País pode perder o bonde (e o navio) da História
O grupo dinamarquês A.P. Moller-Maersk, que controla a empresa de de navegação Maersk, líder mundial no transporte marítimo de contêineres, encomendou ao estaleiro sul-coreano Daewoo Shipbuilding & Marine Engineering a construção de 11 supernavios conteineiros com capacidade para 20 mil TEUs (unidade equivalente a um contêiner de 20 pés) cada, que deverão estar singrando os mares em 2017. Cada unidade custará US$ 151 milhões e o investimento será de US$ 1,6 bilhão. Portanto, se não tivesse certeza de que a tendência para a construção de navios cada vez maiores é irreversível – até porque isso representa menos custos –, o grupo armador não iria investir tão pesadamente nessas embarcações. Isso equivale a dizer também que os portos que não tiverem condições de receber esses gigantes dos mares serão preteridos nas escalas, ainda que tenham boa infraestrutura em termos de terminais e equipamentos. Como se sabe, não há a menor possibilidade de que algum desses meganavios venha a fazer escala no porto de Santos, cujo calado é de 13,2 metros, suficiente apenas para receber navios porta-contêineres com capacidade para 10.600 TEUs e, mesmo assim, apenas em períodos de maré alta. Por isso, mesmo que o calado de seu canal do estuário seja expandido para 17 metros à custa de muitas obras de dragagem e possíveis desastres ecológicos, o porto santista corre o risco de ser passado para trás pela evolução da navegação. [epico_capture_sc id=”21683″] Para reverter esse quadro, só resta a alternativa de se construir uma plataforma na baía de Santos em águas profundas (off shore). Acontece, porém, que não se sabe de nenhum grupo privado nacional com recursos suficientes para se aventurar num empreendimento de tamanha magnitude, o que significa abrir a possibilidade para que um grupo estrangeiro venha a se interessar pela proposta. Por isso, seria de bom alvitre que o a Secretaria de Portos (SEP) acompanhasse de perto a experiência da Grécia, que arrendou ao grupo chinês Cosco Holding dois terminais no porto de Piréus, nos arredores de Atenas, em direção a Corinto, com bons resultados até agora, apesar da situação de instabilidade política e econômica por que passa o país. É de se lembrar ainda que governo grego estuda a venda de ativos estatais, inclusive o porto de Piréus e aeroportos regionais, para empresas como a Cosco Holding, a APM Terminals, pertencente ao grupo A.P. Moller Maersk, a Ports America, maior operadora de portos dos Estados Unidos, a filipina International Container Services e a Utilico Investment, uma empresa de investimentos privados com sede em Bermuda. Talvez seja o caso de o governo brasileiro atrair essas empresas para uma concorrência para a construção de uma plataforma off shore que possa receber os meganavios. Caso contrário, o Brasil poderá perder o bonde (e o navio) da História.
A Natureza não espera
A partir da conclusão dos grandes armadores mundiais de que o crescimento do tamanho dos navios cargueiros seria irreversível para baratear custos e aumentar a produtividade, o trabalho de dragagem nos portos tornou-se cada vez mais necessário e oneroso. A tal ponto essa tendência chegou que muitos portos da costa brasileira, como o de Itajaí-SC, por exemplo, já passaram a sentir os seus efeitos, pois começam a ser descartados em favor daqueles complexos portuários que oferecem melhores condições de navegabilidade. A experiência mundial, no entanto, tem mostrado que o trabalho de dragagem por si só não resolve o problema, apenas o ameniza por algum tempo. Basta lembrar que, no caso do Porto de Santos, a região de vez em quando é assolada por fortes tempestades, que elevam a maré e podem provocar até a interdição da barra. A consequência desse fenômeno é o assoreamento do canal de navegação e a inutilização do trabalho de dragagem realizado anteriormente, além do desperdício de considerável soma de recursos públicos. Foi para procurar evitar esses problemas que portos como o de Roterdã, na Holanda, e Shangai, na China, já procuraram expandir suas instalações para o mar aberto, garantindo maiores profundidades para o tráfego dos megacargueiros, além de eliminar elevados custos com obras de dragagem. Obviamente, a construção de plataformas off shore (afastadas da costa) exige investimentos pesadíssimos, mas que a longo prazo serão compensadores. [epico_capture_sc id=”21683″] É claro que esse futuro não é para já, ainda que se afigure como inevitável. Por isso, ainda por longo tempo, o Porto de Santos dependerá de obras de dragagem para continuar a receber embarcações de maior porte, como as que prevêem o aprofundamento das cotas de 15 para 17 metros no canal externo e de 15 para 15,5 no interno, além do derrocamento de formações rochosas para o estabelecimento da cota de 16 metros no canal do estuário. Quando essas obras serão iniciadas, ainda não se sabe, até porque a Secretaria de Portos (SEP) pretende dar início neste ano aos estudos necessários para a sua viabilização. Além disso, o governo federal pretende conceder à iniciativa privada o serviço de dragagem do canal de acesso, medida inédita na história do Porto. O que resta saber é se haverá empresa privada disposta a correr os riscos de assumir esse compromisso. Como se sabe, há pouco tempo, o processo de licitação para as obras de dragagem deu em nada, já que o governo considerou excessivamente altos os custos apresentados pelas empresas concorrentes. Acontece que a Natureza não costuma esperar pela boa vontade dos homens. Pelo contrário, tem dado respostas duras à imprevidência humana. E o assoreamento do canal de navegação é inevitável.