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Apagão da responsabilidade

 É comum no Brasil o uso do termo apagão. É usado para quase tudo. Nos últimos anos o termo apagão logístico tem dominado a imprensa quando se quer falar dos problemas logísticos e da péssima infra-estrutura brasileira. Confessamos que nunca gostamos do termo, e não costumamos utilizá-lo. Mas, estamos nos rendendo ao termo, em especial para criarmos um novo, dentre tantos, que é o apagão da responsabilidade.

 E é isso que vem ocorrendo com o nosso Brasil. Que foi tomado de uma irresponsabilidade ímpar nas últimas décadas. Principalmente nestas duas últimas.

 O dito apagão logístico é uma crônica de desgraça anunciada há muitos anos. O que mostra que o apagão da responsabilidade parece voluntário.

A agropecuária brasileira vem dando demonstrações de inequívoca competência. Mas do setor privado, e não do governo, peça que atrapalha o jogo privado. A produção de grãos vem crescendo sistemática e continuamente no país. A exportação de qualquer deles é crescente e a liderança mundial não é discutida, sendo irreversível.

Mas, diante de um futuro promissor anunciado, pelo menos nessa área, o que o governo tem feito é deplorável. O gol contra é contínuo, destruindo os esforços do ataque. Por mais gols que este marque, nada adianta, a defesa aumenta seus gols contra.

Nossas estradas estão em estado de calamidade. Além de quase impraticáveis para o transporte, continuamos com os nossos irrisórios, 1,5 milhão de quilômetros apenas. E com somente 11% da malha asfaltada. O que se vê nos noticiários é de chorar. Isso porque somos um país rodoviarista. Com 60% do transporte de carga feito pelas rodovias. 70% da soja. 80% dos produtos agrícolas. Com essa péssima matriz de transportes, teríamos que dar atenção às estradas. No mínimo.

Lá nas terras do norte da América, o Tio Sam, que não é rodoviarista, tem tudo bem diferente disso. Lá, apenas 32% da carga anda nas rodovias. A matriz de transporte é bem diferente. Lá tudo é racional. Mesmo não sendo rodoviarista, eles têm 6,4 milhões de quilômetros de estradas, sendo 64% asfaltadas. E boas. Responsabilidade é isso. Não importa ser isso ou aquilo, tem que ser adequado.

 Os portos, também importantes, estão deixando a desejar. Estamos classificados, pelo Fórum Econômico Mundial, em 130º lugar em 2011 e em 135º em 2012.

 Nossa agropecuária, que é das poucas coisas que funcionam – ainda bem que o Estado não tem fazendas produtoras de nada – não tem a atenção devida. Nossa produção de grãos cresce, e a atenção ao setor diminui.

 Não importa quanto se produza, o déficit é enorme. Nunca, pelo que nos lembramos, tivemos pontos de armazenagens suficientes. E nem passando perto das necessidades. Está bem que somos suficientemente idosos para esquecermos tudo (sic). É um problema crônico. E que vai se agravando ano após ano.

As estradas, da mesma forma, correm lado a lado com a armazenagem. Tudo se reduzindo a pó. A produção cresce, e as vias de escoamento se reduzem e deterioram a olhos vistos.

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Para quem não está familiarizado com o que a agropecuária representa, vamos a alguns dados do comércio exterior brasileiro. Em especial para o governo, que parece não ter a menor ideia sobre a sua representatividade. Vamos apresentá-los a ele. Sabemos que números e valores são chatos de ler e ver, mas, nesse caso são necessários. São imprescindíveis neste artigo para mostrar as mazelas brasileiras com sua galinha dos ovos de ouro. Ops, sua terra dos grãos de ouro.

Em 2001 a balança comercial brasileira apresentou superávit de 2,7 bilhões de dólares. O agronegócio teve superávit de 16 bilhões. Dispensa comentários. Em 2002 o geral foi de 13,2 e o agro de 20. Em 2003 o geral foi 24,9 e o agro 26. Em 2004 um geral de 33,9 e o agro de 34. Em 2005 um geral de 44,9 e agro de 38,4. Em 2006 o geral foi de 46,5 com o agro em 42,7. No ano de 2007 um geral de 40 e agro de 49,7. Em 2008 um geral de 24,9 e agro de 60. 2010 com geral de 20,3 e agro de 63. Em 2011 nosso geral foi de 29,7 com o agro em 77,5. Em 2012 a balança comercial gerou superávit de 19,4 bilhões e o agro 79 bilhões de dólares. Lamentamos pular 2009, que só temos o superávit geral de 25,3 bilhões. Não temos o agro, que podemos imaginar como algo perto de 60 bilhões considerando 2008 e 2010.

 Analisados os números, e visto que nada é recente, é injustificável o que já vinha ocorrendo com o porto de Paranaguá por muitos anos, com filas médias de 70 quilômetros, entre o porto e Curitiba.

 Menos justificável ainda é o que vem ocorrendo com o porto de Santos, com filas de 20-25 quilômetros, e interrupção de uma importante rodovia. Que é uma rodovia de lazer. O que significa que os brasileiros estão sendo, pelo mínimo, duplamente punidos pelo apagão da responsabilidade do governo.

 E, para finalizarmos, nosso chavão “Acorda Brasil”, que muitos países já acordaram. E vamos retrocedendo.

Samir Keedi

Professor de MBA, autor de vários livros em comércio exterior, transporte e logística, tradutor do Incoterms 2000,membro da CCI-Paris na revisão do Incoterms® 2010.

Analista de Importação Profissional

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