RECOF Automotivo: Aspectos Legais e Operacionais (I)
Embora o aparato normativo que estabelece os procedimentos acerca do tema em tela seja muito amplo, este é essencialmente disposto por meio da IN 757/07 e do ADE Coana/Cotec 001/2008. O Regime Aduaneiro Especial de Entreposto Industrial sob Controle Informatizado (Recof) é extremamente criterioso na avaliação de seu processo de habilitação e ainda mais complexo de se operacionalizar, portanto, esse artigo será publicado em 3 partes distintas e inter ligadas, para que seja conferida uma maior substancialidade às informações aqui prestadas. No tocante aos aspectos que serão abordados nessa primeira parte, destacam-se as disposições preliminares, os requisitos e procedimentos necessários para que uma empresa possa habilitar-se ao regime de forma individual, bem como a análise do pedido de habilitação e concessões no deferimento por parte da RFB. O Recof é um regime que permite à empresa importar, com ou sem cobertura cambial e com suspensão do pagamento dos tributos exigíveis, desde que por meio de controle informatizado, mercadorias que, após terem sido submetidas à operação de industrialização, sejam destinadas à exportação ou à venda no mercado interno. Será permitido que até 30% da mercadoria admitida no regime seja despachada para consumo ou reexportada em seu estado original. Os produtos cobertos pelo regime são aqueles constantes do ANEXO I da IN 757/07, bem como suas partes e peças e também aqueles relacionados no ANEXO II da mesma Instrução Normativa. As operações consideradas como sendo de industrialização resumem-se a (i) montagem e transformação, que podem ser realizadas por terceiro a título de encomenda e (ii) acondicionamento ou reacondicionamento de peças a serem comercializadas no mesmo estado em que foram importadas. Para habilitar-se previamente ao regime a empresa interessada deve, antes de mais nada, ser detentora de habilitação do programa de Linha Azul e cumprir com os requerimentos estabelecidos em Instrução Normativa própria. Cumprida essa etapa, deve tratar-se de uma indústria automotiva (objeto desse artigo), idônea, com patrimônio líquido mínimo de R$ 25.000.000,00 e dispor de sistema informatizado (que será explorado em detalhes na parte 3 desse artigo) com permissão de livre e permanente acesso da RFB. No que rege os requerimentos necessários para que a empresa mantenha-se habilitada ao regime, faz-se necessário o cumprimento da obrigação de volumes mínimos de exportações, o que no primeiro ano de operação será reduzido pela metade. Cumpre-se também a necessidade de aplicação de ao menos 80% de materiais importados em processos de industrialização, o que poderá chegar a 70% caso a empresa apresente exportações de bens industrializados com material importado da ordem de US$ 100.000.000,00 ao ano. A apuração do cumprimento do percentual supramencionado será a razão entre as Declarações de Admissão desembaraçadas e os Registros de Exportação averbados de todos os estabelecimentos industriais da empresa habilitada. Do montante importado serão desconsideradas as importações realizadas por meio de outros regimes aduaneiros. No que se refere ao volume correspondente às exportações, somente serão computadas as que tenham sofrido processo de industrialização e aquelas referentes aos produtos usados que tenham sido importados para fins de reparo e correlatos, serão desconsideradas. Ressalta-se, contudo, que as vendas no mercado interno de bens industrializados contendo material importado sob o regime, com o fim específico de exportação, serão também consideradas para fins de apuração das exportações. O Pedido de Habilitação ao Recof será instruído por meio de formulário específico cujo modelo consta do ANEXO IV, acompanhado de todos os demais documentos relacionados nos Incisos I a IX do Art. 11º, ambos da IN 757/07, lembrando que os documentos requeridos devem ser preenchidos por estabelecimento industrial de forma individualizada. Cabe à unidade da RFB que jurisdiciona o domicilio fiscal da empresa interessada em habilitar-se ao Recof, a verificação do cumprimento dos requisitos e a correta instrução do pedido. É de responsabilidade da Superintendência Regional da Receita Federal, proceder com o exame do pedido e julgar pela necessidade ou não de validação das informações prestadas e deliberar acerca do resultado final. À Empresa para a qual a habilitação for deferida será concedido prazo precário de utilização do regime, cuja publicidade se dará por meio de Ato Declaratório Executivo emitido para o CNPJ matriz da requisitante, assim como a menção da modalidade a que foi concedida a habilitação.
Falsificação de B/L: Um grande problema para o comércio exterior brasileiro
André de Seixas | @comexblog Este é um problema antigo e que causa grandes prejuízos a todos os brasileiros, pessoas físicas ou jurídicas, estejam envolvidas, ou não, com o comércio exterior. Um breve histórico Antes da implantação do SISCARGA (SISCOMEX CARGA), que veio com a entrada em vigor da INSTRUÇÃO NORMATIVA RFB Nº 800/2007, a falsificação de Bills of Lading era um ilícito mais difícil de ser praticado, portanto, ocorria com menor frequência. Isso porque, antes, para se ter acesso ao número da CE-Mercante, o importador, inevitavelmente, tinha que apresentar ao transportador marítimo toda documentação necessária, incluindo o B/L original (a assinatura do agente e o carimbo do recolhimento do AFRMM – Adicional de Frete para Renovação da Marinha Mercante – tinham que constar no verso do B/L original). Ou seja, cometer este crime era mais complicado, porque os transportadores marítimos e agentes possuíam e possuem critérios técnicos para acusar uma eventual falsificação de B/L. Depois da implantação do SISCARGA, os numero dos CE`s-Mercante master e/ou house passaram a ser expostos no SISTEMA MERCANTE e o importador passou a ter acesso ao numero da sua CE, sem ter que se dirigir aos transportadores marítimos ou agentes, facilitando a vida daqueles que cometem tal crime. Como já foi amplamente divulgado, todo o processo de desembaraço aduaneiro (despacho para consumo) está informatizado. Nenhuma das etapas de pagamento de impostos, fretes, armazenagem e despesas portuárias precisam ser realizadas manualmente, tampouco necessita de apresentação de documentos. Assim, atualmente, o importador registra a sua declaração de Importação, paga os impostos, taxas e tem a sua carga liberada via sistema. O momento de apresentação dos documentos, incluindo aí o B/L original, ocorre somente quando da retirada da carga do recinto alfandegado. Aí surgem as dúvidas acerca de como ocorrem essas praticas criminosas. Bem, como foi dito acima, antes da implantação do SISCARGA o B/L falso tinha, necessariamente, que ser apresentado ao armador e agente, ou seja, a quem o emitiu. Depois da implantação do sistema, quem passa a