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Perdimento e destinação de mercadorias

A burocracia e a conseqüente morosidade na destinação de mercadorias abandonadas ou apreendidas pela Receita Federal é um assunto que há anos incomoda armadores e terminais alfandegados, cujo resultado reflete diretamente nos usuários desses dois serviços.

Milhares de contêineres estão indevidamente retidos nos recintos alfandegados brasileiros aguardando que seu conteúdo seja destinado pelas autoridades. Milhares de metros quadrados de armazéns estão abarrotados de mercadorias na mesma situação.

Por que os contêineres dos transportadores marítimos ficam retidos nos terminais?

Embora o nosso ordenamento jurídico não trate o contêiner como embalagem da mercadoria, este, que é concebido exclusivamente para o transporte, devido à falta de espaço coberto nos terminais, acabam por se tornar extensão dos armazéns dos fiéis depositários.

A Lei do transporte Multimodal (Lei nº. 9611 /1998) é clara em seu Artigo Art. 24, Parágrafo único:

“Art. 24. Para os efeitos desta Lei, considera-se unidade de carga qualquer equipamento adequado à unitização de mercadorias a serem transportadas, sujeitas a movimentação de forma indivisível em todas as modalidades de transporte utilizadas no percurso.

Parágrafo único. A unidade de carga, seus acessórios e equipamentos não constituem embalagem e são partes integrantes do todo.”

Confusões acerca da natureza jurídica do contêiner são comuns, porém, tal equívoco, por uma questão de conveniência, não pode trazer ao transportador marítimo prejuízos de milhões de dólares anuais, simplesmente porque seus contêineres são retidos forçosamente pelas autoridades, em nome da enorme burocracia que existe para destinação de mercadorias.

Afinal de contas, o transportador marítimo necessita de seu contêiner para gerar frete, necessita de seu contêiner para o exercício de sua atividade econômica e, na falta de equipamentos, restarão a ele duas opções: Deixarão de embarcar mercadorias; ou alocarão outras unidades para suprir a falta das que estão indevidamente retidas. A segunda opção tem um custo bem elevado.

Os depositários da Receita Federal, também amargam muitos prejuízos e em uma situação mais complexa. Isto porque, para guardar essas mercadorias, além de serem obrigados a dispor de um absurdo espaço (armazéns ou pátios), muito acima do pactuado no contrato de concessão, não conseguem receber quantias devidas pela armazenagem, conforme determina a Lei.

A Portaria RFB nº 1.022, de 30 de março de 2009, que estabelece requisitos e procedimentos para o alfandegamento de locais e recintos em seu Artigo nº. 9 dispõe:

Art. 9º A administradora do local ou recinto deve disponibilizar sem custos para a RFB durante todo o período de vigência do alfandegamento:

I – local e equipamentos para guarda e conservação temporária de amostras;

II – instalações privativas destinadas à guarda e armazenamento de mercadorias retidas ou apreendidas, ressalvadas as situações amparadas pelas disposições do art. 31 do Decreto-Lei nº 1.455, de 7 de abril de 1976;

O Decreto nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009, que regulamenta a administração das atividades aduaneiras, e a fiscalização, o controle e a tributação das operações de comércio exterior, dispõe que,  decorridos cinco dias, a contar do prazo em que as mercadorias são declaradas abandonadas, os depositários devem fazer a comunicação sobre as mercadorias que ali se encontram, cujo desembaraço aduaneiro não tenha sido iniciado.

Art. 647.  Decorridos os prazos previstos nos arts. 642 e 644, sem que tenha sido iniciado o despacho de importação, o depositário fará, em cinco dias, comunicação à unidade da Secretaria da Receita Federal do Brasil com jurisdição sobre o recinto alfandegado, relacionando as mercadorias e mencionando todos os elementos necessários à identificação dos volumes e do veículo transportador (Decreto-Lei no 1.455, de 1976, art. 31, caput).

§ 1o  Feita a comunicação dentro do prazo previsto, a Secretaria da Receita Federal do Brasil, com os recursos provenientes do Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização, efetuará o pagamento, ao depositário, da tarifa de armazenagem devida até a data em que retirar a mercadoria (Decreto-Lei no 1.455, de 1976, art. 31, § 1o).

§ 2o  Caso a comunicação não seja efetuada no prazo estipulado, somente será paga pela Secretaria da Receita Federal do Brasil a armazenagem devida até o término do referido prazo, ainda que a mercadoria venha a ser posteriormente alienada (Decreto-Lei no 1.455, de 1976, art. 31, § 2o).

