Provocações ao Siscoserv: BL “To Order”
O conhecimento de transporte marítimo de carga (BL) por si só, não é documento hábil para se verificar a relação contatual relativa ao frete internacional de mercadorias. Cabendo a necessidade de análise de outros documentos da operação para que se possa concluir quanto a obrigação de declarar no Siscoserv, quer seja a aquisição ou a venda do serviço de transporte internacional. Quando a resposta a uma pergunta é “depende”, significa que se está diante de uma situação que irá exigir outras tantas perguntas para que seja, fielmente, respondida. O Siscoserv, em especial quando se trata de transporte internacional de carga, é um terreno muito fértil para as dúvidas e para os equívocos. Sendo a dúvida, muito mais saudável, que a certeza neste caso. Mesmo após mais de 4 anos de edição, a Lei 12.546/2011 ainda causa mais dúvidas que certezas. E entre tantas, o frete internacional de mercadorias e seus reflexos, segue sendo seu ponto mais polêmico. Muitas foram as soluções de consulta já editadas pela Receita Federal do Brasil, a quem, por meio de portaria conjunta, coube a responsabilidade de sanar eventuais dúvidas. Todavia, entendemos que há ainda muitas operações cujas peculiaridades não se encaixam perfeitamente nas soluções de consulta já publicadas. Analisemos, por exemplo, uma operação cujo campo do consignatário se verifique uma pessoa que, posteriormente, não fará a importação em seu nome. O conhecimento de transporte marítimo de carga (BL – Bill of Lading) é de fato a evidência escrita de contrato marítimo de transporte de carga de um ponto a outro pelo mar. Tem-se ainda como relevante que o BL, documento cujas regras para sua emissão são internacional, pode ser: a) Nominativo a Ordem quando consignado em nome do destinatário ou à ordem do próprio embarcador, de seu agente no porto de destino ou de outro sujeito mencionado no documento e transmissível por endosso; b) Nominativo não a Ordem, que como regra, verifica-se por meio de cláusula expressa; c) Ao Portador, quando não indica o nome do destinatário e é transmissível por mera tradição. Dito isso, registra-se a tripla natureza jurídica do BL que é, ao mesmo tempo, a evidência escrita de um contrato de transporte marítimo de carga, recibo de entrega de mercadoria ao transportador ou abordo do navio e título de crédito. Pois bem, eis o ponto. O BL é título de crédito impróprio, uma vez não é possível aplicar a ele todos os aspectos do regime cambiário, em especial, por não se tratar de valores em dinheiro, mas em mercadoria. [epico_capture_sc id=”21287″] Na forma do artigo 744 da Lei n° 556/ 1850 – Código Comercial, o BL é documento de emissão obrigatória pelo transportador e assinado pelo comandante do navio. Além disso, tem natureza de escritura pública, conforme disposto no artigo 587 também do Código Comercial. Os requisitos para a emissão deste documento se verifica no artigo 575 do do mesmo diploma legal. Portanto, título de crédito na forma da lei. Assim, em relação a terceiros, no que tange a sua emissão nominativa a ordem, ele pode ser endossado em branco. Ou seja, sem indicação do endossatário, o que lhe atribui a condição de transmissível pela mera tradição, como um título ao portador. Ou ainda, endosso em preto, onde se faz constar o nome do endossatário. Genericamente, título de crédito é documento necessário para o exercício do direito literal e autônomo nele mencionado[1]. Por esta afirmação, pode-se constar relevantes regras aplicáveis ao BL, em sua natureza de título de crédito. Sendo o título de crédito documento cuja literalidade se verifica na medida que tudo o que está escrito nele tem valor, e por via reflexa, o que não está, não se pode alegar. E da mesma forma, documento autônomo e abstrato, na medida que são assumidas as obrigações escritas no documento, independente do negócio jurídico que lhe deu origem, resulta em obrigação para aqueles que firmaram os documentos. Voltando tais conceitos agora para o Siscoserv, no que tange