avaliar se o B/L é original é o recinto alfandegado, que não tem a menor capacidade e subsídios técnicos para fazer a verificação se um B/L é falso ou verdadeiro. Como se sabe, dada a enorme quantidade de empresas NVOCC`s (nom vessel operating commom carrier) estabelecidas mundo a fora, principalmente na República Popular da China, a situação piora ainda mais, sendo certo que um recinto alfandegado não tem a menor condição técnica da avaliação acerca da autenticidade do conhecimento. Por exemplo: Já imaginaram os recintos brasileiros realizando a comparação de Bs/L de cada NVOCC que envia cargas ao Brasil? Com certeza seria impossível retirar cargas do porto sem prejuízos. Quando o B/L é de um grande transportador marítimo de linha regular, ou de um grande NVOCC, pode ser que o trabalho fique mais fácil. Contudo, mesmo assim, o trabalho é bem complicado. Isso porque, o recinto terá que entrar em contato com o transportador para saber se um B/L é verdadeiro. Por sua vez, o transportador deverá entrar com contato com o exportador para saber se ele entregou ao importador os originais. Isso demandaria bastante tempo e o recinto correria o risco de indenizar o importador pelos prejuízos decorrentes dessa demora, em uma eventual ação de perdas e danos, se suas suspeitas foram infundadas. É evidente que a dinâmica do transporte marítimo internacional não permite uma avaliação caso a caso nesses moldes. Por que falsificam Bs/L ? A resposta é simples. Porque conseguem retirar a mercadoria do recinto alfandegado sem pagá-las ao exportador. Esses casos ocorrem quando os pagamentos aos exportadores não são feitos através de garantias bancárias, ou cartas de crédito. Pontualmente, verificam-se maiores ocorrências quando o pagamento das mercadorias ao exportador é feito via Cobrança Documentária, que é uma negociação feita na base da confiança do vendedor para o comprador. Basicamente, nesta modalidade de pagamento, o exportador envia a mercadoria ao país de destino e entrega os documentos de embarque e a letra de câmbio (saque) ao banco negociador do câmbio no Brasil (banco remetente). O banco remetente os encaminha, por meio de carta-cobrança, ao seu banco correspondente no exterior (banco cobrador). O banco cobrador entrega os documentos ao importador, mediante recebimento do pagamento ou do aceite do saque. De posse dos documentos, o importador pode desembaraçar a mercadoria importada. O ponto é justamente este: Enquanto os documentos originais (incluindo o B/L) estão no banco aguardando pagamento da quantia pactuada entre comprador e vendedor, a carga é retirada do recinto alfandegado com um B/L que não é o original. O tempo passa e o exportador começa a se preocupar pelo fato de ainda não ter recebido a quantia da venda ou aceite do saque e pelo fato de o importador não ter retirado a documentação. Então, o exportador, através de seu representante no Brasil, do transportador ou NVOCC, ou de pessoa conhecida, solicita a averiguação do local para onde a carga foi destinada, onde, em tese, deveria estar armazenada. Quando vai fazer a confirmação, verifica que carga já saiu de lá, totalmente desembaraçada, há tempos. A primeira atitude do exportador é procurar o transportador marítimo, ou NVOCC. Via de regra, eles acusam essas empresas de terem feito a emissão de uma segunda via de originais e de tê-las entregues ao importador para que liberassem as mercadorias. Aí começam os problemas para as empresas transportadoras e NVOCC`s. Isso porque, as suas seguradoras (clubes de P&I), terão como primeira reação, diante da acusação de emissão de uma segunda via de originais, a retirada da cobertura do risco. A emissão de segunda via e B/L é licita, para os casos de extravio (descaminho) da primeira via. Inclusive está prevista no Artigo 580 do Código Comercial Brasileiro: “Art. 580 – Alegando-se extravio dos primeiros conhecimentos, o capitão não será obrigado a assinar segundos, sem que o carregador preste fiança à sua satisfação pelo valor da carga neles declarada.” Os seguros dos transportadores e NVOCC`s, nos casos de descaminho com emissão da segunda via de original, pedem que a quantia da carga
Insegurança jurídica do conceito de produção nacional para concessão de ex-tarifários
Por Rogério Zarattini Chebabi | @comexblog Quem presta serviços para obtenção de ex-tarifários conhece bem o conceito de produção nacional, propriamente divulgado no site do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. O conceito remete à obrigatoriedade de o produtor nacional comprovar que o bem por ele produzido, comparativamente com o importado, possui: mesma ou superior qualidade, produtividade e performance, mesmo ou mais baixo consumo de energia e matérias-primas, e igual ou melhor prazo de entrega usual, desempenho e, principalmente, provar fornecimentos anteriores efetuados. Estes itens formadores do conceito, há anos vinham sendo respeitados. Todavia, com a publicação na Resolução Camex n. 55/2011, que inseriu a figura do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) na composição do Comitê de Análise de Ex-Tarifários (CAEx), tudo mudou. Temos hoje um prazo duas a três vezes maior para análise dos pedidos no MDIC em virtude do ingresso deste novo órgão. E qual a finalidade deste novo componente? Explico. [epico_capture_sc id=”21731″] O BNDES analisará os bens de capital importados, através de catálogos, propostas de vendas, etc., e os comparará com máquinas que porventura e futuramente alguma empresa nacional possa produzir, com base em pedidos de financiamentos àquele banco, feitos por fabricantes de máquinas. Notem que eu destaquei que “futuramente alguma empresa nacional possa produzir”, ou seja, hoje ainda não existe produção nacional do bem! Portanto, se algum fabricante nacional de máquinas disser que poderá futuramente produzir um bem parecido com o a ser importado, se correrá o risco de o ex-tarifário não ser concedido. Este absurdo vai totalmente contra as regras do conceito de produção nacional. Ora, se não se produz o bem ainda no Brasil, não há como se provar fornecimentos anteriores, não há como se provar garantia de performance, desempenho, etc. Esta nova sistemática de análise além de proteger um “fabricante nacional” que não existe no plano físico mas somente no plano das ideias, não obedece o regramento jurídico que rege a matéria do ex-tarifário. O MDIC mudou as “regras do jogo” apenas verbalmente, esquecendo de antecipadamente mudar as normas. O descumprimento à legalidade e anterioridade, aliado à demora nas análises dos pleitos, causam insegurança jurídica e de planejamento aos que pretendem importar bens de capital. E não se pode esquecer que os importadores de bens de capital, que buscam bens do exterior muitas vezes mais caros do que os inferiores nacionais, são geradores de empregos, exportadores habituais e movimentam a economia.