O FUNDAF, Instituído pelo Decreto-Lei nº 1.437, de 17 de dezembro de 1975, é gerido pela Receita Federal, obedecido o plano de aplicação previamente aprovado pelo Ministério da Fazenda.

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Parte das receitas vinculadas é proveniente dos recursos auferidos nas destinações, mediante leilões realizados pela Receita Federal.

Tais recursos são repassados ao do Tesouro Nacional e posteriormente distribuídos na seguinte ordem: 40% para a seguridade social – Artigo 213, VII do Decreto 3.048 de 06 de maio de 1999 e 60% para o FUNDAF – Artigo 29, § 1º, alínea a do Decreto-Lei nº 1.455 de 07 de abril de 1976.

– Decreto 3.048 de 06 de maio de 1999

Art. 213. Constituem outras receitas da seguridade social:

VII – quarenta por cento do resultado dos leilões dos bens apreendidos pela Secretaria da Receita Federal…

– Decreto-Lei nº 1.455 de 07 de abril de 1976

Art 29. A alienação ou destinação será efetivada da seguinte forma:

1º A partir de 1º de janeiro de 1988, o produto da alienação de que trata este artigo terá a seguinte destinação: (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.411, de 21.1.1988)

a) 60% (sessenta por cento) ao Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização (FUNDAF), instituído pelo Decreto-lei nº 1.437, de 17 de dezembro de 1975; (Incluído pelo Decreto-Lei nº 2.411, de 21.1.1988)

Como se vê, a lei concede aos depositários o direito de receber da união quantias que venham remunerá-los pelos espaços cedidos para abrigar as mercadorias abandonadas e, até mesmo, as apreendidas que, por analogia, por ser uma situação semelhante, podem ser disciplinadas da mesma forma. O problema é que os depositários não conseguem receber as quantias da união, quando tentam.

Por mais que neguem, segundo relatos, muitas vezes os terminais não cobram as quantias devidas na forma como dispõe a lei. Relatos de terminais indicam que existe receio de criar certa indisposição com as autoridades dos respectivos recintos alfandegados.

Porém, mesmo não cobrando de quem os deve, segundo informações, alguns tentam buscar soluções no sentido de receber as quantias de armazenagem cobrando os valores dos transportadores marítimos.

Valendo-se de uma interpretação um tanto quanto conveniente, com base no Artigo 643 do Código Civil, tentam equiparar os transportadores marítimos aos depositantes das mercadorias, ou seja, aos importadores.

Art. 643. O depositante é obrigado a pagar ao depositário as despesas feitas com a coisa, e os prejuízos que do depósito provierem.

Em uma situação normal, ou seja, com as mercadorias liberadas pelo importador: Quem seria cobrado pelas armazenagens e demais despesas? O transportador marítimo? Com certeza não.

O mais grave, é que esses terminais não se limitam a cobrar as quantias. Depois de esvaziados pela Receita Federal, eles retêm forçosamente os equipamentos dos transportadores marítimos afirmando que somente serão liberados após pagamento das armazenagens, com base no Artigo 644 do Código Civil.

Art. 644. O depositário poderá reter o depósito até que se lhe pague a retribuição devida, o líquido valor das despesas, ou dos prejuízos a que se refere o artigo anterior, provando imediatamente esses prejuízos ou essas despesas.

Quando o problema envolve produtos perecíveis, existem registros de que terminais tentaram imputar a responsabilidade do gerenciamento de resíduos ao transportador marítimo, alegado que a previsão legal para tal ato está no Artigo 4º a Resolução CONAMA nº 2, de 22 de agosto de 1991, que dispõe sobre o tratamento a ser dado às cargas deterioradas, contaminadas ou fora de especificações.

Art. 4º Responde solidariamente pela ação de prevenção, controle, tratamento e disposição final dos resíduos gerados pelas cargas mencionadas no art. 1O, o importador, transportador, embarcador ou agente que os represente, salvo previsão específica de responsabilidade, em contrato.

Realmente está previsto, no entanto, não é justo que recaia sobre alguém, que não a união, a responsabilidade pela destinação de resíduos que são frutos de uma enorme demora em sua destinação. Em outras palavras, se perecíveis que apodrecem aguardando destinação fossem devidamente destinados em tempo de consumo, jamais se tornariam resíduos. Destruí-las dá muito mais trabalho e, dependendo da quantidade, é comum que não haja verba pública.