ao contrato de transporte internacional de mercadorias, cuja existência se evidência pelo conhecimento de transporte – BL, pode-se imaginar por exemplo, uma operação de importação de mercadoria que chegou ao Brasil amparado por um conhecimento de transporte emitido nominativo a ordem, o que significa que ele pode ser endossado a um terceiro que irá promover a nacionalização das mercadorias ou bens. Destaca-se que para o Siscoserv, tal operação mediante endosso, não irá mudar a relação contratual inicial entre o embarcador e o transportador. Mantendo-se, portanto, a obrigação de declarar o frete para aquele que celebrou o contrato de transporte com prestador de serviço – transportador, se domiciliado no exterior. Assim, o contratante do frete, que não será o importador, irá lançar o frete, ainda que posteriormente endosse o BL para um terceiro importador, que irá pagar o frete que jamais contratou, por isso, fora do alcance do Siscoserv. Destaca-se ainda, que o endossatário, que tenha contratado um frete internacional para o transporte de mercadorias, não terá uma declaração de importação sua para vincular ao lançamento do Siscoserv (facultativo, mas com campo específico). O que foge do padrão das operações. O mesmo raciocínio, independente da natureza jurídica de título de crédito, teremos quando tratarmos de uma operação de entreposto aduaneiro sem cobertura cambial, cuja admissão for feita por um contribuinte, mas a liberação das mercadorias por outro ou por outros. O que deve ser considerado é o contrato original realizado entre o entrepostante e transportador. [epico_capture_sc id=”21287″] Por analogia ao direito tributário, ainda que nosso entendimento seja que o Siscoserv tem natureza de obrigação autônoma administrativa e não acessória tributária, como é o normalmente tratada, o contratado entre particulares não é oponível ao fisco. Assim, se o que deseja o Siscoserv é ver declarado a relação contratual do domiciliado no Brasil com o domiciliado no exterior, neste caso de transporte internacional de mercadoria, caberá sempre ao contratante original fazê-lo, independente das relações jurídicas sucessivas. Desta forma, é possível que uma operação no Incoterms FOB, por exemplo, em que o transportador é um domiciliado no exterior, não
Conhecimentos de Embarque e Endosso
Durante muitos anos, desde que escrevemos e ministramos aulas, falamos e ensinamos sobre endosso de conhecimentos de embarque. Quando imaginamos que o assunto se tornou pacífico, que todo mundo o conhece, nos deparamos com a nossa famosa “lojinha de 1,99”. Aquela em que dizemos, escrevemos e provamos em instantes, que apenas um reduzido grupo de 1% dos profissionais sabe o que faz. Enquanto o grupo de 99% apenas faz. E vai tudo bem até o primeiro problema. Nesse momento, o primeiro grupo segue em frente, enquanto o grupo dois para. Ou, pior, muitos vão em frente, cometendo atrocidades. No comércio exterior os conhecimentos de embarque aéreo e marítimo estão nessa categoria. Do quase desconhecimento quanto à existência e endosso. No transporte marítimo, por exemplo, o conhecimento geral é da existência do popular bill of lading, ou nosso, simplesmente, B/L. O seaway bill é quase um completo desconhecido. Pouquíssimos já ouviram falar nele. Falta um mínimo de leitura, ou vontade de aprender, a nossos profissionais, o que é um problema sério para nós. Embora saibamos que, no Brasil, isso não é exclusividade da nossa área, mas quase uma instituição nacional. Aliás, também, como já fartamente descrito por nós. O que nos obriga, a cada aula, dedicarmos alguns minutos para ensinar sobre administração de tempo, para tentarmos melhorar nossa atividade. Arrumando a nossos alunos entre quatro a sete horas por dia para ler, ver e ouvir. Tempo extra, sem tirarmos nada do que fazem normalmente. Mas, ler o que interessa. De tudo, porém, basicamente, comércio exterior, economia e política, sendo estas duas últimas aquelas que regem o mundo. E um pouco de tudo o mais, para melhorar suas condições