A irregularidade na cobrança do AFRMM sob a ótica do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT)
A instituição do AFRMM, praticamente eternizada desde a década de 50, está, de certa forma, intrincada com a política macroeconômica brasileira de apregoar melhorias no saldo do nosso balanço de pagamentos, tendo instaurado-se como instrumento de valorização do transporte marítimo de bandeira nacional, segundo a premissa de que, quanto maior a frota naval de um país, menores serão seus recursos consumidos com fretes e armadores estrangeiros. Muito embora não disponha de marinha mercante, visto que o comércio marítimo brasileiro ainda depende, em essência, do uso de navios estrangeiros, o referido tributo vem sendo cobrado desde então e com o estabelecimento da Lei 10.893/04, ganhou ainda mais força, revigorada com a publicação da MP Nº 545/11 que transferiu da Marinha Mercante para a RFB toda a responsabilidade pela matéria A cobrança do referido tributo onera de forma significativa as importações brasileiras, além de tornar alguns processos de desembaraço extremamente morosos ao passo que quando se realiza importações de países com os quais o Brasil mantém acordo comercial, há a possibilidade de se pleitear a sua isenção, o que faz com que alguns importadores acabem abrindo mão dessa isenção face à burocracia do processo. O estabelecimento da nova conjuntura mundial, que cria relações cada vez mais estreitas entre os atores internacionais, faz com que cada vez mais empresas se estabeleçam em outros países, que cada vez mais negócios sejam realizados ao redor do mundo. É a era da globalização que provoca a materialização das citadas relações, por meio de tratados internacionais, cujo objetivo é regular uma série de questões, inclusive as de natureza tributária. Segundo Francisco Rezek em sua obra: Direito Internacional Público, 2002 o tratado é todo acordo formal concluído entre sujeitos de direito internacional público, e destinados a produzir efeitos jurídicos. Em complemento ao acima exposto, um dos mais importantes documentos sobre o Direito dos Tratados é a Convenção de Viena de 1969, que em seu Art. 2º estabelece que o tratado tem como princípio o livre consentimento entre as partes do Direito Internacional Diante do exposto, o objetivo desse artigo é resgatar o fato de que, o Brasil, na condição de país signatário do acordo geral sobre tarifas e comércio (GATT), acordou, juntamente com os demais membros, que asseguraria a transparência no caso de implementação dos direitos e obrigações derivados do parágrafo 1(b) do Artigo II, por meio da inclusão dos referidos direitos, nas listas de concessões anexadas ao GATT 94. Como se pode extrair da leitura do texto do parágrafo supramencionado: “Os produtos das Partes Contratantes, ao entrarem no território de outra Parte Contratante, ficarão isentos dos direitos aduaneiros ordinários que ultrapassarem os direitos fixados na Parte I da lista das concessões feitas por esta Parte Contratante, observados os termos, condições ou requisitos constantes da mesma lista. Esses produtos também ficarão isentos dos direitos ou encargos de qualquer natureza, exigidos por ocasião da importação ou que com a mesma se relacionem e que ultrapassem os direitos ou encargos em vigor na data do presente Acordo ou os que, como conseqüência direta e obrigatória da legislação vigente no país importador, na referida data, tenham de ser aplicados ulteriormente.” Quer dizer, se estarão isentos os direitos ou encargos de qualquer natureza relacionados com a importação que, por ventura não estejam relacionados na lista de concessões do acordo, e é sabido que a alíquota do AFRMM não está. Logo, tem-se por óbvio que há irregularidade na cobrança do tributo em questão. O processo legislativo que abarca a internalização de um tratado consiste em duas fases internacionais (assinatura e ratificação) e duas internas (o referendo do congresso nacional e a promulgação do decreto pelo presidente da república) vide Art. 84º, IV e 49º, I da Constituição Federal. Esse é o ato de natureza jurídica interna, instrumento que visa à publicidade do mesmo e pelo qual se permite ao tratado incorporar o Direito positivo brasileiro. Feitos esses apontamentos, ressalta-se que o Código Tributário Nacional (CTN), em seu Art. 98 dispõe que os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha. Portanto, considerando que a lei 10.893/04 que estabelece e dispõe sobre o AFRMM, trata-se de Lei Ordinária de Direito interno e institui a aplicação de um tributo que, de acordo com o conceito do parágrafo 1(b) do Art. II do GATT, deveria compor a lista de concessões do referido acordo para que fosse devidamente implementada, pode-se extrair dessa análise, o entendimento de que a norma interna estaria sobrepujando o tratado internacional sobre comércio e tarifas. A cobrança do AFRMM não é considerada irregular por ser inconstitucional como já fora abordado em outras discussões, até mesmo porque o STF já se posicionou a acerca dessa celeuma e a questão já está mais do que sacramentada. [epico_capture_sc id=”21731″] A argumentação aqui proposta tem por finalidade demonstrar que, seja o AFRMM ou fosse outra espécie tributária cobrada nas importações sem que tivesse sido devidamente acordada entre os países membros da OMC, a referida cobrança deveria ser considerada absolutamente indevida por configurar-se uma tarifação adicional e ferir o princípio da transparência e consistência na aplicação de medidas tarifárias ou não tarifárias, aplicadas na fronteira ou internamente. Também não é fruto dessa argumentação a idéia de que as empresas deveriam correr ao judiciário com o intuito de tentar reverter tal situação, o que muito provavelmente não iria ocorrer, trata-se sim de uma discussão sadia em prol da verdade, além de uma demonstração da forma como a transparência na aplicação dos tratados internacionais é tida em nosso país. Vale lembrar também que o Art. 27º da Convenção de Viena de 1969 deixa clara a impossibilidade dos Estados Partes utilizarem as leis internas de seus países como subterfúgio para evitar o cumprimento de um tratado internacional, ou seja, caso essa fosse uma primazia em nosso país, o AFRMM estaria suspenso até que fosse devidamente regularizada a sua situação perante as regras da Organização Mundial do Comércio.
