Comércio mundial à espera do TFA
Da parte do Brasil, já nada impede que o Acordo de Facilitação do Comércio (Trade Facilitation Agreement, TFA, na sigla em inglês), da Organização Mundial do Comércio (OMC), entre em funcionamento, depois da assinatura de carta da ratificação pela presidente Dilma Rousseff, ao final de março. Mas, para que o acordo entre vigor, é preciso que dois terços dos membros da OMC, ou seja, 108 países, venham a ratificar o acordo. Firmado em Bali, na Indonésia, durante a Conferência Ministerial de dezembro de 2013, o tratado, que visa à desburocratização do comércio exterior e à eliminação de barreiras administrativas, já é considerado histórico por ser o primeiro acordo comercial global em 20 anos. Seu texto prevê medidas voltadas à modernização da administração aduaneira, bem como rapidez e simplificação de procedimentos relacionados ao comércio exterior. Como se sabe, na maioria das nações, os trâmites aduaneiros são complexos e pouco transparentes, representando barreiras não-tarifárias ao comércio. Se o TFA sair mesmo do papel, os governos terão à disposição os meios mais eficazes de combate à corrupção, além de condições de colocar em prática medidas que contribuam para a redução de custos operacionais, inclusive para os setores privados. [epico_capture_sc id=”21683″] Analisando-se o acordo, percebe-se que sua primeira seção dispõe sobre medidas para acelerar a movimentação, liberação e o desembaraço de bens, inclusive de mercadorias em trânsito. Já a segunda seção é constituída por normas de tratamento especial que permitem aos países em desenvolvimento e menos desenvolvidos determinar o momento em que farão a implementação de regras específicas do TFA em seus ordenamentos jurídicos. Por fim, a última seção contém normas que estabelecem um comitê permanente sobre facilitação do comércio na OMC e exigem que os membros da organização tenham um comitê nacional para facilitar a coordenação interna e implementação das disposições do acordo. Com o TFA, a OMC prevê uma redução de 14,3% nos custos do comércio global. Mais: estima que haja um aumento de até US$ 1 trilhão nas exportações globais anuais. Segundo a OMC, o acordo vai permitir que as exportações dos países em desenvolvimento cresçam anualmente entre US$ 170 bilhões e US$ 730 bilhões. Já os países desenvolvidos verão suas exportações crescerem em até US$ 580 bilhões por ano. Ou seja, o acordo deverá impulsionar em 2,7% a alta das exportações mundiais por ano, provocando um acréscimo de 0,5% no crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) global. Com tantos benefícios previstos, não se entende por que se demora tanto para que o tratado entre efetivamente em vigor. Afinal, já lá se vão quase dois anos e meio desde a reunião em Bali que criou o TFA. A última contagem, conforme se pode constatar no site da OMC (www.wto.org), mostra que, com a adesão da Índia e da Rússia, a 22 de abril de 2016, até agora, 77 dos 162 membros ratificaram o acordo. Quer dizer, ainda faltam 31. Nesse ritmo, talvez ao final de 2017 seja alcançado o número mínimo. Até lá, haja paciência…
Portos: investimentos suspensos
Levantamento feito pela empresa R. Amaral e Associados – Consultoria, Pesquisa e Análises de Dados, de Santos, mostra que o governo federal reduziu sensivelmente as dotações orçamentárias para as companhias docas. A Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), que administra o porto de Santos, por exemplo, que teve uma dotação de R$ 545,9 milhões no Orçamento da União de 2014, neste ano foi contemplada com apenas R$ 156,5 milhões. Para piorar, como já se tornou tradição no País, a ineficiência governamental está cada vez mais presente: dos R$ 545,9 milhões que tinha à disposição em 2014, a Codesp só conseguiu gastar R$ 272,8 milhões, ou seja, 50%. Isso significa que, em 2015, cerca de R$ 78 milhões deverão ser gastos em obras de infraestrutrura no Porto de Santos. Ou menos. Até porque, diante dos cofres vazios do governo federal, o porto santista corre o risco de ser obrigado a interromper a implantação e a ampliação das avenidas perimetrais das margens direita, em Santos, e esquerda, em Guarujá, a construção de um píer e dois berços de atracação na Alemoa, a dragagem e o reforço do cais entre os armazéns 12A e 23, entre outras obras. [epico_capture_sc id=”21683″] Se para o porto de Santos e demais portos brasileiros, faltam recursos para a execução de obras, em Cuba a empreiteira Odebrecht começa neste mês a reforma e ampliação do terminal três do Aeroporto de Havana, com recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), crédito oferecido pelo governo brasileiro diretamente ao governo cubano no valor de US$ 150 milhões. É verdade que os recursos liberados pelo governo brasileiro serão gastos obrigatoriamente no Brasil, com empresas que exportarão bens e serviços brasileiros para a construção das obras do Aeroporto em Havana. Mas, se os recursos tivessem sido dirigidos a obras em aeroportos, portos ou rodovias no Brasil, igualmente seriam gastos aqui. Como se sabe, além das obras no Aeroporto de Havana, o BNDES está financiando a ampliação do porto cubano de Mariel a um custo de US$ 802 milhões, igualmente com insumos brasileiros, além de projetos para a colheita mecanizada de açúcar, colheita de arroz, projetos de turismo, compra de veículos e financiamento para a indústria farmacêutica local. No Uruguai, o governo brasileiro também está financiando, por meio do Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul, 80% da construção em mar aberto do porto de Rocha, que, quando pronto, deverá tirar carga dos portos do Rio Grande e outros da região Sul brasileira. Ao justificar a aplicação de recursos em obras no exterior, o governo brasileiro costuma alegar que são investimentos em operações “ganha-ganha”, argumentando que o dinheiro volta por meio das empresas brasileiras contratadas para fazer as obras, que precisam comprar seus insumos no Brasil. Só não se sabe até agora se esses compromissos serão afetados pela disposição do governo federal de fazer cortes nos gastos públicos. Como são compromissos internacionais, provavelmente, não serão atingidos. E, assim, no Brasil, os portos, aeroportos e rodovias – muitas das quais, hoje, são verdadeiras paisagens lunares – continuarão à espera de melhorias.
A hora das pequenas e médias empresas
Aproveitando a atual fase de valorização do dólar diante do real, pequenas empresas têm procurado colocar no mercado externo os seus produtos, principalmente os manufaturados de pouco valor agregado. É o que mostram dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) referentes a 2014, que assinalam o crescimento do número de empresas exportadoras. Segundo o MDIC, no ano passado, 19.250 empresas aturaram no comércio exterior contra 18.809 em 2013, o que equivale a um crescimento de 2,3% no período. Essa evolução, porém, pouco representa no total da receita das exportações, já que o segmento ainda não é expressivo. Na verdade, 50% do que é exportado pelo País provém de 40 grandes empresas exportadoras de commodities agrícolas e minerais, entre elas Vale, Petrobras, Bunge, JBS e BRF, só para citar as cinco maiores. Obviamente, a queda de 7% registrada na receita exportadora está ligada ao desempenho das grandes empresas. Seja como for, é de se assinalar como bem-vindo o crescimento da participação das pequenas e médias empresas nas vendas externas. São empresas que oferecem produtos de baixa tecnologia, mas que se têm beneficiado do câmbio para tornar suas mercadorias mais competitivas no mercado internacional. Para este ano de 2015, a expectativa é que cresça o número de exportadores nessa faixa de comércio. [epico_capture_sc id=”21683″] Para tanto, é fundamental a revisão de metas que fez o MDIC no atual governo, ao reconhecer implicitamente o desastre da política externa que marcou os últimos doze anos e priorizar uma reaproximação com os Estados Unidos, cuja economia vem apresentando sinais de crescimento. É de se lembrar que o mercado norte-americano, o maior do planeta, tem muito espaço para produtos de pouco valor agregado, assim como para os produtos industrializados mais sofisticados do Brasil, que, infelizmente, hoje, têm pouco poder de competição. Nesse caso, 2015 para esse segmento não se afigura com boas perspectivas, especialmente em razão da crise pela qual passa a Argentina, tradicional mercado para esse tipo de produto. Diante disso, é importante que tanto o governo federal como os bancos privados facilitem o acesso a linhas de crédito que possam permitir o crescimento das pequenas e médias empresas no comércio exterior. Hoje, segundo dados do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), as pequenas empresas representam 62% do total de exportadores brasileiros, mas são responsáveis por apenas 1% do total exportado, ou seja, US$ 2,2 bilhões. É preciso, portanto, criar condições para que as pequenas e médias empresas tenham maiores facilidades de acesso ao mercado externo, independente de que sejam fabricantes de produtos com baixo nível de tecnologia ou de produtos industrializados mais sofisticados.