gerais. Quanto ao conhecimento marítimo, há possibilidade dele ser endossado. E não um documento que sempre pode ser endossado como se imagina amiúde. Como já dito, existem dois tipos de conhecimentos marítimos. O bill of lading, com suas variações de Intermodal, multimodal e charter party, tecnicamente o mesmo, apenas para usos diferentes. O outro é o menos conhecido, e pouco usado, sea waybill. Em relação ao B/L, qualquer um dos três tipos pode ser endossado ou não, dependendo de como foi emitido quanto à consignação. Se ele estiver emitido “a ordem” (to order) poderá ser endossado. Assim, se emitido “a ordem” ou “a ordem do embarcador” deverá, obrigatoriamente, ser endossado por este. Se “a ordem de alguém” no país ou no exterior, ou “a ordem de um banco”, o endosso, se ocorrer, deverá ser feito pelo consignatário. Portanto, sendo um B/L e estando emitido “à ordem” ele poderá ser endossado sem problema, e em geral o é. Com respaldo do artigo 587 da Lei 556 de 25/06/1850. Isso mesmo, uma norma imperial. É o Código Comercial Brasileiro, ainda em vigor. Assim, um B/L “consignado a alguém”, diretamente, sem ser “à ordem”, não pode ser endossado. E ai é que costuma estar o problema. Há quem o endosse, e há quem o aceite, inclusive a RFB – Receita Federal do Brasil. Isso não poderia ocorrer em hipótese alguma. [epico_capture_sc id=”21329″] Dissemos que o consignatário é quem deve endossar o Bill of lading, quando for permitido. Mas, obviamente, como é fartamente sabido, não precisa ser necessariamente pela própria “pessoa”. Existe o instituto da procuração, dando poder a outrém, que pode ser usado para tudo. Tanto particular quanto passada em cartório, sempre dependendo das exigências legais ou particulares para tal. Assim, quem tiver procuração desta “pessoa”, especificamente para tal ato, seja o que for, poderá agir em seu nome. Isso ocorre o tempo todo com qualquer coisa. Obviamente, pode ocorrer com endosso do B/L. O sea waybill, o outro conhecimento de transporte marítimo citado, deve ser emitido, sempre, diretamente a alguém, e nunca “à ordem”. Isso por que ele é um documento criado “não negociável” (not negotiable). Assim, ele não permite seu endosso, o que significaria torná-lo negociável, o que ele não é. Mas, na nossa “lojinha de 1,99”, há quem o endosse, indevidamente. Quanto ao conhecimento de transporte aéreo, o awb – airway bill, ou seus derivados em caso de consolidação de carga, o hawb – house airway bill (conhecimento filhote) ou o mawb – master airway bill (conhecimento mãe) é diferente. Este é um documento que não pode ser endossado. E uma das razões é sua própria criação, externada em seu próprio formulário. A outra, as instruções da IATA – International Air Transport Associaton (Associação de Transporte Internacional). Em primeiro lugar temos o formulário que, no alto, mais ou menos no meio, podendo ser levemente à direita, no box do nome da empresa, está escrito, claramente, “not negotiable”. Isso significa que o documento foi criado não negociável. Assim, se ele próprio está designado dessa forma, não há como negociá-lo. O que significa que não pode ser endossado. É contra sua própria natureza. O consignatário tem que fazer a DI – Declaração de importação e retirar a mercadoria. A segunda razão, que inviabiliza o endosso, é que o documento não pode ser emitido “à ordem”. Ele tem que ser emitido consignado “a alguém”. No TACT Manual – The Air Cargo Manual, temos os itens “terms – consignee”, e o “shipper’s documentation”. O primeiro item reza “the person whose name appears on the awb as the party to whom the goods are to be delivered by the carrier” (a pessoa cujo nome aparece no awb como a parte a quem a mercadoria deve ser entregue pelo transportador). O seguindo item reza “show consignee’s full name, street, address, city and country” (mostrar nome completo, domicílio, cidade e país do consignatário). Assim, não é possível endossar o AWB. Quando endossado, o é de forma equivocada. O pior é que muitos fiscais o aceitam.