O AFRMM e os regimes aduaneiros especiais
No dia 02 de setembro de 2011, a Coordenadora-Geral da Coordenação Geral do Adicional do Frete para a Renovação da Marinha Mercante (CGAMM) do Departamento do Fundo da Marinha Mercante da Secretaria de Fomente para Ações de Transportes do Ministério dos Transportes, por meio do Memorando Circular n° 201100078812/CGAMM, orientou os responsáveis pelas Unidades Descentralizadas do DMM a promoverem a comunicação das empresas acerca da suspensão do AFRMM nas operações submetidas aos regimes aduaneiros que tratam da admissão de bens. De acordo com o entendimento constante do referido memorando, a Lei n° 10.893, de 31 de julho de 2004, que dispõe sobre o Adicional do Frete para a Renovação da Marinha Mercante – AFRMM e o Fundo da Marinha Mercante – FMM, delimitou a suspensão do AFRMM às operações que tratam da importação de mercadorias, excluindo aquelas que tratam da admissão de bens, tais como o REPETRO (Regime aduaneiro especial de exportação e de importação de bens destinados às atividades de pesquisa e de lavra das jazidas de petróleo e de gás natural) e o REPORTO (Regime tributário para incentivo à modernização e à ampliação da estrutura portuária). Isto porque, de acordo com o memorando em tela, a Lei n° 10.893/04 teria utilizado propositadamente os conceitos de bem e mercadoria com sentidos diferentes da seguinte forma: “Art. 14. Ficam isentas do pagamento do AFRMM as cargas: (…) IV – que consistam em: a) bens sem interesse comercial, doados a entidades filantrópicas, desde que o donatário os destine, total e exclusivamente, a obras sociais e assistenciais gratuitamente prestadas; b) bens que ingressem no País especificamente para participar de eventos culturais ou artísticos, promovidos por entidades que se dediquem com exclusividade ao desenvolvimento da cultura e da arte, sem objetivo comercial; c) bens exportados temporariamente para outro país e condicionados à reimportação em prazo determinado; d) armamentos, produtos, materiais e equipamentos importados pelo Ministério da Defesa e pelas Forças Armadas, ficando condicionada a isenção, em cada caso, à declaração do titular da Pasta ou do respectivo Comando de que a importação destina-se a fins exclusivamente militares e é de interesse para a segurança nacional; ou e) bens destinados à pesquisa científica e tecnológica, conforme disposto em lei, cabendo ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq encaminhar ao órgão competente do Ministério dos Transportes, para fins de controle, relação de importadores e o valor global, por entidade, das importações autorizadas; e) bens destinados à pesquisa científica e tecnológica, conforme disposto em lei; (Redação dada pela Medida Provisória nº 545, de 2011) V – que consistam em mercadorias: (…) c) submetidas a regime aduaneiro especial que retornem ao exterior no mesmo estado ou após processo de industrialização, excetuando-se do atendimento da condição de efetiva exportação as operações realizadas a partir de 5 de outubro de 1990, nos termos do § 2o do art. 1o da Lei no 8.402, de 8 de janeiro de 1992; (…)” Desta forma, o memorando conclui que “não existe amparo legal para a Isenção do AFRMM para essas operações [submetidas aos regimes aduaneiros que tratam da admissão de bens], visto que a isenção prevista no artigo 14, inciso V, alínea c, também se refere expressamente a ‘mercadorias’ e não a ‘bens’.” Todavia, entendemos que a conclusão a que chegou o memorando ora comentado não é a mais adequada, pelos motivos que a seguir serão expostos. Primeiramente, o memorando afirma existir distinção de sentido entre os termos “bem” e “mercadoria”, mas não determina os critérios que deverão ser usados para distingui-los, ou seja, não estabelece os requisitos para que determinada coisa seja enquadrada como bem ou mercadoria. Ademais, o próprio Regulamento Aduaneiro – RA (Decreto n° 6.759/09) utiliza os termos acima mencionados de forma indiscriminada. A título exemplificativo, menciona-se a Subseção IX do RA, que trata “Dos Bens Adquiridos em Loja Franca”, cujo primeiro artigo é o 169, com a seguinte redação “A isenção do imposto na aquisição de mercadorias em loja franca instalada no País, a que se refere a alínea “e” do inciso II do art. 136, será aplicada com observância do disposto nos arts. 476 a 479 e dos termos, limites e condições estabelecidos pelo Ministro de Estado da Fazenda (Decreto-Lei no 2.120, de 1984, art. 1o, § 2o, alínea “a”; Lei no 8.032, de 1990, art. 2o, inciso II, alínea “e”; e Lei no 8.402, de 1992, art. 1o, inciso IV).” Em terceiro lugar, é importante destacar que, caso fosse adotada a interpretação literal dos termos “bem” e “mercadoria” quando da análise da Lei n° 10.893/04, como sugere o memorando em debate, chegaríamos a conclusões absurdas. Também a título exemplificativo, cita-se o artigo 7° que estabelece que “O responsável pelo transporte aquaviário deverá, na forma e nos prazos estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, disponibilizar os dados necessários ao controle da arrecadação do AFRMM, oriundos do conhecimento de embarque ou da declaração de que trata o § 2o do art. 6o, referentes às mercadorias a serem desembarcadas no porto de descarregamento, independentemente do local previsto para a sua nacionalização, inclusive aquelas em trânsito para o exterior. (Redação dada pela Medida Provisória nº 545, de 2011)”. [epico_capture_sc id=”21731″] Neste sentido, poderíamos concluir – de forma absurda – que o transportador somente estaria obrigado a fornecer os dados – ao controle da arrecadação do AFRMM – referentes às mercadorias a serem desembarcadas no porto de descarregamento, não se aplicando esta regra em relação aos bens por ele transportados. Por fim, é importante destacar que a orientação firmada no Memorando Circular n° 201100078812/CGAMM contraria as instruções expedidas pelo próprio Ministro dos Transportes que, por meio da Portaria MT nº 72, de 18.03.2008, aprovou a norma complementar n° 01/2008, a qual estabelece critérios e disciplina procedimentos para a utilização do Sistema Eletrônico de Arrecadação do Adicional do Frete para a Renovação da Marinha Mercante e para o pagamento ou a solicitação e concessão de benefícios e incentivos relativos ao AFRMM. Neste caso, o referido Memorando afirma que “A inclusão do regime especial de Admissão temporária no artigo
