Trata-se de um tema extremamente técnico, que envolve grandes disputas jurídicas no direito marítimo, porquanto envolve interesses econômicos de grande monta. Embora seja compreendido, por boa parte dos integrantes da área marítima, como um simples contrato de seguro, o seguro de cascos marítimos e de máquinas possui muitas peculiaridades que merecem a devida atenção.
A navegação tem sido um dos mais importantes modais utilizados na mercancia de mercadorias ao longo da história, e por essa razão, tem merecido o amparo do seguro desde 1350 nas suas várias modalidades aplicadas ao transporte marítimo, sendo o seguro marítimo a mais antiga delas. Registra-se, a título de exemplo, que Portugal possuía uma lei em 1370 (Reinado de D. Fernando) contendo disposições sobre uma mútua para seguros de embarcações de lotação superior a certa tonelagem. Dentre as diversas modalidades de seguros com escopo na área marítima, merece especial destaque o seguro de cascos marítimos e de máquinas (da própria embarcação), por meio do qual uma seguradora se propõe a assumir, mediante aceitação do risco e recebimento do respectivo prêmio, os prejuízos experimentados pelo segurado (ou beneficiário) nos limites da garantia estabelecidos na apólice, em decorrência de acidentes ocorridos com a embarcação durante o processo de construção, operação, reparo, desmonte ou paralisação daquela.
A título de curiosidade, a doutrina européia (v. g., COSTA. Adelino Cecílio da. Direito Marítimo. Seguro Marítimo. Sua Problemática Actual. Lisboa, Petrony, 1988, p. 209.), uma das precursoras dos grandes estudos marítimos e securitários, efetua uma classificação tripartite do seguro marítimo de cascos e de máquinas separando-o em seguro de cascos a nado, seguro de interesses ligados a cascos e seguro de cascos em construção ou reparação. Logo, o seguro de cascos marítimos e de máquinas pode ser contratado durante a paralisação da embarcação em qualquer ancoradouro ou porto; durante as operações em qualquer via de navegação (mar, rio, lago, etc.); e durante a construção, desmonte ou reparo da embarcação em estaleiros, diques ou rampas. Em todos os casos, o seguro de cascos marítimos e de máquinas é contratado pelo prazo máximo de 1 (um) ano, exceto se a embarcação estiver em construção, quando o prazo será equivalente ao da obra efetuada na embarcação.
O seguro de cascos marítimos e de máquinas é adotado para a proteção dos veículos que realizam suas operações no meio aquático, diferenciando-se do seguro para embarcações de esporte e recreio. Enquanto o seguro de cascos marítimos e de máquinas é voltado para a cobertura de sinistros ocorridos com navios destinados às atividades comerciais com área de navegação no mar aberto (longo curso, cabotagem e apoio marítimo), no interior ou no apoio portuário – serviço de passageiros, passageiros e cargas, apenas carga, rebocador/empurrador, pesca ou outra atividade ou serviço -, o seguro para embarcações de esporte e recreio tem por escopo de cobertura os sinistros ocorridos com embarcações (incluídas as embarcações miúdas) que tem por finalidade a prática de esportes ou o lazer, como o jetski e a moto aquática, com área de navegação, em geral, realizada no mar aberto ou no interior. A classificação das embarcações foi definida pelo Decreto nº 2.596, de 18 de maio de 1998 (regulamenta a Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário em Águas sob Jurisdição Nacional – Lei nº 9.537, de 11 de dezembro de 1997) em seu artigo 3º.
Podem constar no contrato de seguro de cascos marítimos e de máquinas como segurado, estipulante ou beneficiário, aquele que comprove interesse sobre a embarcação coberta ou possa vir a sofrer algum prejuízo em decorrência de dano, detenção ou perda havido sobre aquela. Além disso, também é admitido aquele que esteja sujeito à possibilidade de imputação de responsabilidade por efeito de acidente nas vias aquáticas. Podem ser citados como exemplos mais comuns de segurados, estipulantes ou beneficiários: os armadores de navios (empresas – fretadores e afretadores), os proprietários de embarcações de porte médio, pequeno ou miúdo, os construtores e os reparadores, as associações de classe, o comandante e a tripulação, etc.