Brasil e China: perspectivas
Em 2014, a China manteve a posição de maior parceiro comercial do Brasil, embora as trocas entre os dois países tenham caído 6% no período. Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), as exportações brasileiras desceram de US$ 46 bilhões em 2013 para US$ 40,6 bilhões, registrando queda de 11,75%, enquanto as importações mantiveram-se praticamente estáveis: US$ 37,30 bilhões em 2013 e US$ 37,34 bilhões em 2014, com um crescimento de 0,10%. No total, a corrente de comércio caiu de US$ 83,3 bilhões em 2013, a maior cifra até hoje, para US$ 77,9 bilhões em 2014. O Brasil manteve um superávit de US$ 3,3 bilhões. Dos números, conclui-se que o Brasil exporta para a China majoritariamente produtos básicos: do total de US$ 40,6 bilhões, US$ 34,2 bilhões foram de commodities (85%), enquanto os produtos industrializados (semimanufaturados e manufaturados) alcançaram US$ 6,2 bilhões (15%). Aliás, a China foi o país que mais importou alimentos do Brasil, com US$ 22,07 bilhões. Da China o Brasil praticamente só importou produtos industrializados: do total de US$ 37,4 bilhões, US$ 36,575 bilhões foram de manufaturados e US$ 92 milhões de semimanufaturados, o que resultou em US$ 36,6 bilhões de produtos industrializados, enquanto os básicos ascenderam a US$ 672,7 milhões. [epico_capture_sc id=”21683″] A posição do Brasil nesse relacionamento comercial não é confortável, pois aparece como fornecedor de matérias-primas. E não há sinais de que possa haver um reequilíbrio na balança. Até porque a economia chinesa registrou, no ano passado, o crescimento mais fraco em mais de duas décadas. E as perspectivas são de que a desaceleração chinesa também venha a ser sentida no Brasil. Afinal, o gigante asiático é o maior comprador mundial de minério de ferro e o seu atual ritmo mais lento de crescimento tem provocado queda nos preços do produto. Já os outros dois principais produtos de exportação para os chineses – petróleo e soja – não deverão ser afetados. Só de soja a China comprou US$ 17,01 bilhões, sendo que US$ 16,62 bilhões foram de soja em grãos Seja como for, o Brasil precisa saber aproveitar melhor essa parceria, atraindo empresas chinesas para o desenvolvimento de sua infraestrutura, especialmente no setor ferroviário, além de ampliar a presença das empresas brasileiras no território chinês. Afinal, esse intercâmbio tem condições de crescer, porque está lastreado na complementaridade entre as duas economias. O Brasil tem disponibilidade de recursos naturais, que fazem falta à China, enquanto o país asiático continuará por um bom tempo a necessitar de commodities metálicas e alimentos. Mas é preciso encontrar também uma maneira de vender produtos manufaturados para o mercado chinês. Talvez em razão da exuberância do agronegócio e da produção mineral, o Brasil, nos últimos anos, não se preocupou em desenvolver uma política industrial, como se conclui da falta de empenho do governo em buscar acordos com os grandes mercados (EUA e União Europeia). Para 2015, o governo já deu sinais de que pretende rever essa atitude e aumentar as exportações para os EUA e União Europeia, especialmente de manufaturados. Mas será preciso também empenho em relação ao país asiático para que a parceria cresça de forma mais equilibrada, o que se pode começar com a agregação de valor aos produtos do agronegócio.