A Imunidade da CSLL sobre as Receitas de Exportação
1. Introdução Com a entrada em vigor da EmendaConstitucionalnº 33, em 12 de dezembro de 2001, que introduziu o §2º no artigo 149 da Constituição Federal de 1988, as contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico passaram a não incidir sobre as receitas decorrentes das exportações. A alteração da redação do artigo 149 da CF teve por finalidade desonerar as operações de exportação de mercadorias e serviços, objetivando incentivar o desenvolvimento da indústria nacional. Neste sentido, as receitas decorrentes de exportação passaram a ser imunes em relação à contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/PASEP), à Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS), à Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) e à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Ocorre que o Fisco entendeu que a imunidade instituída pela EC 33/01 se restringe às contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico que têm receitas como base de cálculo, não abrangendo assim a CSLL e a CPMF. Entretanto, este não é o melhor entendimento, como demonstraremos a seguir. É importante destacar que no presente texto analisaremos somente a discussão acerca da imunidade das receitas decorrentes de exportação em relação à CSLL (e não à CPMF, já extinta). 2. Alcance da imunidade prevista As receitas decorrentes de exportação são imunes à incidência da CSLL, pois: (i) este tributo é espécie do gênero contribuições sociais; (ii) a intenção do legislador foi ampliar a desoneração das exportações, tendo em vista que as referidas receitas já eram isentas da contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS; e (iii) estas receitas não se confundem com o conceito de lucro, mas são levadas em consideração quando da sua apuração. Em primeiro lugar, é importante destacar que artigo 149 da CF, ao fazer referência às contribuições sociais, exige interpretação conjunta com o artigo 195, onde tais tributos estão enumerados, inclusive a CSLL (alínea “c” do inciso I). Isto porque as contribuições elencadas no artigo 149 da CF são gênero das quais as do artigo 195 são espécies. E, como não existe no artigo 195 qualquer regra especial estabelecendo que as contribuições ali relacionadas incidam sobre receitas de exportação, se aplicará a essas contribuições a regra geral do artigo 149, § 2º, inciso I, da CF, que determina a imunidade das receitas decorrentes de exportação em relação às contribuições sociais. Ademais, a intenção do legislador no texto da EC nº 33/01 não poderia ser a de afastar a incidência somente da contribuição ao PIS e da COFINS, uma vez que os referidos tributos já não eram cobrados nas operações de exportação há mais de uma década, conforme determinado pelo Decreto nº 92.698/86, pelas Leis Complementares nºs 70/91 e 85/96 e pela Medida Provisória nº 2.158/01. Desta forma, o objetivo principal da EC nº 33/01 foi o de excluir as receitas decorrentes da exportação da incidência de todas as contribuições sociais, inclusive da CSLL, não se limitando apenas à contribuição para o PIS/PASEP e à COFINS. Por fim, como já dito anteriormente, a imunidade em análise objetivou fomentar as operações de exportação, desonerando-as de contribuições sociais. Partindo desta premissa, é possível concluir que o termo “receitas” previsto na norma constitucional deve ser interpretado em sentido amplo a fim de alcançar não só as receitas que compõem a base de cálculo da contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS, mas também as que são levadas em consideração para a apuração do lucro líquido da empresa. Como se sabe, a CSLL incide sobre o resultado do exercício, ajustado por adições e exclusões previstas no artigo 2º, § 1º, alínea “c”, da Lei nº 7.689/88. Este resultado nada mais é do que o lucro do exercício, ou seja, a soma de todas as receitas da empresa, descontados os custos e despesas operacionais e não operacionais. É de se destacar que os conceitos de lucro e de receita não se confundem. Denomina-se “receita” a entrada de recursos obtidos pelo exercício da atividade da empresa; Já o lucro é obtido mediante a diferença entre as receitas, de um lado, e os custos e as despesas necessárias à sua obtenção, de outro lado. Portanto, na apuração da base de cálculo da CSLL, devem ser excluídas as receitas decorrentes das operações de exportação, de modo que, imunes estas, não há como aproveitá-las na definição da base de cálculo e da própria hipótese de incidência da CSLL. 3. Posição do Supremo Tribunal Federal No dia 05 de dezembro de 2007, o Supremo Tribunal Federal (STF), por unanimidade, reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional em análise nos autos do recurso extraordinário (RE) nº 564.413. O RE nº 564.413 está sendo julgado em conjunto com o RE nº 474.132, pois ambos discutem o alcance das normas constitucionais em relação à imunidade tributária. O RE nº 474.132 refere-se à não incidência da CSLL e da CPMF sobre receitas decorrentes de exportação. Já o segundo RE trata somente da CSLL. Em relação ao RE nº 564.413, o Ministro Relator, Marco Aurélio, negou provimento ao recurso interposto pela empresa Incasa S/A, sendo acompanhado pelos ministros Menezes Direito, Carlos Ayres Britto e Ricardo Lewandowski. Por outro lado, o Ministro Gilmar Mendes deu provimento ao recurso, sendo seguido pelos ministros Eros Grau, Cármen Lúcia e Cezar Peluso. O pedido de vista feito pela Ministra Ellen Gracie interrompeu o julgamento – que, portanto, está empatado em 4 a 4 – e adiou a definição da matéria. Além dela, ainda falta votar o Ministro Celso de Mello, e o Ministro Joaquim Barbosa somente se pronunciará em caso de empate. [epico_capture_sc id=”21731″] A posição do Ministro Celso de Mello sobre o tema tende a ser favorável aos contribuintes. Isso porque em 2007 o Ministro concedeu antecipação de tutela em favor da Companhia Siderúrgica Nacional para que a CSLL não fosse exigida em relação às receitas decorrentes de exportação nos autos da ação cautelar nº 1.810, no que foi acompanhado pelos membros da 2ª Turma do Tribunal, da qual faz parte a Ministra