O seguro de cascos marítimos e de máquinas é considerado um seguro submetido ao sistema de riscos denominado all risk, ou seja, o segurador é responsável por todo resultado ou efeito decorrente do acidente aquaviário, desde que observados os riscos expressamente excluídos do contrato de seguro celebrado. Este sistema se contrapõe ao sistema named risks (também conhecido como named perils), em que apenas os riscos previstos no contrato de seguro estarão cobertos, ao contrário do all risk em que apenas os riscos excluídos expressamente não serão cobertos pelo segurador. Neste sentido, pode-se dizer que o contrato de seguro de cascos marítimos e de máquinas, em geral, presta cobertura sobre as perdas e os danos ocorridos à embarcação, ao seu casco, ao seu maquinário (incluídos todos os aparelhos usados na navegação), às suas instalações, às suas provisões e aos seus suprimentos, entre outros que tenham relação com o interesse segurado, observadas as regras dos artigos 689 e 690, do Código Comercial Brasileiro (Lei nº 556, de 25 de junho de 1850):
Art. 689 – Pode segurar-se o navio, seu frete e fazendas na mesma apólice, mas neste caso há de determinar-se o valor de cada objeto distintamente; faltando esta especificação, o seguro ficará reduzido ao objeto definido na apólice somente.
Art. 690 – Declarando-se genericamente na apólice, que se segura o navio sem outra alguma especificação, entende-se que o seguro compreende o casco e todos os pertences da embarcação, aprestos, aparelhos, mastreação e velame, lanchas, escaleres, botes, utensílios e vitualhas ou provisões; mas em nenhum caso os fretes nem o carregamento, ainda que este seja por conta do capitão, dono, ou armador do navio.
Os principais tipos de riscos capazes de provocar prejuízos cobertos pelo seguro de casco marítimo e de máquinas são os inerentes aos fatos praticados ou provocados pela força humana (como abalroação, arribada, varrição, motim a bordo, negligência, etc.), pela fortuna do mar, incluídos os casos fortuitos e de força maior (como tempestades, encalhes, raios, maremotos, etc.), e pelos fatos que podem existir independentemente da ocorrência dos dois anteriores, como, por exemplo, o incêndio e a explosão. Existe a possibilidade de inclusão de riscos com ressalvas, retratando outras perdas e danos além das citadas acima, tais como: contato com aeronave, foguete ou míssil; pane ou acidente com instalações ou reatores nucleares a bordo ou fora da embarcação; negligência do capitão ou de oficiais; etc. Nos casos de danos ocorridos aos equipamentos da embarcação atribuídos à negligência do capitão, de oficiais, do prático ou dos tripulantes, o segurado poderá ser obrigado a participar com o equivalente a 10% (dez por cento) do total da perda ou dano, salvo se houver sido contratada a Cláusula de Dispensa de Participação do Segurado em caso de Negligência.
Já os riscos expressamente excluídos são aqueles prejuízos causados por situações, fatos ou operações que não receberão a cobertura por um contrato de seguro de cascos marítimos ou de máquinas. Para facilitar a visualização, é apresentado um rol de alguns daqueles riscos que excluirão a obrigação de indenizar do segurador no contrato de seguros em análise, sem prejuízo de outros que poderão ser excluídos:
1) Mudança de propriedade, posse, controle, situação de classe ou bandeira (em razão de a experiência do operador ser uma das mais importantes causas para a subscrição ou não do risco);
2) Utilização da embarcação para serviços diferentes do previsto na apólice de seguros (para resguardar o segurador em caso de ter que pagar indenização por dano oriundo da prática de outro serviço não previsto na apólice);
3) Falta de condições de navegabilidade (faz com que o segurado realize as frequentes vistorias exigidas pela lei sobre a sua embarcação de modo a mantê-la em condições de navegabilidade, pois tal risco não é coberto pelas seguradoras);
4) Operações ilícitas, como contrabando e tráfico de entorpecentes (não podem ser cobertas pelo segurador por serem contrárias ao ordenamento jurídico e à ordem pública);
5) Desvio de rota (salvo quando for apresentada uma justa causa pelo segurado, como uma manobra por medida de segurança ou para prestar assistência a outra embarcação que esteja em situação de perigo. Em determinados casos, a mudança de rota não influenciará a cobertura, desde que alcance o destino final previsto no contrato de seguro, e esta situação tenha sido aceita pelo segurador);
6) Poluição (a princípio, não estão cobertos os danos causados por poluição proveniente da embarcação, mas poderão ser incluídos em uma cobertura especial, caso a seguradora aceite este risco).
