Cabotagem e a vantagem competitiva das empresas no sul do Brasil
Sabe-se que o custo logístico da indústria nacional é muito grande, variando em torno de 13% do valor do produto final. Tal custo acaba encarecendo a produção e diminuindo a competitividade dos mesmos nos mais variados setores da economia. Como forma de diminuição destes custos, o governo criou programas com objetivos de reduzir o custo da energia elétrica praticada no País. Porém o corte do gasto com a energia elétrica não é a salvação e muito menos a solução do alto preço praticado principalmente pelas indústrias do sul do país, onde o custo logístico aumenta pelo fato da localização geográfica. Os principais custos são centralizados nos seguintes aspectos: transporte de longa distância, armazenagem, distribuição urbana, portos e aeroportos e administrativas. Como fatores determinantes, destacam-se as más condições das rodovias e a burocracia governamental. No caso do sul do país, onde o custo logístico é superior, principalmente no setor moveleiro, algumas empresas estão buscando soluções para diminuir os gastos e aumentando a competitividade através da redução do valor praticado no valor do produto final. Como forma de diminuição do custo do transporte, seria o envio destes produtos via modal marítimo através do sistema de cabotagem. Como definição para este termo ainda pouco conhecido no Brasil, é o transporte aquaviário entre dois pontos em um mesmo país. Sabe-se que no Brasil, 80% da população e 70% das empresas estão localizadas a menos de 300 quilômetros da costa, facilitando ainda mais esta prática que infelizmente é tão pouco utilizada atualmente. Com isso, algumas empresas vêm adotando esta prática principalmente para o transporte de móveis para o nordeste do país, resultando numa redução notável no custo do transporte. Existem empresas que atuam neste ramo oferecendo serviços de ova e desova dos materiais, desde o carregamento na empresa fabricante, transporte até o porto, trâmites de embarque e desembarque, finalizando na entrega ao consumidor final. Algumas até realizam a entrega em mais de um cliente (carga fracionada). A cabotagem torna-se então para alguns casos, um diferencial competitivo, pois com a redução do custo logístico, é possível aumentar o lucro líquido e até mesmo reduzir o preço para o consumidor final. Porém, a desvantagem desta atividade é o maior tempo de transit-time. Para exemplificar, uma carga que sai do Rio Grande do Sul ao Amazonas via rodoviário, demora em média de 10 a 12 dias para chegar ao destino. No caso da cabotagem, o tempo de viagem chega a ser de mais de 25 dias. Este talvez seja a maior desvantagem do modal, pois tal fator é decisivo nas operações atualmente. Algumas empresas moveleiras estão em fase de instalação das operações no nordeste brasileiro, objetivando a estocagem e o acabamento final, também conhecido como postponement. Com esta prática, é possível organizar um estoque de segurança de acordo com o tempo do transporte via aquaviário, e conseguindo então, diminuir o custo final do produto através da redução dos custos logísticos.
Cabotagem: vantagens e obstáculos
Se há um enigma que ninguém consegue decifrar na história da construção da matriz de transporte adotada pelo Brasil no século XX esse diz respeito à cabotagem. Afinal, ninguém consegue entender como um país com cerca de 9 mil quilômetros de costa que acompanham cerca de 50% do seu perímetro territorial e condições favoráveis à navegação durante quase todo o ano nunca tenha investido como deveria no desenvolvimento do transporte de cargas entre portos nacionais. É verdade que a situação já foi pior. Hoje, embora 48% do transporte de cargas no Brasil ainda sejam feitos por caminhões e carretas, muitos fabricantes e comerciantes já descobriram as vantagens do modal, cujo custo é, em média, 20% mais barato em relação ao rodoviário, além de menos poluente. Sem contar que oferece maior segurança, pois a bordo a carga não está sujeita a tantos roubos e assaltos como se dá nas rodovias. Nem exige a presença de escolta armada, como ocorre com determinadas mercadorias. Tudo isso acaba por encarecer ainda mais o frete e o seguro. Levando em conta essas vantagens, muitos empresários vêm optando pela cabotagem que cresce entre 15% e 20% ao ano, principalmente em razão do aumento da produção agrícola brasileira, em especial produtos orgânicos. Hoje, 32 empresas operam cerca de 670 mil TEUs (unidade equivalente a um contêiner de 20 pés) e 129 milhões de toneladas de cargas a granel, segundo dados da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq). Mas isso é ainda pouco, principalmente se se levar em consideração que não é só a imensa costa brasileira que pode ser aproveitada, pois há também a possibilidade de navegação no interior do País, com a construção de eclusas nas principais hidrovias e a interligação delas com os portos. Obviamente, isso exigiria recursos em quantidade superior àqueles que, normalmente, o governo federal costuma dirigir para a área de infraestrutura logística. Se não está disposto a investir mais, o governo federal pelo menos poderia incentivar a evolução da cabotagem como opção de transporte, permitindo que o setor se beneficiasse de combustível a menor custo. Se no modal rodoviário o diesel consumido recebe incentivo fiscal, isso não se dá no transporte marítimo. Por isso, o preço do bunker, o combustível usado pelos navios, é mais barato para as embarcações de longo curso, que estão isentas de impostos. Portanto, o combustível constitui uma parte extremamente onerosa para o segmento. Há outro pormenor que não pode passar despercebido em qualquer análise sobre o setor: os encargos trabalhistas sobre as tripulações nacionais. Segundo dados do setor, um tripulante brasileiro custa em média 38% a mais que o tripulante estrangeiro. Ora, tudo isso compromete a competitividade das empresas nacionais. Mas ainda há outro obstáculo que é gerado pela insensibilidade das autoridades: a burocracia aduaneira. Embora a cabotagem envolva apenas a carga doméstica, os produtos estão sujeitos ao mesmo tratamento dispensado ao transporte de longo curso, o que foge à luz da razão. Tudo isso contribui para aumentar o tempo de entrega da mercadoria. [epico_capture_sc id=”21329″] Como enfrentam tantos obstáculos, as empresas brasileiras que atuam na cabotagem não crescem como deveriam e, portanto, não constituem um mercado sólido que possa ser aberto para enfrentar a concorrência estrangeira. Se isso ocorresse, o embrião da cabotagem que existe no Brasil, com certeza, morreria em pouco tempo. Para avançar, portanto, é necessário criar condições para que a indústria naval brasileira venha a produzir os navios que poderiam não só abaixar a idade média da frota nacional que atua nesse mercado, hoje em torno de 18 anos, como aumentar a capacidade de transporte dos armadores. Portanto, é de esperar que o recente interesse do governo pela infraestrutua logística do País chegue também à cabotagem.