Admissão Temporária como fator de competitividade
O regime aduaneiro especial de admissão temporária, regulamentado pelo Decreto 6759/09 em seus Arts. 353˚ a 382˚ é o que permite a importação de mercadoria cujo tempo de permanência no país seja pré-estabelecido e com o objetivo de atender a uma das finalidades elencadas na Instrução Normativa N˚ 285/03. Essa importação deve, impreterivelmente, ser realizada sem cobertura cambial, além de cumprir fielmente com os prazos e requisitos estabelecidos nesta mesma normativa. Entre os aspectos de maior relevância no tocante ao tema proposto, três pontos merecem ser tratados com especial atenção. O primeiro guarda consonância com a abrangência do regime e os tributos envolvidos; o segundo está relacionado aos prazos a serem observados pelo importador, a documentação necessária para o pedido e as providências a serem tomadas ao final dos prazos concedidos e, por fim, porém não menos importante, a aplicação das penalidades previstas no caso de descumprimento do regime. De uma forma bem genérica, o regime de admissão temporária alcança basicamente dois grandes grupos de finalidades, sendo; um grupo sem e outro com fins econômicos, estando eles dispostos, respectivamente nos Art. 4º e 6º da Instrução Normativa No 285/03. No primeiro grupo, serão integralmente suspensos todos os tributos devidos na importação: I.I e I.P.I, na redação data pelo Art. 75˚ do Decreto-Lei 37/66. PIS e COFINS, vide Art. 14˚ da Lei 10.865/04 e o ICMS, disposto no Art. 37˚ do Anexo II do Regulamento do ICMS-SP. No grupo de finalidades com fins econômicos, serão proporcionalmente recolhidos os impostos e contribuições Federais, por força do disposto no Art. 79 da Lei 9.430/96, o mesmo ocorre para o ICMS que, por meio do Art. 38˚ do Anexo II do RICMS, terá sua proporcionalidade auferida, segundo a mesma base de cálculo adotada para a cobrança dos tributos Federais. A referida proporcionalidade será de 1% do valor total dos tributos devidos, para cada mês de permanência do bem no país, conforme se pode observar no § 2o do Art. 373˚ do Regulamento Aduaneiro, o que tem primazia sobre o cálculo disposto no § 4o do Art. 6˚ da IN 285/03. Quando do pedido, pelo importador, do regime de admissão temporária, deverá este, por sua vez, efetuar o enquadramento do mesmo, nos dados complementares da Declaração de Importação, fato este que não poderá ser modificado após o desembaraço da mercadoria. Os prazos limitam-se à 5 anos e em casos excepcionais, devidamente justificados, podem ser estendidos, dado o disposto no §1º do Art. 307 do R.A. A solicitação do regime será instruída pelos seguintes documentos: Artigo 4˚ D.S.I Termo de Responsabilidade Requerimento de Concessão do Regime Cronograma de Atividades Contrato de Comodato (prazos acima de 6 meses) Artigo 6˚ D.I Termo de Responsabilidade Requerimento de Concessão do Regime Cronograma de Atividades Contrato de Comodato Garantia (tributos suspensos acima de R$ 20.000) Uma vez cumprido o prazo de permanência do bem no país, o importador deverá tomar uma das seguintes providências para proceder com a extinção do regime: Reexportação; Doação à RFB; Destruição sob controle aduaneiro; Transferência para outro regime; Nacionalização. O Regime de Admissão Temporária é extremamente benéfico aos importadores, especialmente às empresas industriais que atuam como desenvolvedoras de novos produtos, justamente por essa razão, o Governo aplica rigorosas penalidades para que as empresas se conscientizem da importância de manter altos níveis de controles. O Art. 709º do Regulamento Aduaneiro dispõe sobre o tema; 10% de multa sobre o valor aduaneiro do bem admitido temporariamente, no caso de descumprimento de condições, requisitos ou prazos estabelecidos para a aplicação do regime de admissão temporária. Após o pagamento da multa, caso essa seja uma opção para empresa, a RFB poderá autorizar que seja tomada uma das providências acima mencionadas. Interessante ressaltar que, embora hoje o tema seja ponto pacífico, nem sempre foi assim. Isso porque até a publicação da Lei 10.833/03, que instituiu a referida multa, por meio de seu Art. 72˚, a penalidade aplicada era de 50% sobre o Imposto de Importação. Entretanto, mesmo com a publicação desta Lei, a anterior continuou vigente, já que não houve uma revogação formal do Art. 106˚ do Decreto-Lei 37/66, que dispõe sobre os 50% mencionados, o que gerou confusão entre os beneficiários do regime. Posteriormente, com a publicação do ADI SRF N˚ 004/04, que revogou tacitamente o disposto no Art. 106˚ do Decreto-Lei 37/66, a polêmica foi esclarecida e, com a publicação do Decreto 6.759/09, a questão foi definitivamente sacramentada e o que se aplica, de fato e de direito, em termos de penalidade, é o disposto neste último. [epico_capture_sc id=”21731″] Além da referida multa, caso venha a optar pela nacionalização de forma espontânea, o importador deverá recolher aos cofres públicos, além dos tributos suspensos, multa moratória disposta no Art. 61º e juros, previstos no § 2º do Art. 7º, ambos da Lei 9430/96; estes incidentes sobre os tributos Federais. No caso do ICMS, será devida multa moratória de até 20% conforme o Art. 528˚ do Título III do Decreto 45.490/00, além de juros calculados com base em tabela específica do fisco Estadual. Entretanto, caso o descumprimento do regime seja objeto de autuação fiscal, cabem multas de ofício de 75% sobre os tributos Federais, o que é regido pelo Inciso I do Art. 725˚ do Regulamento Aduaneiro e de 80% sobre o ICMS, disposto no Art. 527˚ do Título III do Regulamento Estadual. Dessa forma, tendo em vista os aspectos observados, espera-se que os importadores possam criar mecanismos de controle adequados para acompanhar devidamente os prazos de permanência dos bens no país. Dessa forma, será possível observar uma considerável redução de custos para as empresas nas importações dessa natureza, ao passo que usufruem desse benefício que pode lhes trazer considerável competitividade no mercado devido à possibilidade de desenvolver novos produtos, sem que, para isso, seja necessário elevar o custo de seu desenvolvimento. *Administrador de empresas com sólida experiência em classificação fiscal, despacho e consultoria aduaneira.