Falsificação de B/L: Abordagens técnicas e legais
Por André de Seixas | @comexblog Introdução Tratei do tema falsificação de B/L neste outro post. O artigo teve grande repercussão e, por esse motivo, decidi dar continuidade ao assunto, porém, dividindo o espaço com dois conceituados advogados. Recebi algumas mensagens provenientes de agentes de cargas e armadores que passaram pelos mesmos problemas. Em uma delas, um armador informou que fez vários investimentos em segurança adotando, por exemplo, Bs/L com marca d água oculta, que somente pode ser observada com o uso de aparelhos infravermelhos, lupa, etc. Além de investimentos, os armadores também passaram a adotar modos operantes mais rígidos para liberação das cargas, no sentido de obrigar consignatários, importadores e despachantes a se dirigirem até as agências marítimas para apresentar os Bs/L originais. Somando-se ao fato de que somente os armadores têm o privilégio de bloquear o “frete armador” no SISCARGA, o que impede a saída da carga do recinto alfandegado, não seria um erro afirmar que as empresas de navegação estão conseguindo se blindar. Então, atualmente, as grandes vítimas desses crimes, além dos exportadores estrangeiros, são as empresas NVOCC`s e seus agentes de carga no Brasil. O motivo é bem simples: Não possuem o privilégio de bloquear o “frete armador” no SISCARGA. O que pode ser mudado, para que todos players possam ficar protegidos dessa prática criminosa? É uma solução técnica ou jurídica? Quais os crimes e as penas previstas na legislação brasileira? Estas e outras serão respondidas nesse artigo. Uma Abordagem geral sobre o B/L, procedimentos e a sua falsificação (por Dr. Luiz Henrique Oliveira) O conhecimento de embarque ou “bill of lading” é o documento mais importante da navegação, tornando-se um instrumento com múltipla função, servindo como um contrato, recibo e título de crédito (sua posse equivale à posse das mercadorias que descreve). No Brasil, o conhecimento de embarque permanece regulado pelo Decreto 19.473, de 1930 (ato normativo primário em vigor). Quase um século antes da criação do referido Decreto, o Código Comercial Brasileiro, em seus artigos 575 e seguintes (ainda em vigor), já estabelecia o que o conhecimento pode ou não conter. Assim, mesmo que a Aduana pretendesse substituir inteiramente o “bill of lading” pelo conhecimento eletrônico, é certo que uma instrução normativa não poderia revogar um Decreto com status de lei (tendo sido recepcionado como tal). Daí a importância desse documento, cuja via original deve ser sempre apresentada no ato da retirada das mercadorias pelo importador e, assim, devidamente conferida pelo recinto alfandegado. Existem casos, porém, em que o exportador, desconfiando do comportamento doloso do importador, acaba por reter as vias originais do conhecimento, solicitando ao transportador a retenção física da mercadoria no terminal portuário. Ao tomar conhecimento de que o importador não detém a posse da via original do B/L, o transportador passa a reter a posse das mercadorias. Em defesa do transportador, aplica-se a regra da exceptio non adimpleti contractus, ou exceção do contrato não cumprido (art. 476 do CCB), uma vez que o importador, antes de cumprida sua obrigação (apresentação do b/l original), não pode exigir o implemento da obrigação do transportador (entrega das mercadorias). Nesses casos, o agente marítimo promove o bloqueio automático no SISCARGA na tentativa de impossibilitar a retirada da mercadoria pelo importador. É aí que residem os problemas: Um deles se dá pelo fato de que o sistema possibilita o bloqueio somente ao agente marítimo (representante do armador), e não ao agente de cargas (representante do NVOCC), que não possui acesso a tal dispositivo. Assim, nos embarques realizados por empresas NVOCC`s, não é possível o bloqueio automático das mercadorias no SISCARGA, ficando o agente de carga totalmente desamparado. Outro problema é que o sistema possibilita o bloqueio das mercadorias apenas na hipótese de falta de pagamento do frete. Na prática, a IN800/2007, em seu artigo 40, reproduziu o texto do artigo 7º do Decreto 116/67, dispondo que é facultado ao armador determinar a retenção da mercadoria em recinto alfandegado, até a liquidação do frete devido ou o pagamento da contribuição por avaria grossa declarada. Acontece que na maioria dos casos de falsificações de Bs/L, o importador também