É importante ressaltar que qualquer alteração pelo segurado nas condições contratadas (especificação da carga, rota, etc.), deve ser comunicada imediatamente à respectiva seguradora, sob pena de não ser mantida a cobertura prevista no contrato. No mesmo sentido, para que a cobertura seja mantida nos casos de alteração ou descumprimento do contrato de seguro de cascos marítimos e de máquinas, o segurado deverá anuir com as modificações propostas para a nova cobertura, bem como com o valor do prêmio adicional, se for o caso. Esta hipótese não se aplicará aos casos em que o segurado der destinação ilícita à embarcação, quando então, perderá o direito à cobertura contratada. Além disso, as restrições impostas aos riscos cobertos também devem estar expressamente previstas na apólice, pois do contrário, o segurador poderá se sujeitar ao pagamento da indenização prevista em relação à restrição não descrita de forma expressa no contrato de seguro de cascos marítimos e de máquinas, como entende o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ), ipsis litteris:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. CONTRATO DE SEGURO. EMBARCAÇÃO. EFEITOS LIBERATÓRIOS DA QUITAÇÃO. INOCORRÊNCIA. RISCOS EXCLUÍDOS. RECUSA INJUSTIFICADA DA SEGURADORA ANTE OS TERMOS DA APÓLICE. VERBA DE SUCUMBÊNCIA. ADEQUAÇÃO AOS PARÂMETROS CONSTANTES NO ELENCO DO ART. 20, § 3º, DO CPC. Em sede de contrato de seguro, o recibo de quitação, passado de foram geral, mas relativo à obtenção de parte do direito legalmente assegurado, não traduz renúncia a este direito e, muito menos, extinção da obrigação. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça a afastar a tese de violação do art. 939 do Cód. Civil de 1916. Ao estipular na apólice de seguro cobertas as eventuais avarias nos motores de embarcação, não se afigura justificada a recusa da seguradora ao pagamento de parcela substancial da indenização, ao argumento de que a referida possui embarcação com dois motores e, ocorrendo sinistro em apenas um deles, os riscos deveriam ser rateados em igual proporção. Restrição que não se lê e não se infere da apólice, razão pela qual incensurável sua condenação ao pagamento da diferença ainda devida ao segurado. Verba de sucumbência, contudo, que deve ser condizente com a complexidade da causa e os demais parâmetros elencados no art. 20, § 3º, do Cód. de Processo Civil. Sentença retocada para redução da citada verba ao montante correspondente a 10% (dez por cento) do valor da condenação imposta à seguradora. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (Processo nº 2005.001.40924 – APELACAO – 1ª Ementa – DES. JOSÉ C. FIGUEIREDO – Julgamento: 08/02/2006 – DECIMA PRIMEIRA CAMARA CIVEL) (Grifo Nosso)
Da mesma forma, o segurado deve avisar imediatamente ao segurador sobre qualquer sinistro ocorrido com o bem segurado, assim como zelar pela manutenção do casco, das máquinas, dos equipamentos, das instalações da embarcação durante todo o período em que estiver protegida pelo seguro, sob pena de recusa no pagamento da indenização por parte da seguradora em caso de sinistro, o que tem gerado discussões judiciais na ordem de milhões de reais (ou dólares). Neste sentido, vale destacar os julgamentos proferidos pela Décima Primeira Câmara Cível da Comarca da Capital do TJRJ e pela Sexta Câmara Cível (extinto 1º Tribunal de Alçada Cível) do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), in verbis:
EMBARGOS INFRINGENTES. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO DE EMBARCAÇÃO. NÃO PAGAMENTO SOB A ALEGAÇÃO DE QUE O EVENTO NÃO ESTARIA COBERTO PELO CONTRATO ENTABULADO ENTRE AS PARTES. SENTENÇA DE 1º GRAU QUE JULGOU IMPROCEDENTE O PEDIDO. ACÓRDÃO DA E. NONA CÂMARA CÍVEL, POR MAIORIA, REFORMANDO A SENTENÇA E CONDENANDO A EMPRESA RÉ AO PAGAMENTO DOS DANOS MATERIAIS SOFRIDOS PELO AUTOR, NOS TERMOS DA INICIAL. INCONFORMISMO DA SEGURADORA RÉ. INTERPOSIÇÃO DE EMBARGOS INFRINGENTES. RELAÇÃO ENTRE AS PARTES DE NATUREZA CONSUMERISTA, REGIDA PELO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. EMBARGANTE QUE NÃO TROUXE AOS AUTOS PROVA SUFICIENTE PARA AFASTAR SUA RESPONSABILIDADE NO SENTIDO DE INDENIZAR O EMBARGADO. CONTRATO DE SEGURO QUE DETERMINA O DEVER DA SEGURADORA EM INDENIZAR O SEGURADO POR PERDAS E DANOS QUE ATINJAM A EMBARGAÇÃO, INCLUSIVE SEU CASCO, SUAS MÁQUINAS, SEUS APARELHOS, MOTORES, INSTALAÇÕES E EQUIPAMENTOS, EM VIAGEM, OU NÃO, NO MAR, EM RIOS, CANAIS OU OUTRA VIA NAVEGÁVEL, PORTOS OU ANCORADOUROS, DIQUES, ESTALEIROS, CARREIROS OU RAMPAS. LAUDOS QUE CONSTATAM “FALHA NO ROLAMENTO E GAIOLA DE ROLETES DO MANCAL INFERIOR DA BIELA DO EIXO VIRABREQUIM DO MOTOR MERCURY”. EMBARGANTE QUE NÃO LOGROU PROVAR QUE O EVENTO FOI OCASIONADO POR PROBLEMAS MECÂNICOS INTRÍNSECOS OU AUSÊNCIA DE MANUTENÇÃO DA EMBARCAÇÃO POR PARTE DE SEU PROPRIETÁRIO. LAUDO DE FLS. 25 QUE COMPROVA QUE NÃO HOUVE FALTA DE ÓLEO OU SUPERAQUECIMENTO DO MOTOR. AUTOR/EMBARGADO QUE COMPROVA NOS AUTOS REALIZAÇÃO DE MANUTENÇÃO PERIÓDICA NA EMBARCAÇÃO. LAUDOS QUE CONCLUÍRAM PELA RAZOABILIDADE DO CUSTO APRESENTADO PARA OS REPAROS NECESSÁRIOS. DESNECESSÁRIA A COMPROVAÇÃO DA OCORRÊNCIA DE “FORTUNA DO MAR” EIS QUE A COBERTURA AMPARAVA A EMBARCAÇÃO ATÉ QUANDO ESTA ESTIVESSE EM SECO. MANUTENÇÃO DO ACÓRDÃO EMBARGADO. EMBARGOS INFRINGENTES DESPROVIDOS. (Processo nº 2008.005.00219 – EMBARGOS INFRINGENTES – 1ª Ementa – DES. ROBERTO GUIMARÃES – Julgamento: 14/01/2009 – DECIMA PRIMEIRA CAMARA CIVEL) (grifo nosso)
SEGURO – EMBARCAÇÃO – AFUNDAMENTO RESPONSABILIDADE DA REMOÇÃO E CONSERTO – DEMORA NA REMOÇÃO – NOVO AFUNDAMENTO – PERDA TOTAL – RESPONSABILIDADE DA SEGURADORA – APRECIAÇÃO DO MÉRITO, POIS AFASTADA A PRESCRIÇÃO – EMBARGOS DA RÉ REJEITADOS, ACOLHIDOS OS DO AUTOR.(Embargos de Declaração nº 803016601 – Relator(a): Candido Alem – Órgão julgador: 6ª Câmara (Extinto 1° TAC) – Data de registro: 04/12/1998)
TRECHO DO VOTO: “(…) Evidentemente que assim agindo, a seguradora assumiu, logo após aquele aviso inicial, a responsabilidade na recuperação da embarcação. Não podia ser de outra forma pois, como seguradora, logo após tomar conhecimento do sinistro, incumbia-lhe tomar essas providências para desincumbir-se de sua obrigação.