Breves considerações sobre o AFRMM
Instituído na década de 50, o Fundo da Marinha Mercante – FMM e os recursos arrecadados com o Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante – AFRMM representam importantes instrumentos de fomento à construção naval e ao desenvolvimento da Marinha Mercante. De forma simplificada, o AFRMM é uma Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico – CIDE, que recai sobre o frete pago à empresa brasileira de navegação pelo transporte de bens. O contribuinte do AFRMM é o consignatário constante do conhecimento de embarque e o proprietário da carga é responsável solidário pelo seu pagamento. De acordo com o artigo 17 da Lei nº 10.893/04, o valor arrecadado com o AFRMM tem 03 (três) destinações: (i) o FMM; (ii) uma conta especial rateada entre as empresas brasileiras de navegação que operam embarcação de registro brasileiro; e (iii) uma conta individual, cujo beneficiário é o armador brasileiro, a ser creditada com os recursos gerados pela incidência do AFRMM nos transportes por ele realizados. É de se ressaltar que o armador não está autorizado a utilizar livremente os recursos depositados nesta conta individual, podendo movimentá-los somente nas hipóteses previstas em lei, como, por exemplo, no pagamento de financiamentos contraídos com o BNDES (na qualidade de operador do FMM), destinados à construção naval ou a empreendimentos de interesse da Marinha Mercante. Valendo-se destes incentivos, os armadores construíram embarcações de bandeira brasileira com base em contratos de financiamento firmados com o BNDES (ou a extinta SUNAMAM), o qual, por sua vez, antes de aprová-los, realiza um criterioso estudo com a finalidade de verificar, dentre outros elementos, a capacidade de geração de AFRMM do armador e definir as características da operação de crédito, em especial a parcela do empréstimo que poderá ser amortizada com os recursos do AFRMM. [epico_capture_sc id=”21731″] É preciso notar que a definição da estrutura do financiamento leva em conta a legislação em vigor à época de sua celebração, sendo certo que a mesma sofreu inúmeras alterações ao longo das últimas décadas, como, por exemplo, a redução em 50% (cinqüenta por cento) das alíquotas do AFRMM introduzida pela Lei nº 8.032/90. Neste caso, a supressão de metade dos créditos que poderiam ser utilizados na amortização de financiamentos com o BNDES provoca excessivo desequilíbrio econômico-financeiro do contrato, uma vez que os armadores tiveram que buscar recursos no próprio caixa da empresa, ao invés de usarem os recursos disponíveis na conta individual do AFRMM. Neste contexto, diversos armadores estão propondo ações judiciais contra a União e o BNDES – cujo prazo prescricional se esgota em 2010 –, pretendendo a devolução dos valores que tiveram de ser desembolsados para amortizar os financiamentos sob o argumento de que a aplicação de lei nova a contratos firmados anteriormente à sua edição viola a teoria dos atos jurídicos perfeitos. De fato, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal já firmaram entendimento no sentido da impossibilidade de a lei nova ser aplicada a contratos anteriormente celebrados, tendo em vista a necessidade de se preservar a segurança jurídica e a previsibilidade das relações contratuais. Logo, parece-nos que os nossos Tribunais tenderão a confirmar o pleito dos armadores.
Direito Aduaneiro no Brasil
Quase dentro do tributário, com um pé no administrativo e outro no econômico, e uma sombra no criminal, o direito aduaneiro cresce tão relevante quanto desordenadamente. Esse contraste impressiona e desperta o vivo interesse por essa disciplina jurídica, cujo papel na economia nacional nunca foi tão importante. A tendência é que essa importância cresça na mesma medida em que o planeta se globaliza e a economia de um país se torna, cada vez mais, complexa e dependente de trocas com outros países, seja de bens, serviços, trabalho, capital ou o que mais a criatividade econômica puder produzir. Importar já foi um diferencial para as empresas brasileiras. Hoje, é uma necessidade corriqueira. Pode-se dizer o mesmo a respeito da exportação. A partir da abertura de nossa economia para o mundo, principalmente na década de 1990, a relevância da regulação e do controle estatal sobre as atividades de comércio exterior só aumentou. Paradoxalmente, porém, nossa legislação ainda é baseada em um decreto-lei da década de 1960, no período de suspensão da democracia. O direito aduaneiro desenvolve-se no mundo, inclusive no Mercosul; o Brasil enfrenta enormes dificuldades para acompanhar essa evolução. Somos o único país do Mercosul que não tem um “código aduaneiro”, embora o próprio Mercosul tenha o seu, no âmbito do direito comunitário. Tratados internacionais na matéria pendem de internalização no Brasil, que se arrasta em tantos campos – inclusive, em integrar-se à evolução aduaneira mundial. Por aqui, quem se dedica ao direito não estuda a matéria em cursos de graduação. Há pouquíssimos cursos de pós-graduação, em nível de especialização, e os que existem ainda são rudimentares. Não há oferta de professores especializados. Esse panorama se reflete na insegurança jurídica acentuada que é enfrentada, sobretudo, pelos importadores. A Receita Federal, ano a ano, bate recordes no volume de apreensões de produtos importados, e anuncia-o com orgulho. Isso sugeriria um desenvolvimento no aparato fiscalizador, com qualidade no controle da importação ilegal, mas não é o que se vê. Boa parte – mas boa parte mesmo, diria que a maioria – das apreensões são anuladas, posteriormente, no Poder Judiciário. Minha experiência profissional de mais de dez anos de advocacia na área, além da docência, convence-me disso. Anuladas porque, não raro, a Receita Federal também atua de forma ilegal ou inconstitucional ao operar suas retenções. O importador brasileiro dá mostras de ser menos desonesto do que supõem os aparatos de fiscalização – pelo menos, é o que sugere o balanço das intervenções do Poder Judiciário. E é nessas intervenções que o direito aduaneiro vem se desenvolvendo, a partir da construção jurisprudencial de certos standards – um bom exemplo é a impunibilidade do subfaturamento, na importação, com o perdimento da mercadoria importada, matéria já assentada na jurisprudência. A jurisprudência, no entanto, vai se construindo um tanto disformemente, avançando e retrocedendo, errando e acertando, na difícil tarefa de julgar sem amparo em produção científica adequada. Sem dúvida, um dos motivos para esse crescer desordenado está, precisamente, na escassez de estudos doutrinários sérios, que enfrentem a matéria com desenvoltura e maturidade. O círculo vicioso enfrentado pela falta de leis de sistematização, pela carência de cursos e professores especializados e pela insuficiência de produção científica, gera um estado de insegurança e de descontrole semelhante ao enfrentado nos “tempos heroicos” do direito tributário no Brasil. Se esse estado de coisas encontrava alguma justificação na economia nacional fechada de antes da década de 1990, ela não mais existe no cenário socioeconômico atual. [epico_capture_sc id=”21731″] É na tentativa de contribuir para a superação desse estado de coisas que a comunidade jurídica brasileira deve trabalhar. Aliar a profundidade teórica e a responsabilidade ética ao aspecto prático de orientação da conduta, tanto para consultores privados e advogados, quanto para agentes públicos de fiscalização e julgamento de lides aduaneiras, juízes, advogados públicos e, talvez ainda, para aqueles que atuam, como dever funcional ou ético, na elaboração e no aperfeiçoamento da legislação e do direito aduaneiro. Aperfeiçoamento esse que é um aspecto do desenvolvimento do Estado Democrático de Direito no Brasil.