De fato, tentativas de transferir obrigações são provas de que temos questões complexas a serem discutidas e equacioná-las não é tão simples assim.

Já ocorreram muitos casos em que os transportadores marítimos tiveram que arcar com todas as despesas para destruição de mercadorias perecíveis que se deterioraram aguardando destinação.

Em 2004, por exemplo, um transportador marítimo teve que arcar com mais de R$300.000,00 (trezentos mil reais) para promover a destruição de 1.300 toneladas de alho chinês que estavam acondicionados em 50 contêineres reefers 40 pés de sua frota. Além do transportador, o terminal onde estavam armazenados e plugados os contêineres, arcou com mais de R$200.000,00 (duzentos mil reais) em transportes até o local de destruição dos resíduos. Essa operação de destruição ocorreu mais de um ano e meio da descarga das mercadorias. O transportador marítimo precisou de seis meses para finalizar o processo até a efetiva destruição, mesmo com Laudos do Ministério da Agricultura afirmando que as mercadorias estavam impróprias para consumo humano, animal e vegetal.

Em 2005, 200 toneladas de cebolas provenientes da Espanha, acondicionadas em oito contêineres reefers de 40 pés, foram abandonadas pelos seus importadores no porto. Em todos os casos as mercadorias foram nacionalizadas, ou seja, fato que dificultava a aplicação de pena de perdimento. No entanto, quase um ano depois da descarga, as mercadorias se deterioraram ao ponto de saírem larvas dos contêineres, através do líquido que escorria pelas portas, colocando em risco a saúde dos trabalhadores.

O cheiro era terrível e até as tripulações dos navios registravam reclamações junto às autoridades. A Autoridade Portuária ensaiou uma injusta multa ao operador portuário, que nada tinha a ver com o problema.

Então, o transportador marítimo, querendo seus contêineres de volta, entrou no processo administrativo. Foram necessários 90 dias para que as mercadorias fossem destruídas. A demora para desembaraçar esse processo administrativo, segundo informações, foi motivada pelas dificuldades de se encontrar base legal para a aplicação da pena de perdimento. As despesas, mais uma vez, correram por conta do transportador.

Em 2007, um transportador marítimo impetrou Mandado de Segurança requerendo a liberação de 44 contêineres de 20 pés dry Box estufados com farinha de trigo provenientes da Argentina. As mercadorias acondicionadas nas unidades descarregaram em 2001 e 2002, ou seja, mesmo sendo uma mercadoria com relativa rapidez na deterioração, ainda em 2002, poderiam ter sido objeto de leilão ou doação

Sucede que, cinco anos depois de ter abandonado a carga, a justiça chamou o importador ao processo e este, por incrível que pareça, demonstrou interesse na carga, ou melhor, no resíduo. Em resumo, isso fez com que o processo demorasse mais de 06 meses.

Também não são raros os casos em que os terminais arcaram com todas as despesas para destruir mercadorias, e essas quantias devidas pelas movimentações, armazenagem, energia elétrica para alimentar reefers, transportes e destruição, não são recuperadas junto aos importadores, tampouco do FUNDAF.

Quando há um abandono de mercadoria sem registro da importação, principalmente os casos em que os fretes são contratados no exterior, dificilmente se consegue comprovar o vínculo de uma mercadoria com o consignatário do Bill of Lading.

Não é fácil promover a destinação de resíduos. Depois de destinados, os resíduos devem ser transportados por empresas que possuam autorização dos órgãos ambientais e devem ser colocados em aterros sanitários licenciados. Uma verdadeira fortuna.

Os transportadores marítimos, por possuírem filiais ou agentes nos locais de origem, existe a opção de recuperar os valores devidos pela retenção de seus contêineres junto aos embarcadores. Porém, aos terminais, esta opção sai muito cara, embora seja possível.

Armazéns lotados de cargas não destinadas, acúmulo de milhares de contêineres cheios aguardando a lenta conclusão de processos de perdimento e destinação são realidades enfrentadas pelos nossos terminais e pelos seus usuários.

O problema é que além de prejudicar toda uma logística de áreas cobertas, existem também prejuízos à logística de pátio. Não é difícil encontrarmos terminais portuários com 200, 500 contêineres cheios, cujos conteúdos aguardam destinação.