Brasil-EUA: correção de rota
Em 2009, para justificar a adesão à Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) da Guiné Equatorial, país africano governado desde 1979 por partido único e por um mesmo dirigente autoritário e onde poucas pessoas falam o Português, uma alta autoridade do governo brasileiro da época saiu-se com esta: “Negócios são negócios”. Essa estratégia política, ao que parece, não foi seguida em relação aos Estados Unidos, o maior mercado do planeta, pois houve nos últimos governos um propósito deliberado de procurar um distanciamento com aquela nação, a pretexto de diminuir uma possível dependência comercial e política. Ao que parece, o atual governo já deixou para trás esse tipo de doença infantil e tem procurado se reaproximar de Washington. E, não fosse o episódio de julho de 2013, quando veio à tona o escândalo sobre a espionagem de cidadãos e empresas brasileiras pela Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos (NSA, na sigla em inglês), que levou a presidente brasileira a cancelar uma visita àquela nação, as negociações estariam bem mais adiantadas. Seja como for, o resultado daquela desastrada estratégia pode ser conferido nos últimos dados sobre a corrente de comércio (importações/exportações) entre os dois países divulgados pelo Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), ainda que se deva levar em conta também os efeitos da crise financeira global que se registrou a partir de 2008. [epico_capture_sc id=”21683″] Na área de exportações, em 2014, o Brasil vendeu mercadorias para os Estados Unidos no montante de US$ 27 bilhões, o que representou um crescimento de 9,63% em relação a 2013 (US$ 24,6 bilhões), praticamente igualando a melhor marca até agora, obtida em 2008 (US$ 27,4 bilhões). Em 2009, esse valor caiu para US$ 15,6 bilhões, mas, desde então, foi registrada uma recuperação contínua. É de se ressaltar que, do montante de 2014, US$ 19 bilhões foram resultado da venda de produtos semimanufaturados e manufaturados, enquanto US$ 6,3 bilhões, de produtos básicos. Ou seja, isso mostra que o mercado norte-americano é extremamente importante para a sobrevivência da indústria brasileira, especialmente a paulista, porque absorve mais produtos de maior valor agregado. Na área de importações, em 2014, o Brasil comprou US$ 34,9 bilhões em mercadorias, o que representou uma queda de 2,83% em relação a 2013 (US$ 36 bilhões), mas manteve a marca acima de US$ 30 bilhões que se registra desde 2011. Em 2008, época do início da crise global, o montante foi de US$ 25,6 bilhões, tendo caído para US$ 20 bilhões em 2009, recuperando-se em 2010 (US$ 27 bilhões). O que se constata também é que o Brasil desde 2009 importa mais do que exporta para os Estados Unidos. Eis os números: em 2014, o déficit do Brasil foi de US$ 7,9 bilhões; em 2013, de US$ 11,4 bilhões; em 2012, de US$ 5,6 bilhões; em 2011, de US$ 8,1 bilhões; em 2010, de US$ 7,7 bilhões; e em 2009, de US$ 4,4 bilhões. Em outras palavras: o Brasil segue numa direção contrária à da maioria dos países, já que o mercado norte-americano é majoritariamente importador. É como se o Brasil fosse o país desenvolvido e os Estados Unidos a nação em desenvolvimento. Como se vê, algo está errado na estratégia comercial brasileira. E o novo governo precisa revê-la urgentemente.