Breves considerações sobre a legislação aplicável aos cruzeiros marítimos
É evidente o considerável aumento do fluxo de cruzeiros marítimos na costa brasileira na última década. Em recente estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV), encomendado pela Associação Brasileira de Cruzeiros Marítimos (ABREMAR), verifica-se alguns números que comprovam a importância e o grande crescimento da atividade desde a temporada de 2004/2005, sendo que atualmente a mesma vem se consolidando como importante segmento turístico. Na última temporada (2010/2011) aproximadamente 800 mil passageiros realizaram viagens a bordo de cruzeiros marítimos no Brasil, que contou com 20 navios navegando na costa brasileira. Segundo o estudo efetuado pela Fundação Getúlio Vargas, a movimentação econômica total dos cruzeiros marítimos no Brasil – abrangendo os gastos dos armadores e dos turistas – foi de aproximadamente R$ 1,4 bilhão. Em seu estudo, a FGV reconhece que “Este tipo de viagem tem sido cada vez mais realizado por brasileiros, não apenas da classe alta, mas também da classe média. O incremento do poder aquisitivo da população, o aumento do consumo e a facilidade de pagamento dos pacotes são fatores que influenciaram positivamente o crescimento da demanda por cruzeiros marítimos”. Evidente, portanto, que esta atividade possui grande importância na movimentação da economia brasileira, aumentando ano a ano as receitas provenientes do turismo, gerando empregos (lembrando que a Resolução Normativa nº 71 do Ministério do Trabalho e Emprego exige que 25% da tripulação de cada navio seja formada por brasileiros enquanto o navio estiver em cabotagem) e estimulando a entrada e a circulação de divisas. Os cruzeiros marítimos abrangem uma viagem de lazer completa, agregando além do transporte marítimo com escala em diversas cidades, hotelaria, gastronomia, lazer e entretenimento. Deste modo, os navios de cruzeiros deixaram de atuar apenas como um meio de transporte e se transformaram em efetivos destinos turísticos. Diante desse crescimento vem surgindo demandas sobre situações decorrentes da prestação desses serviços, tendo o Judiciário que se manifestar sobre a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor (CDC – Lei nº 8.078/90). Isto ocorre porque a empresa operadora de Cruzeiro seria tida como fornecedora que presta serviço mediante remuneração e o passageiro-hóspede como consumidor que utiliza este serviço como destinatário final. Ocorre que Código Civil (CC – Lei nº 10.406/02 e, portanto, posterior ao CDC), possui capítulo específico sobre o Contrato de Transporte. Há assim, entendimento doutrinário no sentido de que o CC tem precedência frente às normas consumeristas, vez que o diploma Civil afigura-se especial diante das regras gerais aplicáveis às relações de consumo, já que o CDC rege, genericamente, as relações jurídicas qualificadas de consumo, sem, entretanto, regular, detidamente, cada um dos contratos específicos de fornecimento ou prestação de serviços. Em observância aos princípios da lex posterior derrogat priori e lex specialis derrogat lex generalis, e do Princípio da Independência dos Poderes (artigo 2º da Constituição Federal) há sólidos fundamentos jurídicos para suportar a tese de que o CC – lei de natureza especial – deve prevalecer sobre o CDC – lei de natureza geral. No entanto, o entendimento dos Tribunais Estaduais (vez que esta questão ainda não foi analisada pelos Tribunais Superiores) é no sentido de que o CDC rege a relação entre passageiros e armadores. Considerando o entendimento de que o CDC seria aplicável, o fornecedor de serviços – nos termos do que estabelece o artigo 14 – objetivamente responsável pelas falhas na prestação dos serviços, bastando o consumidor configurar o nexo de causalidade e o dano suportado, não havendo que se comprovar a conduta culposa do fornecedor. Deste modo, toda vez que o serviço fosse prestado de forma defeituosa, deixando de alcançar aquilo a que se propõe ou não fornecendo a segurança esperada, teria o prestador de serviços o dever de reparar os danos causados, sejam estes patrimoniais ou extrapatrimoniais. Sendo assim, seguindo esse raciocínio, tendo em vista a responsabilidade objetiva, o CDC apenas desoneraria o prestador de serviço do dever de reparar caso comprovasse que o defeito alegado inexiste ou que teria ocorrido em razão de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (art. 14, § 3°, I e II). Por culpa exclusiva do consumidor entendem-se os casos em que a atitude da suposta vítima é a única causa do evento. Em tal situação a empresa de Cruzeiro, aparente causadora do dano, é mero instrumento deste, restando ausente o nexo de causalidade em relação a mesma; uma vez que somente deve responder pelo dano aquele que concorre para sua produção, há a exclusão de responsabilidade do fornecedor de serviços. Neste mesmo sentido, o liame que une conduta e dano também estaria rompido quando este último decorrer de culpa exclusiva de terceiro. Terceiro é aquele que não possui ligação seja com o prestador de serviços, suposto causador do dano, seja com o consumidor-vítima, estando localizado fora da relação existente entre estes. Depreende-se que o terceiro em questão deve ser totalmente alheio à cadeia de serviço, não possuindo qualquer relação com o fornecedor, para que este seja exonerado do dever de indenizar. Entretanto, verifica-se que o artigo 14 do CDC entra em confronto com o artigo 735 do CC, vez que este – em uma primeira análise – estabelece que o fato de terceiro não exclui a responsabilidade do transportador. Portanto, em tal hipótese o CC seria mais favorável ao consumidor do que o próprio CDC. No entanto, entendemos que esta primeira análise não deve prevalecer, vez que a nossa opinião é de que o fato de terceiro não exclui a responsabilidade do transportador apenas em casos de acidente, conforme será abordado abaixo. Após um exame superficial, a conclusão é de que o fato de terceiro não eximiria o transportador em razão da cláusula de incolumidade inerente aos contratos de transporte, uma vez que se trata de atividade de resultado, existindo a obrigação de finalização confortável e segura do percurso. Neste sentido, parte da doutrina afirma ainda que o fato de terceiro relacionado aos riscos do transporte – tome-se como exemplo passageiro que cause dano a outro – não seria capaz de afastar a responsabilidade do transportador, recaindo a mesma na teoria do risco