A crise econômica mundial está contribuindo ainda mais para elevação do volume de mercadorias em perdimento. Muitos importadores, pegos de surpresa com rápida e grande alta do dólar e com a escassez das ofertas de crédito, deixaram suas mercadorias para trás. Embora não se possa ter uma dimensão exata do problema, sabe-se que é muito grave.

Mesmo com todos esses problemas, é injusto colocar toda responsabilidade sobre os fiscais das aduanas. Eles, com um quadro insuficiente para atender a demanda, na grande maioria das vazes, fazem o que podem para destinar os produtos.

O grande X da questão é a legislação, que precisa passar por modificações, pois, da forma que se apresenta, determina um ritmo lento aos processos, primando pelo princípio da retenção e não pelo da liberação.

Em um estado da federação, por exemplo, a Receita Federal construiu dois bons armazéns para guardar produtos objetos de abandono e apreensão. De nada adiantou, pois em pouco tempo estavam lotados de mercadorias.

Os contêineres são liberados, porém seus conteúdos não são destinados. Isso demonstra que não adianta construir armazéns se as mercadorias não são destinadas em um ritmo satisfatório.

Nesse mesmo estado, no ano 2007, a Receita Federal de um dos Recintos Alfandegados, por conta de diversas liminares obtidas pelos transportadores marítimos no sentido de que a autoridade liberasse seus contêineres, celebrou um acordo com o transportador para que mais de 100 contêineres que ali estavam retidos fossem liberados gradativamente. Foi feito um cronograma na certeza de que leilões seriam realizados.

No Início, o acordo foi cumprido, pelo menos enquanto o depositário espremia seu armazém para conseguir espaço. Resultado: Os leilões não aconteceram e os contêineres não foram liberados conforme o acordo. Os Leilões ainda são muito burocráticos e sua organização é extremamente trabalhosa e morosa.

Quem acompanha de perto um processo de aplicação de pena de perdimento e destinação fica estarrecido com o quão contraproducente é a coisa.

Segundo relatos de terminais, ocorreram casos em que para se fazer uma simples doação a uma instituição de caridade, eles precisam movimentar mais de 10 contêineres, fazer contagem, etc. precisam mobilizar diversos funcionários e equipamentos.

A Receita Federal também precisa de um enorme contingente e o trabalho também é massacrante para fiscalização.

A legislação é complicada e a demora já pode ser notada no tempo que é concedido ao importador para iniciar o desembaraço aduaneiro. Como regra, um importador necessita realmente de 90 dias para dar início ao desembaraço de uma mercadoria sem que exista algum tipo de intervenção da autoridade? A Legislação é um tema que todos os envolvidos em comércio exterior devem discutir.

Especialistas afirmam que 90 dias é o prazo necessário para o posicionamento dos contêineres e alocação de despesas dos importadores. O problema, é que enquanto os contêineres estão cheios no pátio aguardando desembaraço das mercadorias, correm duas altas despesas em paralelo – armazenagem e demurrages. Não é difícil, que no final das contas, determinados importadores verifiquem prejuízos e abandonem suas mercadorias, ou que deixem de pagar algumas despesas.

Da data notificação do auto de infração, o importador tem 20 dias para apresentar sua defesa e, se não apresentar impugnação, a aduana tem 15 dias para remessa do processo a julgamento. Porém, a Lei dá às autoridades mais prazo, por tempo indeterminado, se forem verificadas necessidades de diligências ou perícias.

Dificilmente um processo desses é fechado em menos de 150 dias, se tudo transcorrer dentro da normalidade.

– Decreto-Lei 1.455 de 7 de abril de 1976

Art 23. Consideram-se dano ao Erário as infrações relativas às mercadorias:

II – importadas e que forem consideradas abandonadas pelo decurso do prazo de permanência em recintos alfandegados nas seguintes condições:

a) 90 (noventa) dias após a descarga, sem que tenha sido iniciado o seu despacho; ou

b) 60 (sessenta) dias da data da interrupção do despacho por ação ou omissão do importador ou seu representante; ou

c) 60 (sessenta) dias da data da notificação a que se refere o artigo 56 do Decreto-Iei número 37, de 18 de novembro de 1966, nos casos previstos no artigo 55 do mesmo Decreto-lei; ou

d) 45 (quarenta e cinco) dias após esgotar-se o prazo fixado para permanência em entreposto aduaneiro ou recinto alfandegado situado na zona secundária.

