Brasil sob Regime de admissão temporária automático com suspensão total de tributos, sem o obrigatório processo de importação, como dito acima, constitui dano ao erário e, além de multa, tendo em vista que as condutas de comprado e vendedor estão tipificadas no Código Penal, as empresas adquirentes terão seus sócios e representantes legais respondendo criminalmente. As empresas, ou pessoas físicas, que desejem alugar ou adquirir contêineres de empresas no Brasil deverão ficar atentas e exigir dos locadores e vendedores a comprovação da origem da entrada dos equipamentos na empresa. Isso porque, correm o risco de ver as suas operações e projetos afetados por eventuais processos investigatórios das autoridades. Como se vê, é possível que os negócios com contêineres estrangeiros aconteçam de forma licita
Demurrage de containers nos casos de pena de perdimento por abandono ou apreensão.
Por André de Seixas | @comexblog O presente artigo foi motivado por e-mail recebido de um leitor, após a leitura do artigo publicado aqui no comexblog.com. A dúvida do leitor era a respeito da demurrage de containers, quando aplicada a pena de perdimento às mercadorias. Do caso concreto A empresa do leitor importou mercadorias, acondicionadas em containers, que teve o perdimento decretado pela Receita Federal. Após disputa judicial, a ação foi julgada improcedente, e não se tem maiores detalhes. Com a derrota, suscitou o leitor dúvida se sua empresa continuaria responsável pelo pagamento da demurrage, ou se a Receita passaria a ser responsável, já que, decretado o perdimento, a competência para administrar e efetuar a destinação das mercadorias aprendidas é da Receita. Da Demurrage e da Pena de Perdimento Esclareça-se que a demurrage de container, ou sobreestadia, segundo entendimento majoritário da doutrina e jurisprudência, tem natureza indenizatória, e decorre de obrigação contratual prevista no contrato de transporte, ou contrato acessório. Sua cobrança visa a repor ao transportador marítimo as perdas oriundas da indevida retenção de seu equipamento. Tanto embarcador quanto consignatário/importador, ou até mesmo os todos juntos, respondem pelo pagamento junto ao transportador marítimo. Por sua vez, a pena de perdimento da mercadoria é sanção administrativa considerada das maiores e mais gravosas. Consiste na decretação pela Autoridade Fiscal da perda de mercadorias e veículos, caso seja verificada na operação de comércio exterior dano ao erário. As hipóteses de pena de perdimento estão previstas no artigo 23 do Decreto-Lei nº 1.455/76. Terá relevância para análise somente o perdimento de mercadorias acondicionadas em containers e a delimitação da responsabilidade de cada agente do comercio exterior, nos casos de abandono de carga. Vinculo de carga e consignatário A falta de vinculo com a carga é a maior causa de abandono de mercadoria, ou seja, mercadorias descarregadas em zona primária cujo desembaraço aduaneiro não foi iniciado pelo consignatário/importador. Depois de 90 dias da descarga, a Receita Federal inicia o processo para aplicação da pena de perdimento. Como se sabe, existem casos de embarcadores que colocam cargas nos navios e consignam os Bs/L para empresas, sem que estas tenham conhecimento. A comprovação do vínculo pelo transportador pode ser feita de diversas formas: conseguir provas de que a mercadoria foi adquirida pelo importador, ou seja, casos em que os embarcadores/exportadores apresentem documentos que comprovem a efetivação da compra; quando a contratação do serviço de transporte internacional foi feita pelo próprio importador no destino; trocas de mensagens; requerimentos; registro da Declaração de Importação, ou de uma DTA; e com a identificação de ações ajuizadas em face da Receita Federal Assim, comprovado o vinculo entre carga e consignatário o transportador marítimo terá elevadas chances de êxito em qualquer cobrança de demurrage. As excludentes de responsabilidade dos consignatários pelo pagamento da demurrage, seriam os atos e fatos imputáveis ao transportador, caso fortuito ou força maior. Container não é embalagem da mercadoria. A Lei n° 9.611/98 é clara quanto ao fato de que o container não constitui embalagem da mercadoria. Ademais, hoje é pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça de que não existe relação de acessoriedade entre o contêiner e as mercadorias nele armazenadas/transportadas para fins de pena de perdimento (Precedentes: REsp 1056063/SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 