Muita centralização, pouca eficiência
Coincidência ou não, o esvaziamento da gestão local nas companhias docas e a conseqüente centralização da administração em Brasília não apresentaram resultados positivos, mais de um ano depois da Lei nº 12.815/13, a chamada Lei dos Portos. Pelo contrário. Basta ver que, no período de janeiro a agosto de 2014, a Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), a autoridade portuária de Santos, conseguiu utilizar apenas 26,2% do total de recursos disponíveis no Orçamento da União para os seus investimentos. Ou seja, nos primeiros oito meses do ano, a companhia estatal, embora tivesse direito a utilizar R$ 298,8 milhões em projetos para o complexo santista, só conseguiu usar R$ 78,2 milhões que constavam de sua dotação. Não há como deixar de atribuir esse fraco desempenho à falta de agilidade da estatal, provavelmente em conseqüência do enfraquecimento da administração local e dos órgãos intervenientes, como o Conselho de Autoridade Portuária (CAP) e o Órgão Gestor de Mão de Obra (Ogmo), e, principalmente, em razão do distanciamento do Porto em relação à cidade que o abriga. Mas, como mostram os números, essa falta de agilidade na gestão dos recursos não é uma qualidade negativa exclusiva da Codesp, mas das sete companhias docas atreladas à Secretaria de Portos (SEP). Até porque, em números absolutos, a Codesp foi aquela que mais utilizou recursos. Ou seja, os R$ 78,2 milhões equivalem a 42,5% dos R$ 183,9 milhões utilizados pelas sete estatais. [epico_capture_sc id=”21683″] Mesmo assim, seu desempenho ficou na terceira colocação, atrás da Companhia Docas do Ceará (CDC), com 66,6%, com um dispêndio de R$ 44,3 milhões diante de uma dotação de R$ 66,3 milhões, e da Companhia Docas do Rio Grande do Norte (Codern), que utilizou R$ 27,2 milhões de uma previsão orçamentária de R$ 67,5 milhões, isto é, 40,3%. No geral, o desempenho das companhias docas foi sofrível, pois em conjunto só conseguiram utilizar 14,1% do total disponível no Orçamento da União. Esses números só servem para reforçar as reivindicações da Associação Brasileira de Terminais Portuários (ABTP) no sentido de que seja transferida para o setor privado a administração das companhias docas. Documento da ABTP mostra que, de 2003 a 2013, a iniciativa privada investiu R$ 13 bilhões no setor enquanto o governo orçou R$ 19 bilhões, mas só teve capacidade para investir 47% desse valor. A rigor, o poder público investiu apenas 0,07% do Produto Interno Bruto (PIB) no sistema portuário, quando o Banco Mundial recomenda que sejam investidos pelo menos 4,5%. Além de não ter estimulado a eficiência na gestão administrativa das companhias docas, a nova Lei do Portos criou uma série de entraves que só têm aumentado a burocracia no setor, como mostra o elevado número de terminais que aguardam na Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) autorização para renovação de arrendamentos e expansão. Seja como for, além de autorizar o funcionamento de novos terminais, o poder público precisa investir mais na infraestrutura portuária. Em outras palavras: pouco adiantará que os terminais privados venham a quebrar recordes de eficiência, se o canal de navegação não tem profundidade, a malha ferroviária é limitada e o acesso viário ruim.
Comércio exterior: mais pragmatismo
Uma máxima do pensamento brasileiro diz que o Brasil cresce de noite, enquanto os políticos dormem. É possível que muitos estejam dormindo também durante o período diurno porque o País tem crescido em vários segmentos, embora os índices desse crescimento apareçam igualmente de forma negativa, como na questão da violência social, cujos números superam os de países em guerra civil. A que vêm estas reflexões? Vêm a propósito de um dado que não pode passar despercebido. E que, de certa maneira, assemelha-se à boutade com que se abriu este artigo: apesar de todo o empenho dos últimos governos para baixar o volume de comércio com os Estados Unidos, a pretexto de diminuir uma possível dependência econômica e política, a nação norte-americana constituiu no primeiro semestre o maior mercado importador de produtos manufaturados brasileiros, superando a Argentina. Além disso, os Estados Unidos são também o maior cliente do agronegócio brasileiro. Doze anos passados depois que essa visão terceiromundista tomou corpo em Brasília, a estratégia de diminuir a dependência em relação aos Estados Unidos com a abertura de outros mercados, especialmente na África, Ásia e Oriente Médio, mostrou-se inócua. Hoje, por exemplo, o mercado africano representa apenas 4% do total das exportações brasileiras, segundo a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). Apesar da retórica governamental, uma estratégia nunca excluiu a outra, pois o Brasil poderia ter continuado a vender cada vez mais para os Estados Unidos, sem deixar de ampliar sua participação no mercado mundial, tivesse sua diplomacia buscado outros tratados e acordos de preferências tarifárias. Como preferiu ficar limitado ao Mercosul e apostou cegamente na Rodada Doha, da Organização Mundial do Comércio (OMC), que prevê a liberalização tarifária entre seus países-membros, o Brasil acabou por se isolar, a ponto de correr o risco de fechar 2014 no negativo. [epico_capture_sc id=”21683″] Sem alternativas para o Mercosul, o País hoje sofre com a redução de negócios com a Argentina: em 2014, as vendas para o país vizinho responderam por 77% da queda da exportação brasileira, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic). Para piorar, nem as commoditiesdeverão ajudar a reverter o baixo desempenho. Afinal, o preço do minério de ferro está cada vez mais baixo. E tanto o preço da soja como o do milho estão em queda. É de se ressaltar que a soja e o milho são também os principais produtos da pauta de exportação argentina, o que significa que a receita das vendas externas do país vizinho deverá cair, prejudicando assim as exportações brasileiras para aquele mercado. Por fim, não se pode esperar muito do petróleo em bruto, já que para 2015 a previsão é de um crescimento de apenas 10% na quantidade de vendas. Em outras palavras: talvez seja o caso de o governo brasileiro fazer vistas grossas para o episódio de espionagem norte-americana sobre suas ações e retribuir os acenos de reaproximação que Washington tem feito para Brasília. Em questão de negócios, como bem sabem os asiáticos, o pragmatismo sempre foi a melhor política.