IV – enquadradas nas hipóteses previstas nas alíneas ” a ” e ” b ” do parágrafo único do artigo 104 e nos incisos I a XIX do artigo 105, do Decreto-lei número 37, de 18 de novembro de 1966.

V – estrangeiras ou nacionais, na importação ou na exportação, na hipótese de ocultação do sujeito passivo, do real vendedor, comprador ou de responsável pela operação, mediante fraude ou simulação, inclusive a interposição fraudulenta de terceiros.(Incluído pela Lei nº 10.637, de 30.12.2002)

§ 1o O dano ao erário decorrente das infrações previstas no caput deste artigo será punido com a pena de perdimento das mercadorias. (Incluído pela Lei nº 10.637, de 30.12.2002)

§ 2o Presume-se interposição fraudulenta na operação de comércio exterior a não-comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados. (Incluído pela Lei nº 10.637, de 30.12.2002)

§ 3o A pena prevista no § 1o converte-se em multa equivalente ao valor aduaneiro da mercadoria que não seja localizada ou que tenha sido consumida.(Incluído pela Lei nº 10.637, de 30.12.2002)

Parágrafo único. O dano ao Erário decorrente das infrações previstas no ” caput ” deste artigo, será punido com a pena de perdimento das mercadorias.  (Suprimido com a nova Redação da Lei nº 10.637,2002)

Art 24. Consideram-se igualmente dano ao Erário, punido com a pena prevista no parágrafo único do artigo 23, as infrações definidas nos incisos I a VI do artigo 104 do Decreto-lei numero 37, de 18 de novembro de 1966.

Art 25. As mercadorias nas condições dos artigos 23 e 24 serão guardadas em nome e ordem do Ministro da Fazenda, como medida acautelatória dos interesses da Fazenda Nacional.

Art 26. As mercadorias de importação proibida na forma da legislação específica em vigor serão apreendidas, liminarmente, em nome e ordem do Ministro da Fazenda.

Parágrafo único. Independentemente do curso de processo criminal, as mercadorias a que se refere este artigo poderão ser alienadas ou destinadas na forma deste Decreto-lei.

Art 27. As infrações mencionadas nos artigos 23, 24 e 26 serão apuradas através de processo fiscal, cuja peça inicial será o auto de infração acompanhado de termo de apreensão, e, se for o caso, de termo de guarda.

§ 1º Feita a intimação, pessoal ou por edital, a não apresentação de impugnação no prazo de 20 (vinte) dias implica em revelia.

§ 2º Apresentada a impugnação, a autoridade preparadora terá o prazo de 15 (quinze) dias para remessa do processo a julgamento.

§ 3º O prazo mencionado no parágrafo anterior poderá ser prorrogado quando houver necessidade de diligências ou perícias, devendo a autoridade preparadora fazer comunicação justificada do fato ao Secretário da Receita Federal.

§ 4º Após o preparo, o processo será encaminhado ao Secretário da Receita Federal que o submeterá a decisão do Ministro da Fazenda, em instância única.

Art 28. Compete ao Ministro da Fazenda autorizar a alienação ou destinação das mercadorias objeto da pena de perdimento.

Alguns Inspetores de alfândegas, com o raciocínio correto de desafogar seus fiscais e técnicos, publicaram Ordens de Serviço no sentido de que os interessados nas dezunitações de contêineres façam o requerimento diretamente aos depositários. Basicamente, as Ordens de Serviço trazem o seguinte texto:

Art. 1º A desunitização de mercadorias que tenham sido objeto de apreensão, mediante a lavratura de Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal, independe de prévia autorização desta Alfândega, podendo ser solicitada diretamente ao recinto alfandegado depositário, o qual deverá observar as condições de segurança necessárias à garantia da integridade da carga e atender, conforme a natureza do produto, às determinações emanadas dos competentes órgãos públicos de controle.

Porém, quando as desunitizações são solicitadas aos depositários, geralmente, os requerentes recebem duas respostas: ou as mercadorias não se enquadram com as Ordens de Serviço, em alguns casos, mesmo depois de transcorridos mais de 200 dias da descarga, ou não existe espaço para armazenamento

E quando as mercadorias são apreendidas? Existem relatos de empresas que estavam em processos investigatórios de fraude e ficaram impossibilitadas de liberar mercadorias, que já estavam no porto ou embarcadas. Consideradas culpadas até que se prove o contrário?