01/09/2010; REsp 908.890/SP, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, DJU 23.4.2007; e REsp 526.767/PR, Rel. Min. Denise Arruda, Primeira Turma, DJU 19.9.2005). No caso trazido pelo leitor, a empresa, obrigada contratualmente ao pagamento da demurrage ao transportador, por possuir interesse e legitimidade, poderia ter requerido a desunitização dos equipamentos que acondicionavam as cargas abandonadas à Receita Ferderal, ficando elas guardadas no armazém do recinto alfandegado até decisão final. É importante ressaltar que a desunitização poderá ser obtida por requerimento administrativo ou via judicial em caso de recusa da Receita Federal. Assim, a responsabilidade da empresa pelo pagamento da demurrage ao armador, ainda com o abandono da carga e o perdimento decretado, persiste por força de contrato, especialmente se a mesma quedou-se inerte em buscar a desunitização do container para devolução ao armador/transportador. Decisões judiciais esse entendimento: “Processo de perdimento de bens, que resultou em leilão e posterior retirada da carga, não retira a responsabilidade da negociante pela demora na liberação do contêiner.” (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro – 16ª Câmara Cível, Apelação nº 0002550-92.2005.8.19.0064, julgado em 25.01.2011) Todavia, caso a empresa busque a desunitização do container e a mesma seja negada pela Receita Federal imotivadamente, como, por exemplo, sob o fundamento de falta de espaço físico para a armazenagem das mercadorias desovadas, terá direito em face da Receita Federal ao ressarcimento dos danos materiais causados, dentre esses danos as eventuais despesas com armazenagem e sobreestadias. Seguem algumas decisões judiciais neste sentido: “ADMINISTRATIVO E CIVIL. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. APREENSÃO DE CONTAINERS JUNTAMENTE COM MERCADORIA SUSPEITA DE AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DE TRIBUTO. IMPOSSIBILIDADE. DANO MATERIAL. OCORRÊNCIA. 1. O contêiner é equipamento ou acessório do veículo do transportador e não se constitui embalagem da mercadoria (art. 24 da Lei n.º 9.611/98), portanto, não é devida a sua apreensão por suspeita de não pagamento de tributo relativo à carga ali contida. 2. Precedentes do STJ: AGA 200702182326 – (950681) – 1ª T. – Rel. Min. José Delgado – DJe 23.04.2008; e RESP 200602677491 – (908890 SP) – 2ª T. – Rel. Min. Castro Meira – DJU 23.04.2007 – p. 00249) 3. Demonstrado que a União deu causa as despesas tidas com o pagamento de sobreestadias dos containers, é devido o ressarcimento pelos danos materiais causados a parte demandante no valor de R$ 123.600,00, conforme acordo judicial firmado entre a empresa autora e a proprietária dos containers nos autos da ação de cobrança de n.º 583.00.2006.153353-0. 4. Manutenção da verba honorária em R$ 1.000,00, considerando não só a baixa complexidade da matéria aqui discutida, como o reduzido tempo de tramitação dos autos (feito ajuizado em 2007), nos termos do art. 20, parágrafo 4º do CPC. 5. Apelações e remessa oficial improvidas.” (AC 200783000049573, Desembargador Federal Francisco Wildo, TRF5 – Segunda Turma, DJE –
Defesa comercial e antidumping
Trata-se de um tema de interesse nacional, cuja discussão se ramifica e se ramificará infinitamente ao longo dos tempos, a partir do momento em que envolve interesses particulares, de determinadas classes e de toda a sociedade brasileira. Todos nós queremos consumir produtos de melhor qualidade, com tecnologia mais avançada, com preços mais competitivos. Os empresários importadores também querem vender produtos que lhe garantam uma margem de lucro melhor. Os países exportadores querem ver seus produtos bem distribuídos pelo mundo. Os países importadores querem proteger seus empregos, sua economia. O resultado dessa complexa equação é fácil de dizer e teorizar, mas, ao mesmo tempo, extremamente difícil de fazer. O importante é saber que esta equação mexe com o bolso e a vida de cada um de nós, com empregos, com investimentos de infra-estrutura, etc. Esta importante ferramenta do Comércio Internacional foi introduzida quando da assinatura do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio, cujo texto consta da Ata Final da Segunda Reunião da Comissão Preparatória da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Emprego, assinada pelo Brasil e outros países, em Genebra, a 30 de outubro de 1947 e no Brasil através da Lei nº. 313 de 30 de Julho de 1948. Porém, somente a partir do Decreto nº. 1488 de 11 de maio