A OMC, o Brasil e seus erros
Ano passado publicamos neste mesmo espaço um artigo em que criticamos severamente o País de ter lutado com unhas e dentes pelo cargo de diretor geral da Organização Mundial do Comércio. Em especial pelas armas utilizadas, com intervenção forte da Presidência e do Itamaraty e convencimento para apoio maciço, segundo se soube, de países da África e do Caribe, todos sem representatividade no comércio exterior. Isso deveria ser uma questão de comércio e não de política. Tínhamos acabado de politizar a geografia comercial mundial, como é próprio do País nos últimos anos. Dividimos o mundo, sem necessidade, em hemisfério norte e hemisfério sul, abrindo uma frente de discordância que não levaria a nada. A direção da OMC deveria ser um desejo dos players do setor, e não de governos. Falamos também da luta desesperada por uma compensação pela falta da cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU – Organização das Nações Unidas, que nem Alemanha e Japão têm. Sonhos de uma noite de verão…Portanto, dissemos, luta em hora errada. Em que não se lutava igualmente para a melhoria do País, de modo a apresentar algo para poder pleitear algo – fosse tanto a diretoria geral da OMC quanto a cadeira no Conselho de Segurança da ONU. Era uma questão de puro bom senso. Qualquer um poderia concluir o mesmo que nós, mas nos tempos atuais, nada mais se vê neste País. Dissemos que o Brasil não era exemplo de economia aberta para ditar regras internacionais. A OMC luta por comércio livre, aberto, simples. Somos uma economia extremamente fechada, que não condiz com o que poderíamos ser. Um país com percentuais bem maiores em território, população e economia do que os meros ínfimos 1,2% do comércio mundial. Nosso comércio mundial, relativamente a nosso PIB – produto interno bruto, é de cerca de 20%, enquanto o internacional representa 50% do PIB mundial. E isso com nosso comércio exterior em queda em 2014, depois de já ter caído em 2013 em relação a 2012. E a tendência é piorar, com a queda dos preços das commodities. O preço a pagar por termos invertido, em 2009, uma situação que tínhamos deixado em 1975, a de sermos um exportador primordial de commodities, passando a ser mais de industrializados. Voltemos às commodities, que representam hoje 60% das exportações brasileiras. Ninguém se desenvolve e ganha peso no comércio mundial só com commodities. Somos cada vez mais protecionistas. [epico_capture_sc id=”21683″] Não fazemos acordos comerciais; estamos na rabeira mundial nesse sentido. Considerando nosso tamanho, PIB, população etc somos o país com menos acordos no mundo. E com a pior logística da Via Láctea e custos logísticos exorbitantes, não dá para ser otimista. O diretor geral parece ter acabado de jogar a toalha, corroborando tudo aquilo que dissemos na ocasião e citado acima. Quem viu os jornais de 17 último percebeu a tristeza da situação. A Rodada Doha, iniciada em 2001, grande esperança do diretor geral, parece ter naufragado. Estamos terminando 2014 e não há luz no fim do túnel. Se, nesse momento, alguma luz for vista é, sem dúvida, um trem em sentido contrário, levando tudo que vê pela frente. O que o governo está fazendo agora para salvar a pele do diretor geral? Absolutamente nada. Ele está sozinho tentando se equilibrar na mais fina corda que já se deu a alguém para travessia pelo alto e em que a queda só pode ser fatal. Ao contrário, o que vemos é o governo tornando cada vez mais difíceis as condições do comércio exterior brasileiro e, por consequência, as condições do seu representante no exterior, em tão importante organização. Como já dissemos anteriormente, a OMC está perdendo cada vez mais sua importância. Sua capacidade de unir os países na liberação do comércio é cada vez menor. E estes, diante da quase nenhuma importância do órgão, dispararam a realizar acordos bilaterais ou multilaterais. Tudo longe da OMC. Já há mais de 300 acordos desse âmbito feitos no mundo, no qual a importância da OMC é seu registro como acordo válido. É um campo em que o nosso país passa longe, cada vez mais voltado às relações com aqueles que somente podem prejudicá-lo, como Venezuela, Argentina, Cuba e outros do gênero. Enquanto vamos caminhando de charrete, os demais países estão voando. Assim que o acordo entre os estados Unidos e a União Europeia for assinado, será colocado o último prego no caixão do nosso comércio exterior. Pena Brasil, pena. Um país com as maiores potencialidades do mundo e sempre rastejando, sem condições de se levantar.