Só que, até escolher a empresa para efetuar a retirada da embarcação da água e transportá-la para são Paulo, o que ocorreu em 26.01.94 e até esta ir ao local, aquela novamente afundou.(…)
Com isso, tem-se que pela demora nessa providência, pois interessava-lhe conseguir preço mais barato pelo serviço, bem como pelo fato de ter assumido a responsabilidade pela recuperação do barco, o que está evidente pelas providências tomadas, assumiu o risco por esse novo acidente. Deveria, pois, a seguradora, também tomar as providências para protegê-lo. Enquanto o autor tomou as providências normais, a seguradora não tomou nenhuma.
Como houve agravamento da situação com a perda total da embarcação, a ré não quer, agora, assumir a responsabilidade indenizatória, sustentando que foi o autor que não cumpriu sua obrigação. Traz versões que conflitam com aquelas provas, versões essas unilaterais, como as que se encontram em suas contra-razões (fls. 506). Ocorre que a prova é toda no sentido de que logo após comunicada, a própria seguradora assumiu a responsabilidade, como realmente era a sua obrigação, de retirar o barco da represa e levá-lo para conserto.(Grifo Nosso)
[epico_capture_sc id=”21329″]Em relação ao período de vigência, a cobertura contratada para o seguro de cascos marítimos e de máquinas por prazo determinado inicia às 24h do primeiro dia previsto na apólice e termina às 24h do último. Entretanto, para outros tipos de seguros marítimos o tratamento será diverso, como é caso do seguro de embarcação com carga e do seguro por viagem, em relação ao início e ao término da contagem do período de cobertura. Para as embarcações que contenham cargas, o prazo da cobertura inicia no momento do carregamento da embarcação e termina às 24h do dia seguinte ao do descarregamento no porto de destino. Em relação ao seguro por viagem, a contagem do período da cobertura tem início quando a embarcação desatraca do porto (levantando âncora ou suspendendo ferro) e finda às 24h do dia seguinte ao da atracação no porto de destino, observadas as condições de segurança exigidas. Importante destacar que, em todos os casos, o horário (24h) deve ser sempre o do local em que a embarcação se encontra.
Para os casos em que o armador possua mais de um navio (formação de uma frota), os seguros de cascos marítimos e de máquinas devem ser unificados, ou seja, deverão ter o mesmo prazo de vigência para a cobertura, de maneira a facilitar a apuração da experiência daquele armador para as subscrições de risco. Para a inclusão de um novo navio na cobertura securitária estabelecida para a sua frota, o segurado deve requerer ao segurador a emissão de endosso ou de uma nova apólice, mediante o pagamento do prêmio calculado para aquela inclusão, pro rata temporis.