de 1995 e da Circular SECEX nº 19/1996, é que os procedimentos para o estudo de aplicação destas medidas ficaram mais claros e passaram a ser solicitados com mais freqüência pela indústria nacional, em nome da defesa da produção nacional, para garantir a sobrevivência de setores industriais nacionais despreparados, com seus parques industriais tecnologicamente defasados, com uma tributação interna nas alturas. Isso, para conseguir fazer frente aos produtos importados, que entram no Brasil com valores extremamente competitivos, devido aos menores custos de produção e a menor tributação interna nos países de origem. É muito comum a confusão na definição dos termos referentes à defesa comercial e suas aplicações. Por defesa comercial entendem-se as medidas que podem ser impostas pelo país importador, quando verificadas determinadas condições descritas em acordos internacionais, quais sejam: (i) A prática a ser combatida; (ii) O dano à indústria doméstica e (iii) o nexo de causalidade. Essas práticas podem ser o subsídio do país exportador (contra o qual se aplicam medidas compensatórias), a prática de dumping (contra a qual se aplicam medidas antidumping) ou o surto de importações (que podem gerar medidas de salvaguardas). Sobre os instrumentos de defesa comercial propriamente ditos, sua aplicação deve observar compromissos assumidos pelo Brasil no plano internacional, com requisitos que não podem ser eliminados para abertura de investigações. Tais regras buscam garantir ampla oportunidade de defesa a todas as partes interessadas e a transparência na condução do processo. O não cumprimento dos procedimentos estabelecidos pelo Acordo Antidumping, em especial os relativos à garantia de oportunidade de defesa das partes, pode implicar a contestação da medida que vier a ser adotada ao final da investigação e a consequente revogação da mesma por determinação da OMC. Sobre o prazo das investigações, os Acordos Antidumping e de Subsídios e Medidas Compensatórias preveem um período de até 18 meses para a conclusão das mesmas, contados a partir da data de abertura. Segundo as definições do Decreto nº. 1602 de 23 de agosto de 1995, ficam assim definidas as maneiras de cobrança desses direitos: “Art. 45. Para os efeitos deste Decreto, a expressão “direito antidumping” significa um montante em dinheiro igual ou inferior à margem de dumping apurada, calculado e aplicado em conformidade com este artigo, com o fim exclusivo de neutralizar os efeitos danosos das importações objeto de dumping. § 1º O direito antidumping será calculado mediante a aplicação de alíquotas ad-valorem ou específicas, fixas ou variáveis, ou pela conjugação de ambas. § 2º A alíquota ad valorem será aplicada sobre o valor aduaneiro da mercadoria, em base CIF, apurado nos termos da legislação pertinente. § 3º A alíquota específica será fixada em dólares dos Estados Unidos da América e convertida em moeda nacional, nos termos da legislação pertinente “ Quando da importação de produtos que tenham sido alvo de tal cobrança, o momento da cobrança está regulamentado pelo Decreto nº. 6759/09 (Regulamento Aduaneiro): “Art. 788 O cumprimento das obrigações resultantes da aplicação dos direitos antidumping e dos direitos compensatórios, sejam definitivos ou provisórios, será condição para a introdução no comércio do País de produtos objeto de dumping ou de subsídios (Lei nº 9.019, de 1995, art. 7º, caput). § 2º Os direitos antidumping e os direitos compensatórios são devidos na data do registro da declaração de importação (Lei nº 9.019, de 1995, art. 7º, § 2º, com a redação dada pela Lei nº 10.833, de 2003, art. 79).” Com as penalidades referentes à falta de recolhimento, versados no mesmo artigo do citado diploma legal: “§ 3º A exigência de ofício de direitos antidumping ou de direitos compensatórios e decorrentes acréscimos moratórios e penalidades será formalizada em auto de infração lavrado por Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil, observado o disposto no Decreto nºo 70.235, de 1972, e o prazo de cinco anos, contados da data de registro da declaração de importação (Lei n 9.019, de 1995, art. 7º, § 5º , com a redação dada pela Lei nº 10.833, de 2003, art. 79). § 4º Verificado o inadimplemento da obrigação, a Secretaria da Receita Federal do Brasil encaminhará o débito à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, para inscrição em Dívida Ativa da União e respectiva cobrança, observado o prazo de prescrição de cinco anos (Lei nº 9.019, de 1995, art. 7º, § 6º, com a redação dada pela Lei nº 10.833, de 2003, art. 79).” Uma dúvida muito comum para aplicação das medidas compensatórias em vigor, é se as mesmas passam a fazer parte integrante da base de cálculo dos tributos inerentes a importação. A resposta é NÃO, uma vez que: (i) Quando da aplicação, cobra-se um “direito” e não um “tributo”. Este direito tem caráter indenizatório, desqualificando da condição de tributo, que é definido no CTN em seu art. 3º:
Falsificação de B/L: Abordagens técnicas e legais
Por André de Seixas | @comexblog Introdução Tratei do tema falsificação de B/L neste outro post. O artigo teve grande repercussão e, por esse motivo, decidi dar continuidade ao assunto, porém, dividindo o espaço com dois conceituados advogados. Recebi algumas mensagens provenientes de agentes de cargas e armadores que passaram pelos mesmos problemas. Em uma delas, um armador informou que fez vários investimentos em segurança adotando, por exemplo, Bs/L com marca d água oculta, que somente pode ser observada com o uso de aparelhos infravermelhos, lupa, etc. Além de investimentos, os armadores também passaram a adotar modos operantes mais rígidos para liberação das cargas, no sentido de obrigar consignatários, importadores e despachantes a se dirigirem até as agências marítimas para apresentar os Bs/L originais. Somando-se ao fato de que somente os armadores têm o privilégio de bloquear o “frete armador” no SISCARGA, o que impede a saída da carga do recinto alfandegado, não seria um erro afirmar que as empresas de navegação estão conseguindo se blindar. Então, atualmente, as grandes vítimas desses crimes, além dos exportadores estrangeiros, são as empresas NVOCC`s e seus agentes de carga no Brasil. O motivo é bem simples: Não possuem o privilégio de bloquear o “frete armador” no SISCARGA. O que pode ser mudado, para que todos players possam ficar protegidos dessa prática criminosa? É uma solução técnica ou jurídica? Quais os crimes e as penas previstas na legislação brasileira? Estas e outras serão respondidas nesse artigo. Uma Abordagem geral sobre o B/L, procedimentos e a sua falsificação (por Dr. Luiz Henrique Oliveira) O conhecimento de embarque ou “bill of lading” é o documento mais importante da navegação, tornando-se um instrumento com múltipla função, servindo como um contrato, recibo e título de crédito (sua posse equivale à posse das mercadorias que descreve). No Brasil, o conhecimento de embarque permanece regulado pelo Decreto 19.473, de 1930 (ato normativo primário em vigor). Quase um século antes da criação do referido Decreto, o Código Comercial Brasileiro, em seus artigos 575 e seguintes (ainda em vigor), já estabelecia o que o conhecimento pode ou não conter. Assim, mesmo que a Aduana pretendesse substituir inteiramente o “bill of lading” pelo conhecimento eletrônico, é certo que uma instrução normativa não poderia revogar um Decreto com status de lei (tendo sido recepcionado como tal). Daí a importância desse documento, cuja via original deve ser sempre apresentada no ato da retirada das mercadorias pelo importador e, assim, devidamente conferida pelo recinto alfandegado. Existem casos, porém, em que o exportador, desconfiando do comportamento doloso do importador, acaba por reter as vias originais do conhecimento, solicitando ao transportador a retenção física da mercadoria no terminal portuário. Ao tomar conhecimento de que o importador não detém a posse da via original do B/L, o transportador passa a reter a posse das mercadorias. Em defesa do transportador, aplica-se a regra da exceptio non adimpleti contractus, ou exceção do contrato não cumprido (art. 476 do CCB), uma vez que o importador, antes de cumprida sua obrigação (apresentação do b/l original), não pode exigir o implemento da obrigação do transportador (entrega das mercadorias). Nesses casos, o agente marítimo promove o bloqueio automático no SISCARGA na tentativa de impossibilitar a retirada da mercadoria pelo importador. É aí que residem os problemas: Um deles se dá pelo fato de que o sistema possibilita o bloqueio somente ao agente marítimo (representante do armador), e não ao agente de cargas (representante do NVOCC), que não possui acesso a tal dispositivo. Assim, nos embarques realizados por empresas NVOCC`s, não é possível o bloqueio automático das mercadorias no SISCARGA, ficando o agente de carga totalmente desamparado. Outro problema é que o sistema possibilita o bloqueio das mercadorias apenas na hipótese de falta de pagamento do frete. Na prática, a