Comércio global: as regras do jogo
Com o baixo poder competitivo até mesmo no mercado interno, a indústria brasileira aguarda o ano de 2015 com ansiedade, depois da constatação de que a política de incentivo a determinados setores tem dado cada vez menos resultados. Proteger-se de um mundo nada amistoso nas práticas comerciais com o acirramento de uma estratégia de isolamento é, no fundo, uma tendência suicida. O que fazer? As próprias lideranças industriais, que já manifestaram sua decepção e desconfiança com o atual modelo econômico, vêm pedindo há muito uma mudança de rumo em busca de maior produtividade para o setor a fim de que seja possível enfrentar a pressão dos produtos importados. Para tanto, é preciso que haja mais tecnologia, investimento, preparo da mão de obra e, enfim, inovação, o que só será possível com maior inserção do País no mundo por meio de acordos mais amplos com outros países e blocos. Só assim o Brasil poderá produzir mais e, em consequência, exportar mais. Em troca, terá de importar mais, inclusive equipamentos para modernizar o seu parque fabril. E até mesmo engenheiros e operários especializados porque nossa mão de obra está defasada em relação à dos países mais desenvolvidos. Basta conversar com qualquer diretor de fábrica multinacional para se ouvir queixas a respeito do desperdício e da falta de compromisso do operário brasileiro. [epico_capture_sc id=”21683″] Isso passa também pela ausência de um ensino profissionalizante mais antenado com as novidades tecnológicas e por mais incentivo das indústrias para que o trabalhador brasileiro estude mais e vire técnico especializado ou engenheiro. Nas atuais circunstâncias, nem mesmo as multinacionais instaladas no País podem usar suas fábricas para produzir com vistas ao mercado externo. E por quê? Porque o nível da automação é baixo e o de tecnologia da informação e de inovação nos processos industriais está longe do que se vê no mundo desenvolvido. Além disso, a mão de obra apresenta muitas carências e deficiências. Portanto, é inadiável que o Brasil busque maior integração mundial, principalmente com a União Europeia e os Estados Unidos, antes que sejam formalizados os chamados acordos megarregionais – o Acordo de Associação Transpacífico (TPP) entre Estados Unidos e países da Ásia-Pacífico, inclusive Chile Peru e México, e o Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP) entre Estados Unidos e União Europeia –, que, fatalmente, irão determinar os padrões do comércio global tanto a nível fitossanitário, regulatório e tarifário, de legislação aduaneira e de questões ambientais. Ficando fora desses acordos e dos grandes blocos, ao Brasil só vai restar cumprir as regras do jogo, sem participar de suas discussões e decisões.
Comércio Exterior Brasileiro: quando começa?