realiza o pagamento do frete ao transportador, não cabendo, em tese, a justificativa para a retenção da mercadoria por falta de pagamento do frete, o que tem sido objeto de calorosas discussões. Ao constatar a retirada indevida das mercadorias pelo importador, o transportador (seja ele armador ou NVOCC) poderá, através de seu agente no destino, providenciar o registro de um Boletim de Ocorrência, comunicando tal fato às autoridades competentes. Além de demonstrar a boa fé do transportador, a lavratura do Boletim de Ocorrência poderá salvaguardar seus interesses na hipótese de eventual ação de perdas e danos movida pelo exportador. Logo, não se poderia cogitar em negligência do transportador, uma vez que o resultado do ilícito exorbita a previsão do homem mediano. Na verdade, o ideal seria que o SISCARGA possibilitasse o bloqueio em situações que não somente aquela prevista (falta de pagamento do frete), facilitando seu amplo acesso aos agentes marítimos e agentes de carga. Portanto, caberá à Receita Federal (RFB) não só o desafio de adaptar a legislação aduaneira às necessidades do comércio exterior brasileiro, mas também de aprimorar o SISCOMEX CARGA para fazer valer o seu propósito de instrumento controlador. Uma abordagem criminal sobre a falsificação de B/L (por Dra. Marília Bonavides) Pela Instrução Normativa da Receita Federal de nº 800/2007, que instituiu o novo sistema, todo o tramite de importação de mercadoria e desembaraço alfandegário está informatizado. Todas as etapas estão previstas no programa. Desta maneira, ficou salvaguardada a tributação para a Receita Federal, o que constitui um importante avanço, porém a divulgação da senha (nº CE-Mercante) no sistema facilitou, ao importador desonesto, falsificar o B/L e conseguir liberar a carga sem pagar o exportador, ou seja, o novo sistema deixou vulnerável a segurança do negócio e a credibilidade do Brasil no comércio exterior ficou ameaçada. São necessários alguns ajustes para sanar esta lacuna. A luz do Direito Penal, em uma análise superficial, identifica-se, de imediato, a presença de 02 tipos
Falsificação de B/L: Um grande problema para o comércio exterior brasileiro
André de Seixas | @comexblog Este é um problema antigo e que causa grandes prejuízos a todos os brasileiros, pessoas físicas ou jurídicas, estejam envolvidas, ou não, com o comércio exterior. Um breve histórico Antes da implantação do SISCARGA (SISCOMEX CARGA), que veio com a entrada em vigor da INSTRUÇÃO NORMATIVA RFB Nº 800/2007, a falsificação de Bills of Lading era um ilícito mais difícil de ser praticado, portanto, ocorria com menor frequência. Isso porque, antes, para se ter acesso ao número da CE-Mercante, o importador, inevitavelmente, tinha que apresentar ao transportador marítimo toda documentação necessária, incluindo o B/L original (a assinatura do agente e o carimbo do recolhimento do AFRMM – Adicional de Frete para Renovação da Marinha Mercante – tinham que constar no verso do B/L original). Ou seja, cometer este crime era mais complicado, porque os transportadores marítimos e agentes possuíam e possuem critérios técnicos para acusar uma eventual falsificação de B/L. Depois da implantação do SISCARGA, os numero dos CE`s-Mercante master e/ou house passaram a ser expostos no SISTEMA MERCANTE e o importador passou a ter acesso ao numero da sua CE, sem ter que se dirigir aos transportadores marítimos ou agentes, facilitando a vida daqueles que cometem tal crime. Como já foi amplamente divulgado, todo o processo de desembaraço aduaneiro (despacho para consumo) está informatizado. Nenhuma das etapas de pagamento de impostos, fretes, armazenagem e despesas portuárias precisam ser realizadas manualmente, tampouco necessita de apresentação de documentos. Assim, atualmente, o importador registra a sua declaração de Importação, paga os impostos, taxas e tem a sua carga liberada via sistema. O momento de apresentação dos documentos, incluindo aí o B/L original, ocorre somente quando da retirada da carga do recinto alfandegado. Aí surgem as dúvidas acerca de como ocorrem essas praticas criminosas. Bem, como foi dito acima, antes da implantação do SISCARGA o B/L falso tinha, necessariamente, que ser apresentado ao armador e agente, ou seja, a quem o emitiu. Depois da implantação do sistema, quem passa a avaliar se o B/L é original é o recinto alfandegado, que não tem a menor capacidade e subsídios técnicos