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Nossos fundamentos econômicos

Acreditamos que, assim como nós, os brasileiros, pelo menos aqueles mais conscientes, já se cansaram definitivamente de ouvir uma série de clichês, sempre os mesmos. Há um, em especial, e o mais falado nos últimos anos para justificar que a economia brasileira vai bem, graças a Deus.

O atual clichê, já de alguns anos, é  que “os fundamentos da economia brasileira vão bem, são sólidos”. Estamos prontos para crescer, enfrentar as crises internacionais, etc., etc., etc. A previsão do governo para 2012 é assombrosa, de crescimento de 5% ou pouco menos. Tomara fosse, mas não há a menor chance disso.

A economia não cresce efetivamente há 31 anos, desde 1981, enquanto todo o mundo crescia, ou estagnava, ou sofria recessão – enfim, mudava. Mas tudo bem, isso é um simples detalhe, como já ouvimos alguém de peso dizer, há alguns anos.

Talvez  não consigamos ver o que muita gente está vendo. Ou talvez muita gente esteja pensando que vê, isto é, vendo demais. Em especial o governo. Não nos cansamos de perguntar que fundamentos são esses, que parâmetros estão sendo utilizados, ou onde estão eles. Talvez seja preciso usar óculos especiais para enxergar em meio às trevas do momento.

Se analisarmos os juros praticados no País já há vários anos, veremos que são os maiores do planeta em termos reais. Absolutamente inaceitáveis e sem o menor sentido, somente impedindo o crescimento da economia brasileira. Ninguém consegue produzir com eles.

Se formos analisar a carga tributária, nos assustamos da mesma forma. Vemos que no ano de 2011 ela representou cerca de 36% do PIB  (Produto Interno Bruto) do País, com uma arrecadação de 1,5 trilhão de reais. Um absurdo, sem nexo e precedentes. Esse valor representa 4,5 meses de trabalho exclusivo para o governo, por ano. Quem consegue consumir quando se trabalha tanto para o governo? E o consumo é que faz o crescimento e o desenvolvimento de um país.

Quantos de nós, brasileiros, podemos dizer que ao final do mês nos sobram 36% de nossos ganhos? É exatamente o que temos que repassar ao governo perdulário e péssimo administrador. Isso na média – pois já que nem todos pagam impostos ou pagam menos, qual o imposto máximo pago por alguns?

O que dizer do nosso querido comércio exterior, nossa área de atuação há 40 anos, e que representa 20% do PIB? E que significa tão somente 1,2% de um comércio mundial de 32 trilhões de dólares? E isso porque dobramos nosso comércio exterior nos últimos cinco anos. Nem Ministério de Comércio Exterior e/ou Logística temos de modo a juntar os esforços e remar apenas para um lado, apesar de nossos vários artigos e pedidos nesse sentido.

Qual é a nossa política para a área, que é uma das melhores formas de desenvolvimento? Só estamos crescendo porque desde 2009 nos transformamos, novamente, 35 anos depois, em exportadores de commodities – e que estão com preços mais altos do que nunca. E ainda existe a China…

Nossa dívida interna é astronômica, impagável, de mais de 2,5 trilhões de reais, bem mais da metade do nosso PIB, e que só tende a subir com a nossa taxa de juros na altura da lua. Sem falar na compra de dólares pelo Banco Central, aumentando nossa dívida e pagando altos juros – para serem aplicados no exterior a taxas baixas e negativas, provocando enormes prejuízos ao BC.

Nossa PEA ( população economicamente ativa) é de cerca de 100 milhões de almas, e temos registrados em carteira cerca de 35 milhões. O que nos deixa pensando e complica a previdência social. Temos uma grande parcela do povo que vive da bolsa-esmola do governo – que deveria estar criando empregos, e não dando dinheiro.

O Brasil também tem muito a fazer em termos logísticos. Muito a melhorar nos portos, inadequados e na malha ferroviária, a pior do mundo em tamanho, e nas rodovias. Da hidrovia, nem vamos falar!

São esses os bons fundamentos econômicos, tão ressaltados por todos a cada dia?

Nosso investimento está na casa dos 18% do PIB desde 1995, e querem que a economia cresça. Enquanto temos 36% de carga tributária e 18% de investimento há 16 anos, a China tem carga tributária de 17% e investimento de no mínimo 40-45%. Esperamos que ninguém ache que é preciso explicar o crescimento deles e o nosso.

As estradas que levam nossa produção aos pontos de consumo ao exterior estão deploráveis. Temos poucas estradas, e apenas 12% asfaltadas, o que não condiz com a supremacia do transporte rodoviário. Não há como trafegar nelas sem provocar aumentos de custos devido a suas más condições. Indo além, não se pode ser competitivo nas exportações com custos logísticos altíssimos, que representam cerca de 20% do PIB, o dobro dos países desenvolvidos. Por exemplo, 70% de nossa soja anda de transporte rodoviário, enquanto no grande irmão do norte esta quantidade anda via fluvial em 61%. E como se sabe, produzimos soja mais barato que os Estados Unidos, mas, colocamos no navio, para o exterior, bem mais caro. Não há logística que sobreviva a este terremoto.

É bom tentar entender que bons fundamentos econômicos são esses que se apregoa, erroneamente. Não temos política industrial. Nem agrícola. Quanto à energia, até ficamos no escuro, no começo dos anos 2000. Isso com todas as nossas potencialidades e tendo cerca de 20% de toda a água do planeta.

Isso parece ser suficiente, embora muitas motivações ainda pudessem ser utilizadas em nossos comentários, para mostrar o quanto temos problemas e estamos longe de termos bons fundamentos. E sem entrar na questão da educação, segurança, saúde etc. Portanto, novamente vem à tona a pergunta inicial: quais são os bons fundamentos da nossa economia?

Samir Keedi

Professor de MBA, autor de vários livros em comércio exterior, transporte e logística, tradutor do Incoterms 2000,membro da CCI-Paris na revisão do Incoterms® 2010.

Analista de Importação Profissional

2 comentários

  • Acredito que foi o melhor artigo que já li sobre o assunto, expondo verdades e desmascarando a farsa que o governo nos proporciona, esquecendo do povo promovendo taxas de impostos absurdas e politicas externas quase inexistentes, apesar do pais possuir condições de crescimento, como espaço produtivo e matéria prima, ambas não são suficientes para embalar este pais de vez.

  • Ótimo Artigo! Infelizmente eu não vejo o Brasil mudando tão cedo. Temos concições de ser a “bola da vez” e passar da 5 posição nas melhores economias do mundo, mas não sem uma grande revisão nas áreas de logística, tributos e educação.