Todos aqueles que militam há décadas no comércio exterior, como é o caso de muitos como nós, devem estar se perguntando a mesma coisa. Que importância, alguma vez na nossa história, teve essa atividade? A resposta é uma só. Quase nenhuma. Se analisarmos o nosso comércio exterior, veremos que ele representa 1,3% das transações internacionais de mercadorias. Quer dizer, US$1,30 de cada US$100.00 comercializados no mundo. Tomando a China como exemplo, em 1980 nós éramos 098% e eles 0,88%. Hoje somos 1,3% e eles 11,1%. Isso porque nosso comércio exterior quintuplicou em relação ao final da década de 1990. O que nos coloca em duas situações. Por um lado, numa posição altamente desconfortável. Por outro lado, em condição “privilegiada”. Com nosso ínfimo comex, é possível e temos campo para crescer. Em especial que, na comparação com nosso próprio PIB – produto interno bruto, o nosso comex é pouco mais de 20% dele. Na média mundial, o comex é 50% do PIB. Há países com bem mais que isso. Em qualquer situação, portanto, nosso comex está muito aquém do possível. A preocupação, em nosso modo de ver, justamente por este tipo de “privilégio”, e até paradoxalmente, é que parece que não estamos muito interessados no desenvolvimento de nossa economia. Nem na geração de empregos. Até porque o governo divulga, teimosamente, sem nexo, que praticamente não existe desemprego no país. Mesmo ele sendo alto, conforme artigo nosso de há pouco. O governo não parece querer olhar nem para o bem-estar da nossa população, o que os últimos 33 anos têm demonstrado cabalmente. Não crescemos, efetivamente, desde 1981. Nesse período nosso crescimento médio anual é de 2,5%. Neste atual governo, até mais baixo, de 2%. O que pode estar ocorrendo com nossos homens de negócios? Será que o desânimo chegou a tal ponto que não há mais como reagir? Ou será nossa selvagem taxa de juros, a maior do mundo em termos reais? Ou talvez a carga tributária, também a maior considerando nosso PIB? Tudo isso junto é um bom motivo. Mas devemos nos calar, nos fechar e não fazer nada? Será isto que a nação espera? Subserviência total ao governo? Sem ir para cima e exigir condições de trabalho, produção e competitividade? Que o governo olhe para a nação e seu povo, ao invés de seus próprios interesses? É perceptível que o governo nada tem feito sequer para minimizar os problemas. Ou solucioná-los. Quantos profissionais de comércio exterior há em postos chaves no governo? Quando o Mincex – Ministério de Comércio Exterior, que já pedimos inúmeras vezes será efetivamente criado? Em especial a partir do que já existe que é a Camex – Câmara de Comércio Exterior, que também já nomeamos várias vezes? Só queremos que todos “remem” para o mesmo lado. O mesmo ocorrendo com todos os outros modos de transporte. Navio aqui é apenas uma figura de linguagem. Isto só ocorre porque o comandante, piloto, motorista, etc. é apenas um por veículo. Acabamos de sair de um evento estupendo, que é a Intermodal, cujo objetivo deveria ser o sonho de qualquer empresário, publicitário, governo, etc. E, no entanto, o que fizemos pelo nosso comércio exterior em nosso tempo de vida? Não seria a copa do mundo a grande oportunidade de mostrarmos a bilhões, ou milhões de pessoas que seja, nossos produtos? Através de degustação, exposição, oferecimento ao público, etc. Será que é isso que veremos na “nossa copa”? Que grande oportunidade, provavelmente, será perdida. Em especial com a nossa seleção estando tão acreditada como parece ser o caso. Quem fizer isso, certamente, terá grandes ganhos. Temos que lotar o entorno de nossos estádios com nossos produtos. Por que não ter estampado na camisa amarela produtos brasileiros? Que tal um ramo ou pé de café? Ou o desenho de um avião? Ou um frango estilizado? Isto para falarmos de apenas três de nossos produtos. Pois é disso que precisamos. Mas, certamente, nada disso acontecerá, como nunca aconteceu. Nossa entidade máxima do futebol, empresários em geral, governo, etc., não parecem ter os mesmos interesses a respeito do país. Claro está que não é apenas isso. Nossas matriz de transporte e infra-estrutura terão que mudar radicalmente para isso. Assim, continuaremos os mesmos de sempre. E sempre acreditando que Deus é brasileiro. Pode até ser, e deve ser mesmo, considerando que ainda existimos. Mas, precisamos ter cuidado. Deus ajuda, quem cedo madruga, diz o ditado. Também porque o Papa agora é argentino. O que pode significar alguma coisa. Como estarmos errados em nossa eterna avaliação sobre quem é quem.