para fazer a verificação se um B/L é falso ou verdadeiro. Como se sabe, dada a enorme quantidade de empresas NVOCC`s (nom vessel operating commom carrier) estabelecidas mundo a fora, principalmente na República Popular da China, a situação piora ainda mais, sendo certo que um recinto alfandegado não tem a menor condição técnica da avaliação acerca da autenticidade do conhecimento. Por exemplo: Já imaginaram os recintos brasileiros realizando a comparação de Bs/L de cada NVOCC que envia cargas ao Brasil? Com certeza seria impossível retirar cargas do porto sem prejuízos. Quando o B/L é de um grande transportador marítimo de linha regular, ou de um grande NVOCC, pode ser que o trabalho fique mais fácil. Contudo, mesmo assim, o trabalho é bem complicado. Isso porque, o recinto terá que entrar em contato com o transportador para saber se um B/L é verdadeiro. Por sua vez, o transportador deverá entrar com contato com o exportador para saber se ele entregou ao importador os originais. Isso demandaria bastante tempo e o recinto correria o risco de indenizar o importador pelos prejuízos decorrentes dessa demora, em uma eventual ação de perdas e danos, se suas suspeitas foram infundadas. É evidente que a dinâmica do transporte marítimo internacional não permite uma avaliação caso a caso nesses moldes. Por que falsificam Bs/L ? A resposta é simples. Porque conseguem retirar a mercadoria do recinto alfandegado sem pagá-las ao exportador. Esses casos ocorrem quando os pagamentos aos exportadores não são feitos através de garantias bancárias, ou cartas de crédito. Pontualmente, verificam-se maiores ocorrências quando o pagamento das mercadorias ao exportador é feito via Cobrança Documentária, que é uma negociação feita na base da confiança do vendedor para o comprador. Basicamente, nesta modalidade de pagamento, o exportador envia a mercadoria ao país de destino e entrega os documentos de embarque e a letra de câmbio (saque) ao banco negociador do câmbio no Brasil (banco remetente). O banco remetente os encaminha, por meio de carta-cobrança, ao seu banco correspondente no exterior (banco cobrador). O banco cobrador entrega os documentos ao importador, mediante recebimento do pagamento ou do aceite do saque. De posse dos documentos, o importador pode desembaraçar a mercadoria importada. O ponto é justamente este: Enquanto os documentos originais (incluindo o B/L) estão no banco aguardando pagamento da quantia pactuada entre comprador e vendedor, a carga é retirada do recinto alfandegado com um B/L que não é o original. O tempo passa e o exportador começa a se preocupar pelo fato de ainda não ter recebido a quantia da venda ou aceite do saque e pelo fato de o importador não ter retirado a documentação. Então, o exportador, através de seu representante no Brasil, do transportador ou NVOCC, ou de pessoa conhecida, solicita a averiguação do local para onde a carga foi destinada, onde, em tese, deveria estar armazenada. Quando vai fazer a confirmação, verifica que carga já saiu de lá, totalmente desembaraçada, há tempos. A primeira atitude do exportador é procurar o transportador marítimo, ou NVOCC. Via de regra, eles acusam essas empresas de terem feito a emissão de uma segunda via de originais e de tê-las entregues ao importador para que liberassem as mercadorias. Aí começam os problemas para as empresas transportadoras e NVOCC`s. Isso porque, as suas seguradoras (clubes de P&I), terão como primeira reação, diante da acusação de emissão de uma segunda via de originais, a retirada da cobertura do risco. A emissão de segunda via e B/L é licita, para os casos de extravio (descaminho) da primeira via. Inclusive está prevista no Artigo 580 do Código Comercial Brasileiro: “Art. 580 – Alegando-se extravio dos primeiros conhecimentos, o capitão não será obrigado a assinar segundos, sem que o carregador preste fiança à sua satisfação pelo valor da carga neles declarada.” Os seguros dos transportadores e NVOCC`s, nos casos de descaminho com emissão da segunda via de original, pedem que a quantia da carga
BL – Extravio