No contrato de seguro de cascos marítimos e de máquinas existem três tipos de coberturas, conhecidas como: Coberturas Básicas (nº1, 2 e 3), Coberturas Complementares (nº4, 5 e 6) e as Coberturas Especiais (nº7, 8 e 9). A Cobertura Básica nº1 contém indenização por Perda Total (PT), por Avaria Grossa (AG) e por Assistência e Salvamento (AS). A Perda Total pode ocorrer de duas formas: real, quando ocorre a destruição do objeto segurado, o seu desaparecimento por determinado período de tempo e a perda de suas características; e construtiva, quando o montante necessário à recuperação do objeto segurado superar 75% (setenta e cinco por cento) do seu valor total. Em ambos os casos, a cobertura por PT garante ao segurado o pagamento integral do objeto perdido, que passará a ser de propriedade da seguradora.
Na cobertura por AS, o seguro se encontra protegido em relação aos valores (remuneração ou recompensa) devidos a terceiro que tenha salvado ou participado do salvamento da embarcação do segurado quando ela estava em situação de perigo, ou na sua iminência, capaz de acarretar prejuízos que seriam indenizáveis pela seguradora, na forma do contrato de seguro de cascos marítimos e de máquinas. Este terceiro pode atuar por iniciativa própria ou por meio de acordo preestabelecido com o segurado e aceito pela respectiva seguradora. A indenização paga pela seguradora incluirá todas as despesas, danos e demais gastos incorridos pelo terceiro que praticou a assistência e o salvamento da embarcação do segurado.
Finalizando a Cobertura Básica nº1, a cobertura por AG será aquela paga pela seguradora em razão da quota de contribuição atribuída à embarcação do segurado, quando de sua apuração na regulação do sinistro, por um árbitro regulador. Se não houver disposição em contrário no contrato de afretamento ou no conhecimento de embarque, serão aplicadas, plenamente, as Regras de York e Antuérpia na regulação daquela avaria grossa pelo respectivo árbitro. Por avaria grossa pode ser entendida a despesa extraordinária ou o dano que foi causado de forma voluntária à carga ou à embarcação, para que fosse evitado um dano de maior proporção, que, no mais das vezes, é coberto pela apólice de seguros (dano indenizável), para salvar a embarcação ou a carga, ou para que a viagem prossiga até o porto de destino. Segundo o artigo 763, do Código Comercial, a avaria grossa deve ser dividida entre o navio, a carga e o frete. Outras disposições específicas sobre a avaria grossa, tais como os seus diversos tipos e as despesas que não são consideradas avarias grossas, nos artigos 764 e 765, também do Código Comercial brasileiro.
A Cobertura Básica nº2 do contrato de seguro de cascos marítimos e de máquinas compreenderá todas as coberturas previstas na Cobertura Básica nº1 mais a cobertura por Responsabilidade Civil por Abalroação (RCA). A abalroação é entendida pelo impacto ou choque ocorrido entre embarcações. A embarcação que for considerada culpada, mediante entendimento dos árbitros ou de imposição legal, deverá arcar com os danos causados à outra embarcação e/ou à carga. A cobertura por RCA tem por objetivo garantir uma indenização ao segurado equivalente a três quartos (3/4) do valor que for pago por este a um terceiro, decorrente de obrigação legal ou regulamentada, em virtude de uma abalroação entre a sua embarcação e aquela pertencente ao terceiro indenizado.
A cobertura por RCA garante a indenização em relação aos lucros cessantes, às perdas e danos materiais e às demais despesas incorridas pelo segurado para indenizar o terceiro lesado, não sendo incluídas as quantias pagas em razão de (i) carga ou outro bem a bordo da embarcação segurada; (ii) poluição ou contaminação de qualquer objeto, propriedade, bem ou local, exceto a poluição ou contaminação causada à embarcação abalroada ou sua carga; (iii) remoção ou eliminação de obstáculos à navegação, cargas, destroços ou qualquer outro objeto ou bem em razão de imposição legal ou regulamentar; (iv) perdas de vida ou danos a pessoas a bordo da embarcação segurada; e (v) perdas ou danos (reais ou potenciais) causados a objetos ou bens que não pertençam à embarcação abalroada ou estejam a bordo dela. Importante salientar que a seguradora somente indenizará a abalroação se for fortuita, afastando a possibilidade de cobertura sobre as condutas culposas.
