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Vitória dos importadores

Após anos de embate e calorosas discussões com o Fisco, enfim a Justiça brasileira pacificou o entendimento que, há muito tempo, vem sendo defendido por nós, de que operações de revenda de mercadorias importadas, que não sofram processo de industrialização, devem ser isentas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).

Com um placar de cinco votos a três, os Ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), durante julgamento ocorrido no dia 11/06/14, consideraram que essa cobrança é totalmente abusiva. Ou em outras palavras, ao uniformizar a jurisprudência, o STJ acaba com a controvérsia e conclui que a cobrança do IPI na revenda é ilegal.

Assim, todo importador que revenda mercadorias da mesma maneira que as importa, sem realizar sobre elas qualquer processo de industrialização, só deve recolher o IPI no momento do desembaraço aduaneiro, e isso é muito importante para o importador, pois desonera, consideravelmente, a sua atividade.

Para entendermos a situação, é preciso analisar, entre outros aspectos, a regra contida no art. 46 do Código Tributário Nacional, que prevê as seguintes hipóteses para cobrança de IPI:

(a) o desembaraço aduaneiro;

(b) a saída da mercadoria do estabelecimento; e

(c) a arrematação da mercadoria apreendida ou abandonada.

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O problema é que a Receita Federal insistia em cobrar o referido imposto de forma cumulativa em mais de uma dessas hipóteses, ou seja, tanto no desembaraço, quanto na saída da mercadoria do estabelecimento, mesmo quando não havia qualquer processo de industrialização, o que, a nosso ver, configurava evidente bitributação. A bitributação, aliás, não se configura aqui pela cobrança do IPI em dois momentos (desembaraço e saída do estabelecimento), como muitos supõem, mas pela cobrança do IPI na revenda da mercadoria pura e simples, pois, nesse caso, a União cobraria o IPI, e o Estado cobraria o ICMS pela simples circulação da mercadoria, o que é juridicamente inaceitável.

Como se observa na legislação, no âmbito do IPI, o referencial da operação circulatória diz respeito à primeira operação (importação), àquela que coloca o produto industrializado no exterior em circulação e que dimensiona o valor a recolher.

Nitidamente, não se confundem, tampouco se cumulam as hipóteses de incidência do IPI: para o produto industrializado no exterior, o IPI incide no desembaraço aduaneiro, e, para o produzido no Brasil, o fato gerador ocorre na saída do estabelecimento industrial.

Nesse sentido, portanto, deve o IPI ser considerado como, em regra, imposto unifásico, incidindo uma única vez no momento da importação da mercadoria do exterior.

Conceitualmente, a hipótese de incidência do IPI pressupõe a prática de algum processo de industrialização, e não a simples saída do produto importado do estabelecimento do importador. O fato de o legislador ter escolhido o momento da saída do produto para a incidência da tributação é apenas para dar operabilidade na aferição do valor e cobrança do tributo, mas é óbvio que o fato gerador do IPI é a industrialização e não a circulação do produto. Assim, se a industrialização não ocorrer, estaríamos diante de uma simples hipótese de circulação de mercadoria, e o imposto que deverá incidir será o ICMS.

O IPI incide sobre a circulação inicial da fábrica, ou, nesse caso, da importação, mas não pode, em nenhum momento, ser assemelhado ao ICMS que percorre toda a cadeia circulatória iniciada na fábrica, e concluída no varejo. Até porque o próprio importador, ao vender sua mercadoria, também é contribuinte do ICMS.

Trocando em miúdos, o sistema tributário permite a incidência do IPI nas mercadorias importadas para garantir isonomia na entrada do bem no território nacional, bem como garantir competitividade por parte dos produtores nacionais, contudo a cobrança novamente de IPI na revenda do produto só poderá ocorrer se este tiver sofrido algum processo de industrialização.