Temos visto com uma certa frequência importadores perdendo os originais do conhecimento de embarque marítimo. Diretamente ou pelos seus agentes, despachantes, prestadores de serviços, etc. Sendo ele o nosso conhecido e popular Bill of Lading (B/L). Um dos documentos mais importantes do comércio exterior, e o mais importante da navegação marítima. O B/L é um dos dois conhecimentos marítimos que são emitidos, já que existe também o Sea Waybill, este bem menos conhecido e utilizado. E os importadores, naturalmente, vão ter problemas com isso. Temos dito a nossos alunos e consulentes que perder um B/L é uma das coisas que nunca se pode fazer na vida. As pessoas estranham o fato, e percebem então que nunca deram a devida importância ao assunto. Elas normalmente não têm idéia da gravidade da situação. E podem até pensar que perder um B/L é como perder outro documento qualquer. Perder um conhecimento de embarque marítimo significa não poder retirar a carga após o despacho aduaneiro. Quando se consegue fazer o despacho sem sua apresentação, o que deve ser resolvido junto a RFB – Receita Federal do Brasil. Uma vez realizado o despacho, e tendo sido a mercadoria desembaraçada, é hora de retirá-la para seu uso. O fiel depositário da carga, para entregá-la, precisa de uma via original do conhecimento de embarque. Ele não a entrega sem sua apresentação e retenção. E o armazém tem que guardar esta via original por cinco anos à disposição da RFB. Se entregar a carga sem o conhecimento de embarque, pode ser penalizado. Conforme artigos 70 e 71 da lei 10.833/03. É comum se recorrer ao armador para a emissão de um novo conhecimento de embarque. Que, naturalmente, a priori, se recusa a fazê-lo. E com toda a razão, considerando que um B/L é um contrato de transporte, um título de crédito e um recibo de carga. Com essas condições, em especial as duas últimas, o armador tem toda razão, visto que o B/L vale carga. Ele, tecnicamente, portanto, não pode emitir novo jogo de documento, pois não há duas cargas a serem entregues. Se após a entrega da carga ao dono da mercadoria, o que está com o segundo jogo de B/L emitido, aparecer alguém com o primeiro B/L, o armador terá que entregar nova mercadoria a este. E essa segunda mercadoria, claro, não existe, o que cria a ele um problema sério. Assim, o armador até pode emitir um novo jogo de conhecimento, porém, vai exigir da empresa, normalmente, uma garantia bancária. E, naturalmente, por um valor igual ou maior que o da carga. E, também, com validade longa de, por exemplo, cinco anos. Essa garantia bancária é que vai dar ao armador a tranquilidade necessária no caso de uma segunda pessoa, a que achou o conhecimento extraviado, aparecer para exigir a mercadoria. Ele simplesmente a indenizará em lugar da mercadoria, já que esta não existe para ser entregue. [epico_capture_sc id=”21731″] Portanto, como se vê, o armador tem toda razão. Só existiu o embarque de uma mercadoria. Assim, só se justifica a emissão de um conhecimento para aquela mercadoria. A emissão de um jogo adicional pode trazer ao armador também problemas com o seu P&I Club – Protection and Indemnity Club. Um clube criado por vários armadores, para agir em seus nomes quando necessário. É comum as pessoas invocarem os decretos 19.473/30; 19.754/31 e 21.736/32. E anunciarem o extravio por três dias na imprensa. E, com isso, acharem que o armador tem que emitir novo jogo completo de Bill of Lading. É preciso ficar claro que estes três decretos estão revogados, nada valendo. Os dois primeiros em 1991 e o terceiro em 1999. E, mesmo que estivessem em vigor, o armador não seria obrigado a emitir novos originais, conforme já exposto. É pensamento também do importador, algumas vezes, sugerir recorrer à justiça para obter do armador a emissão de um novo conhecimento de embarque já que ele não quer emiti-lo. Esta é uma atitude sem nexo, pois o armador não está se recusando a emitir o conhecimento de embarque. Ele já o emitiu por ocasião do embarque, portanto, já cumpriu sua obrigação. Sua recusa é apenas com a sua reemissão, já que não existe a mercadoria adicional. Assim, descartada a ação legal contra o armador, bem como a sua obrigatoriedade de reemissão do conhecimento de embarque, a única opção é a questão comercial. Pedir ao armador, humildemente, que o ajude a sanar o problema da perda do conhecimento. O armador não terá por que recusar a sua reemissão e ajudar o importador, conquanto este apresente a ele a garantia de que não terá que entregar nova mercadoria, que não estará em seu poder. Assim, reiteramos, pode-se cometer muitos erros. Mas nunca o de perder um Bill of Lading, o que é mortal. Ele deve ser tratado com o carinho com o qual se trata uma namorada ou um namorado extremamente queridos.