IN800/2007, em seu artigo 40, reproduziu o texto do artigo 7º do Decreto 116/67, dispondo que é facultado ao armador determinar a retenção da mercadoria em recinto alfandegado, até a liquidação do frete devido ou o pagamento da contribuição por avaria grossa declarada. Acontece que na maioria dos casos de falsificações de Bs/L, o importador também realiza o pagamento do frete ao transportador, não cabendo, em tese, a justificativa para a retenção da mercadoria por falta de pagamento do frete, o que tem sido objeto de calorosas discussões. Ao constatar a retirada indevida das mercadorias pelo importador, o transportador (seja ele armador ou NVOCC) poderá, através de seu agente no destino, providenciar o registro de um Boletim de Ocorrência, comunicando tal fato às autoridades competentes. Além de demonstrar a boa fé do transportador, a lavratura do Boletim de Ocorrência poderá salvaguardar seus interesses na hipótese de eventual ação de perdas e danos movida pelo exportador. Logo, não se poderia cogitar em negligência do transportador, uma vez que o resultado do ilícito exorbita a previsão do homem mediano. Na verdade, o ideal seria que o SISCARGA possibilitasse o bloqueio em situações que não somente aquela prevista (falta de pagamento do frete), facilitando seu amplo acesso aos agentes marítimos e agentes de carga. Portanto, caberá à Receita Federal (RFB) não só o desafio de adaptar a legislação aduaneira às necessidades do comércio exterior brasileiro, mas também de aprimorar o SISCOMEX CARGA para fazer valer o seu propósito de instrumento controlador. Uma abordagem criminal sobre a falsificação de B/L (por Dra. Marília Bonavides) Pela Instrução Normativa da Receita Federal de nº 800/2007, que instituiu o novo sistema, todo o tramite de importação de mercadoria e desembaraço alfandegário está informatizado. Todas as etapas estão previstas no programa. Desta maneira, ficou salvaguardada a tributação para a Receita Federal, o que constitui um importante avanço, porém a divulgação da senha (nº CE-Mercante) no sistema facilitou, ao importador desonesto, falsificar o B/L e conseguir liberar a carga sem pagar o exportador, ou seja, o novo sistema deixou vulnerável a segurança do negócio e a credibilidade do Brasil no comércio exterior ficou ameaçada. São necessários alguns ajustes para sanar esta lacuna. A luz do Direito Penal, em uma análise superficial, identifica-se, de imediato, a presença de 02 tipos
A aplicação do CDC nos Transportes Marítimos de Bagagens
No âmbito do transporte marítimo de cargas e mercadorias tem-se um acalorado debate sobre a aplicação das normas protetivas de natureza consumerista. É notória a “blindagem” legislativa pretendida, a fim de garantir uma “segurança jurídica” nas relações jurídicas nacionais e internacionais de natureza marítima. No entanto, tal pretensão vem cedendo espaço aos que defendem a aplicação do Código de Proteção e Defesa do Consumidor – CDC, nos transporte marítimo de cargas e mercadorias. De fato, trata-se de uma norma de natureza principiológica, cujo pilar se funda em garantia fundamental, insculpida no artigo 5° da Carta da República, cujo objetivo principal é proteger o consumidor vulnerável e hipossuficiente na relação jurídica contratual ou extracontratual, a depender. A defesa da tese pela aplicabilidade ou não do CDC segue a linha da comprovação/existência da vulnerabilidade e da hipossuficiência na prestação do serviço de transporte marítimo de cargas e mercadorias, bem como na caracterização da relação de consumo propriamente dita, ou seja, na existência de pelo menos um fornecedor e de um consumidor na cadeia de consumo. A vertente que abraça a tese pela aplicabilidade do Código de Proteção e Defesa do Consumidor sustenta que tanto a vulnerabilidade, quanto a hipossuficiência são presumidas, cabendo ao fornecedor apresentar provas em contrário. Neste ponto, ouso discordar, posto que tanto no âmbito técnico, jurídico ou econômico, torna-se possível aferir a vulnerabilidade daquele que contrata determinado produto ou serviço. Por outro lado, tem-se como clara a existência de um fornecedor de serviço de transporte marítimo, todavia não se pode dizer o mesmo quanto a presença da figura do consumidor. Isto pois, a doutrina se divide em trazer o conceito de consumidor, de um lado tem-se a Teoria Finalista, para a qual consumidor é o destinatário final da fruição do bem, ou seja o consumidor é aquele que deve ultimar a atividade econômica com a retirada de circulação do bem ou