A Cobertura Básica nº3 inclui a cobertura por avaria particular (AP) – também conhecida como avaria simples -, além daquelas previstas nas Coberturas Básicas nº1 e 2. A avaria particular ou simples é caracterizada pelas perdas ou danos sofridos pela embarcação segurada que não se caracterizam como avaria grossa nem representam uma perda superior a 75% (setenta e cinco por cento) da embarcação segurada. Os tipos de avaria particular ou simples são previstos no artigo 766, do Código Comercial, expressis verbis:
Art. 766 – São avaria simples e particulares:
1 – O dano acontecido às fazendas por borrasca, presa, naufrágio, ou encalhe fortuito, durante a viagem, e as despesas feitas para as salvar.
2 – A perda de cabos, amarras, âncoras, velas e mastros, causada por borrasca ou outro acidente do mar.
3 – As despesas de reclamação, sendo o navio e fazendas reclamadas separadamente.
4 – O conserto particular de vasilhas, e as despesas feitas para conservar os efeitos avariados.
5 – O aumento de frete e despesa de carga e descarga; quando declarado o navio inavegável, as fazendas são levadas ao lugar do destino por um ou mais navios (artigo nº. 614).
São inclusos na cobertura por avaria particular ou simples os custos e despesas referentes ao reparo, os honorários e despesas de regulação da avaria, as despesas pelas substituições e quaisquer outras despesas ou custos que sejam aceitos pela seguradora e pelo regulador. A título de curiosidade, as embarcações que possuírem tempo de existência igual ou superior a 20 (vinte) anos e contratarem a Cobertura Básica nº3, sujeitar-se-ão à Cláusula de Dupla Avaliação. Por esta cláusula, o segurado terá dois valores segurados na apólice para os casos em que a perda ou dano for igual ou superior a 75% (setenta e cinco por cento) do valor atual da embarcação. O primeiro valor segurado corresponderá ao montante ajustado entre a seguradora e o segurado para o valor da embarcação, e será relativo às perdas ou danos não causados por avaria particular. Já o segundo valor segurado, refere-se ao dobro do valor estipulado para o primeiro valor segurado, e será, exclusivamente, voltado para os danos ou perdas oriundos de avaria particular.
Como dito anteriormente, além das Coberturas Básicas, existem as Coberturas Complementares (nº 4, 5 e 6) e as Especiais (nº 7, 8 e 9). A Cobertura Complementar nº4 é relativa a uma cobertura por Desembolso (D), que garante uma indenização complementar de até 10% (dez por cento) da importância segurada na Cobertura Básica. É aplicável, exclusivamente, aos casos de Perda Total (real ou construtiva) da embarcação. Com isso, a embarcação será coberta pelo total equivalente a 110% (cento e dez por cento) de seu valor estipulado na Cobertura Básica, com o objetivo de fazer face aos custos e despesas com conservação, administração, armação, entre outros. Contudo, caso o segurado opte pelo reparo da embarcação, no caso de perdas ou danos havidos com aquela, e o consequente recebimento da indenização com base na Cobertura Básica nº3 (Avaria Particular), perderá o direito à indenização prevista na Cobertura Complementar nº4 (Desembolso).
A Cobertura Complementar nº5 é relacionada às Responsabilidades Excedentes (RE), pela qual a seguradora paga uma indenização complementar de até 15% (quinze por cento) do valor estabelecido para a embarcação nos casos de medidas conservatórias e preventivas, avaria grossa, assistência e salvamento, e responsabilidade civil por abalroação com a finalidade de reduzir os valores que deverão ser rateados em virtude da diferença entre o valor ajustado com a seguradora e o avaliado por terceiros. Geralmente, esta cobertura é utilizada quando a Cobertura Básica não cobrir, integralmente, as perdas ou danos naqueles respectivos casos.