Trata-se de uma legislação difícil de ser modificada, onde determinados aspectos se esbarrarão, até mesmo, em questões constitucionais. Portanto, é com essa legislação que devemos trabalhar e é sobre ela que devemos buscar alternativas.

Em meio a tantos entraves legais, existem possibilidades de se diminuir a dependência da aduana, retirando muitos casos do hall das mercadorias que serão objetos de processos de perdimento e destinação.

Armadores e depositários podem trocar mais informações sobre as mercadorias, atuando sobre os importadores, buscando vínculos deles com as mercadorias, antes ou depois do início do processo de perdimento, para que estes assumam suas responsabilidades.

Dois casos reais e iguais, com mercadorias de um mesmo importador, porém, em embarques com diferentes armadores, chama atenção e vale ser trazido ao tema em tela.

Duas partidas de alhos, provenientes da China, acondicionados em 08 contêineres reefers 40 pés. Dois transportes cobertos com 02 bills of lading com 04 contêineres cada. Nos dois casos, o importador iniciou o desembaraço aduaneiro das mercadorias e, por motivo desconhecido, abandonou-as. Com o passar do tempo, acabaram por se deteriorar. Os dois armadores tomaram providência para recuperar suas unidades.

Um dos transportadores marítimos investigou o processo de importação junto ao terminal depositário e descobriu que o importador tinha dado início a importação. Valendo-se dessa informação, atrelou o importador às mercadorias e ajuizou uma ação ordinária para cobrança de demurage, com pedido de tutela antecipada (liminar) para que o importador devolvesse as suas 04 unidades.

O Juiz determinou a devolução das unidades, a destruição das mercadorias, fixando prazo sob pena de multa diária. Ou seja, em menos de 03 meses reouve seus equipamentos e, dificilmente, deixará de receber as demurrages pelo tempo que seus contêineres ficaram retidos.

O outro transportador marítimo não se preocupou em investigar o processo de importação e somente olhou a Receita Federal como responsável. Então, impetrou Mandado de Segurança (medida contra a autoridade) para liberar seus equipamentos.

Como resultado, o terminal viu-se, a pedido das autoridades, com a incumbência de arcar com todos os custos da operação para destruição das mercadorias. O transportador marítimo, por não ter se preocupado em investigar o caso, poderia ter visto o seu pedido de liminar ser negado pela justiça, além de ter ficado impossibilitado de recuperar as demurrages pelo período que as unidades ficaram retidas.

Para os casos de importações cujos desembaraços aduaneiros não foram iniciados e estejam fora de processo de perdimento, os armadores podem atuar junto aos exportadores no sentido de obrigá-los a retornar com as mercadorias, que muitas vezes sequer foram pagas na sua totalidade. Isso é possível.

Medidas pró-ativas não solucionarão a maior parte do problema. Porém, um percentual considerável, que representa milhares de contêineres, metros cúbicos ou toneladas de mercadorias, pode seguir por outros caminhos, diferentes dos longos e burocráticos processos de perdimento e destinação. Trabalhar preventivamente é fundamental e viável.

O mais importante é evitar que os prejuízos financeiros de depositários e armadores venham, de alguma forma, ser repassados aos bons usuários desses serviços, que representam a imensa maioria das empresas.

André de Seixas

Diretor Comercial da IRO-LOG LOGISTICS & TRADING e da TRANSBRANDÃO TRANSPORTES E LOGISTICA LTDA; especializado nos ramos de transporte rodoviário e marítimo, logística, armazenagem, logística portuária e comércio exterior; Comissário de Avarias e regulador de sinistros; Websites: https://www.irolog.com.br e https://www.transbrandao.com.br

Analista de Importação Profissional

2 comentários

  • Otimo o artigo! Sou academica do curso de direito e no momento estou finalizando minha monografia sobre a Inconstitucionalidade da pena de perdimento, e tal artigo foi de grande valia! Obrigada!

  • Muito bom artigo, a propósito tive um perdimento de mercadorias, cuja mercadoria foi á leilão em uma semana, que agilidade da Receita Federal de Itajai, tomei ciencia do perdimento dia 01abril2013, no dia 09abril2013 a mercadoria já tinha sido leiloada e arrematada..!!!! A publicação em edital ocorreu uma semana antes do leilão !! pode!!
    Situação atual, estou entrando com uma Ação Ordinária, por danos materiais.
    Abraço,
    Vlamir Seixas