serviço, não admitindo que o referido bem seja revendido ou usado profissionalmente. Em sentido oposto, tem-se a Teoria Maximalista que se mostra mais ampla, não importando a definição de destinatário final do bem ou serviço, pugnando pela proteção aos vulneráveis, ainda que tal situação seja presumível. Trazendo tal divergência para o âmbito do contrato de transporte marítimo de carga e mercadorias, os seguidores da Teoria Finalista entendem pela aplicação do CDC a depender da natureza da carga/mercadoria transportada, ao passo que para os defensores da Teoria Maximalista a relação de consumo se encerra com a simples entrega da carga/mercadoria ao seu destino. De certo, pelo acima exposto, a discussão parece perder força quando se tem como objeto da relação contratual o transporte marítimo de bagagem, assim definida como bens destinados ao uso ou consumo pessoal do viajante, em compatibilidade com a natureza de sua viagem, incluindo aqueles destinados a presentear, bem como os destinados ao exercício de sua atividade profissional. Neste contexto, não obstante a teoria abraçada, ainda que a mais restritiva, verifica-se que o bem transportado não se destina ao fomento de qualquer outra atividade, independente de qualquer natureza, sendo certo que a simples entrega em seu destino põe fim a cadeia de consumo. Neste diapasão, indene de dúvidas a aplicação do CDC à espécie. A matéria ganha maiores contornos sob a ótica constitucional, isto porque, o constituinte originário deu à defesa do consumidor o status de direito e garantia constitucional, na forma do inciso XXXII do artigo 5° da Carta Federal, sendo certa a sua conjugação com o artigo 170, V, que eleva a defesa do consumidor à condição de princípio da ordem econômica. Tudo somado, tem o relevante efeito de legitimar todas as medidas de intervenção estatal necessárias a assegurar a proteção prevista. Não apenas isso, o exercício do valor fundamental da liberdade, na esfera da locomoção e da circulação em todo o território nacional, na forma que restou positivada pelo inciso XV do artigo 5° da Constituição da República, reveste o posicionamento da aplicação de medidas protetivas àqueles que pretendem se utilizar de serviços para locomoção de seus bens pessoais. Na mesma linha de pensamento, apenas como fecho de toda a sistemática legislativa constitucional, mister salientar o princípio fundamental da dignidade da pessoa, valor absoluto que traz o ser humano, a pessoa como centro de imputação jurídica, existindo o direito em função da pessoa e para propiciar o seu desenvolvimento. Tal esfera permite afastar ainda qualquer tentativa de elidir a aplicação da legislação consumerista em benefício da aplicação de convenções e tratados internacionais, tais como a Convenção de Roterdam, que pretende dentre outras, limitar a imputação da responsabilidade do transportador. Isto pois, apenas tratados e convenções internacionais que versem sobre direitos humanos, quando aprovados em cada Casa do Congresso Nacional, observados os quóruns exigidos, serão equivalentes às emendas constitucionais, funcionando como cláusulas supralegais, desde que em nada confrontem com os valores e princípios gravados pelo constituinte originário na Carta Constitucional Brasileira. Superadas as discussões e acatada a aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao contrato de transporte marítimo de bagagens há que se verificar os reflexos de tais normas nos casos em concreto. Tem-se, neste sentido, a consagrada responsabilidade objetiva, fundada na teoria do risco integral, na forma do disposto no artigo 14 do CDC, observada ainda a inversão do ônus da prova, conforme preceitua do inciso VIII do artigo 6°. Outrossim, o §3° do mencionado artigo 14 aponta as excludentes de responsabilidade, dispondo de um rol taxativo, onde não prospera qualquer forma interpretativa. Por outro lado, os contratos de adesão, comuns na prestação de serviços de transporte marítimo, evidenciados pelo BL, devem observar a exigências contidas no CDC, em respeito ao princípio da transparência. Devem as cláusulas limitativas de direito serem redigidas em destaque, permitindo imediata e fácil compreensão. Devendo-se adotar sempre a interpretação mais favorável ao consumidor. No que tange as cláusulas abusivas e restritivas, as primeiras devem ser declaradas nulas de pleno direito, enquanto que as outras merecem ser analisadas, e sendo o caso, também deverão ser declaradas como não escritas. Também merece destaque que a aplicação da legislação