A Cobertura Complementar nº6 é aquela referente ao Valor Aumentado (VA), representando um acréscimo de até 25% (vinte e cinco por cento) sobre o valor estipulado para a embarcação, nas situações enquadradas nas Coberturas Complementares nº4 e 5. Frisa-se que, em razão do elevado valor dos desembolsos e da responsabilidade excedente inerentes às embarcações com 20 (vinte) anos ou mais de existência, as Coberturas Complementares nº5 e 6 somente são aplicadas às embarcações que realizam operações de longo curso ou cabotagem construídas há menos de 20 (vinte) anos. Por outro lado, a Cobertura Complementar nº4 pode ser adotada para qualquer tipo de embarcação.
Por fim, existem as Coberturas Especiais que são divididas pelos nº7 (Construtores Navais), 8 (Responsabilidade Civil Complementar) e 9 (Guerra e Greves). A Cobertura Especial nº 7, referente ao Seguro de Construtores Navais, tem por escopo garantir o casco e as máquinas (inclusos todos os equipamentos, aparelhos, motores, etc.) relativos à embarcação em construção pelo segurado, assim como o reembolso pelas indenizações que o segurado for obrigado a pagar, por força de lei ou regulamento, em decorrência de danos causados a pessoas ou outras embarcações, cargas ou objetos flutuantes, por destroços ou casco afundado e por poluição.
A Cobertura Especial nº 8 de Responsabilidade Civil Complementar (P&I – Proteção e Indenização) garantirá o reembolso de despesas ou indenizações a que o segurado tenha sido obrigado a pagar em razão de envolvimento de sua embarcação em acidentes ocorridos no litoral brasileiro. Esta cobertura estende-se para o reembolso de despesas incorridas na remoção de destroços das embarcações mediante o pagamento de um prêmio adicional e a comprovação da remoção por parte do segurado. Nesta cobertura, o valor segurado corresponderá à responsabilidade máxima que a seguradora estará sujeita, relativa a cada sinistro ou série de sinistros originários do mesmo acidente, desde que respeitados os limites de US$25,000.00 (vinte e cinco mil dólares), convertidos pela taxa cambial de venda do dia de início do seguro ou da emissão da apólice (o que for anterior) nos casos de pessoas vitimadas; e de US$ 1,000,000.00 (hum milhão de dólares) ou o valor segurado (o que for menor), convertidos pela taxa cambial de venda do dia de início do seguro ou da emissão da apólice (o que for anterior) para os casos de acidentes.
Por finalizar as coberturas, tem-se a Cobertura Especial nº9 que é voltada para as situações de Guerra e Greves, quando a garantia da seguradora se reveste na indenização por danos ou perdas causados por aqueles dois acontecimentos, devendo a apólice de seguros de cascos marítimos e de máquinas conter uma cláusula específica para esta finalidade e o segurado efetuar o pagamento do prêmio adicional respectivo.
Por concluir, as coberturas apresentadas devem ser contratadas de acordo com a necessidade do segurado em relação à embarcação envolvida e à sua finalidade, pois, a contratação desnecessária de coberturas securitárias eleva o valor do prêmio a ser pago pelo segurado, onerando sem propósito o custo de manutenção da embarcação e/ou da viagem a ser realizada. Da mesma forma, a ausência de contratação de uma cobertura que pode ser relevante para a proteção da embarcação e de suas máquinas em relação, pode gerar prejuízos, muitas das vezes, fatais para as finanças do segurado. Diante disso, é de suma importância ponderar junto aos profissionais da área de seguros, em especial o corretor de seguros, sobre os riscos e as coberturas que possuam relação com o tipo de embarcação do segurado e a viagem a ser realizada por ela, antes da contratação do seguro de cascos marítimos e de máquinas. Contratar um seguro de cascos marítimos e de máquinas não é apenas garantir coberturas para os sinistros que possam ocorrer com a embarcação ou com terceiros, mas, principalmente, promover uma segurança financeira justa e adequada às necessidades do segurado, sem o cometimento de excessos.
Casco e máquinas seria obrigatório para todas as embarcações que desempenham operações de apoio marítimo, mesmo sendo de pequeno porte?