No momento em que o importador realiza a revenda desse bem, ele está dando circulação à mercadoria, o que já é objeto de tributação pelos Estados, quando da cobrança do ICMS. Por isso, é que a pretensão da União de cobrar o IPI nesse caso configuraria bitributação, o que é vedado pelo ordenamento jurídico brasileiro. Cabe ao IPI referenciar-se ao processo produtivo e à primeira operação circulatória; cabe ao ICMS referenciar-se não só à primeira circulação, mas às demais operações que impulsionam a mercadoria até o consumidor.

Portanto, totalmente acertada a decisão da Justiça brasileira, que garantiu aos importadores a isenção do IPI na hipótese de revenda da mercadoria importada que não sofre industrialização, cabe ao judiciário fazer justiça e não fazer receita para um Estado que mal administra seus recursos.

Com essa decisão, que pacifica o entendimento da questão no STJ, fica aberta uma porta para os contribuintes buscarem recuperar o que pagaram indevidamente nos últimos cinco anos, anteriores à propositura da ação, bem como suspenderem definitivamente esse tipo de recolhimento abusivo. Contudo, por força do disposto no art. 19 da Lei no 10.522/02, sugerimos aos nossos clientes que não tomem o crédito deliberadamente, garantindo-lhes o direito com a obtenção de ordens judiciais indiscutíveis pelo Fisco.

Colaborador: Luiz Raphael Vieira Angelo – Advogado Tributarista, Especialista em Finanças Corporativas pela UNICAMP,  Instrutor nos cursos do Grupo Aduaneiras/Cenofisco/Lex, Autor de obras e artigos ligados às áreas jurídica e fiscal.

Daniel Polydoro

Advogado e consultor jurídico nas áreas de direito tributário e aduaneiro, Pós-graduado em Gestão de Comércio Exterior, Professor nas Especializações em Comércio Exterior da UNICAMP e da FIA/USP, Instrutor nos cursos da Aduaneiras há mais de 15 anos. Diretor da Polydoro Consulting – www.polydoroconsulting.com.

Analista de Importação Profissional

1 comentário

  • De fato, felizmente, desde 11.06.2014, os ministros do STJ passaram a uniformizar todos os novos julgados da 1ª e 2ª Turmas voltando p/ aquela que sempre foi, por 10 anos, a posição da Corte (depois de um lapso de 9 meses e 8 dias) “para assentar que não há incidência do IPI na revenda de bem importado já tributado pelo mesmo imposto no desembaraço aduaneiro”.

    Isto é respeitar e (re)prestigiar o princípio da isonomia tributária. Vale muito a pena buscar o
    reconhecimento do direito o quanto antes, observadas algumas cautelas.

    Só se verão neste ótimo cenário – inclusive quanto a recuperação de tudo que foi pago nos últimos 5 anos atualizado pela Selic – aqueles que, individualmente, muito bem pleitearem e tiverem êxito na ação.

    O advogado tributarista e autor original desta esplêndida e corajosa causa iniciada por ele há mais de 16 anos que pôs fim a cobrança do IPI sobre as saídas de bens importados não
    modificados, o único profissional c/ 20 ações já transitadas em julgado (tanto no STJ quanto em 4 dos 5 TRFs), as primeiras há mais de 12 anos, e o 1º e original pedido formulado ainda no final dos anos 90, muitos não sabem quem foi.

    Não é nenhum dos citados na matéria do Valor de 13/Jun/14 (STJ isenta do IPI revenda de mercadoria por importador), tampouco um dos advogados que escreveram artigos ou deram entrevista pela mídia afora.

    Quem não gostaria de conhecer em detalhes a história desta incrível lide narrada pelo próprio autor? Vale a pena, é uma aula. Quem quiser manter um encontro, é só me escrever, será uma satisfação apresentá-los.

    Um abraço,
    Frederico Rigobello
    GL | Tax Advisor > for import operations
    frederico.rigobello@GLadvisor.com.br